2023 na USP: entre conquistas e batalhas, luta antirracista segue presente

Um ano de abordagens e pautas na luta por equidade racial, educação antirracista e visibilidade da cultura afro-brasileira

 20/12/2023 - Publicado há 5 meses

Texto: Guilherme Ribeiro*
Arte: Carolina Borin**

Retrospectiva da editoria de Diversidade apresenta um compilado das matérias sobre o debate étnico-racial de 2023 - Fotomontagem: Jornal da USP - Imagens: kstudio/Freepik e Freepik

Retrospectiva da editoria de Diversidade apresenta um compilado das matérias sobre o debate étnico-racial de 2023 - Fotomontagem: Jornal da USP - Imagens: kstudio/Freepik e Freepik​

Durante o ano, o Jornal da USP abordou diversos temas dentro da realidade étnico-racial. Entre pautas que denunciaram a violência e outras que enalteceram conquistas, 2023 foi um ano repleto de acontecimentos neste campo. Nos despedimos de Glória Maria e relembramos sua contribuição ao jornalismo; tivemos Ailton Krenak se tornando o primeiro indígena a receber o título de Imortal pela Academia Brasileira de Letras. Completaram-se também 20 anos da implementação da Lei 10.639/2003, uma das maiores conquistas da educação antirracista no Brasil, que segue sendo um dos principais assuntos abordados dentro do tema. 

Abordando visões acadêmicas, artísticas e históricas, o portal teve o espaço reservado a esses povos preenchido por matérias que deram visibilidade a reivindicações por direito e à luta antirracista.

Nos últimos dias, o Jornal da USP apresentou retrospectivas das principais matérias de Diversidade e Inclusão publicadas em 2023 nos eixos de inclusão social e gênero. Nesta matéria, fechamos a retrospectiva com uma seleção de conteúdos do ano na temática étnico-racial.

Janeiro

Em janeiro, contamos que dois graduandos da Faculdade de Direito (FD) da USP foram premiados no 1º Concurso de Monografias sobre Equidade Racial, promovido pelo escritório Pinheiro Neto Advogados. Os trabalhos dos estudantes expõem as formas como o Direito foi utilizado para legitimar a discriminação racial ao longo da história.

Outro destaque foi o lançamento do livro Tecer Amizade, Habitar o Deserto: Território e Política no Quilombo Família Magalhães, que é resultado da tese de doutorado de Daniela Perutti em Antropologia pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. Publicada pela Edusp, a obra busca compreender as comunidades quilombolas contemporâneas a partir do caso do Quilombo Família Magalhães, em Goiás.

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Fevereiro

No dia 2 de fevereiro de 2023, o Brasil perdeu uma das maiores figuras do jornalismo do País. Glória Maria (1949 – 2023) fez a primeira reportagem ao vivo e em cores da televisão nacional, em 1977. Num tempo de autoritarismo e repressão, a repórter mostrou a força e coragem da mulher negra. 

Resgatamos a história pouco conhecida de Francisco de Assis Martins, advogado, professor, palestrante, conferencista, representante de instituições e que possuiu diversas propriedades, além de falar cinco idiomas. Um formando da Faculdade de Direito da USP em 1945 como qualquer outro, não fosse pelo fato de ser um homem negro e de origem humilde.   

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Glória Maria, repórter, viveu uma intensa aventura jornalística

Em 1945, sob condições adversas, um doutor preto paulistano se forma em Direito pela USP

Março

Em março, o Jornal da USP apresentou algumas matérias que trouxeram à tona mais fatos sobre a realidade da luta antirracista no Brasil. Como a pesquisa de mestrado em Sociologia, apresentada na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, que traz uma discussão sobre a presença de pessoas e movimentos negros dentro da igreja evangélica e a luta contra a discriminação racial. Ainda falando sobre a atuação de pessoas negras, outra pesquisa da FFLCH discorre sobre uma das estratégias de manutenção do racismo no Brasil, que é invisibilizar o negro em importantes episódios da história.

No Dia Internacional de Combate à Discriminação Racial, apresentamos o livro que celebra a trajetória acadêmica e militante do professor Kabengele Munangareferência para uma geração de docentes negros e negras que disputa os rumos da educação brasileira.

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Ativistas negros evangélicos buscam reconhecimento e lutam contra o racismo

Atuação de mulheres e homens negros na Guerrilha do Araguaia é analisada em estudo da USP

Livro celebra trajetória acadêmica e militante do professor Kabengele Munanga

Abril

O mês de abril trouxe alguns assuntos que geralmente não estão entre as principais discussões quando se fala em pautas raciais. Como a moda, por exemplo, que foi tema do livro Moda afro-brasileira é design de resistência da luta negra no Brasil. Lançada pela Coleção Caramelo, a obra destaca a atuação de jovens negros e marginalizados que  se expressam por meio do vestuário.  

No mesmo mês em que é comemorado o Abril Indígena, a USP recebeu representantes indígenas Fulni-ô, povo de Pernambuco que é o único no Nordeste a ter preservada a sua língua materna, a yaathê. A Editoria de Diversidade também visitou a exposição Nhe’ẽ Porã: Memória e Transformação, no Museu da Língua Portuguesa, e apresentamos as línguas faladas pelos povos indígenas em um vídeo-imersão. 

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Livro resgata origens históricas da moda ativista feita por negros no Brasil

Comitiva de indígenas Fulni-ô apresenta modos de vida, culinária e cultivo na USP

Exposição navega o mundo da cultura e das palavras indígenas no Museu da Língua Portuguesa

Maio

Em maio, tivemos importantes episódios dentro do campus em prol da luta contra o racismo.  O destaque é do Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE) da USP, que anunciou a criação de seu primeiro kit pedagógico africano e afro-brasileiro, produzido em colaboração com a Secretaria de Educação Municipal e com financiamento do CNPq. A coleção já contém kits como os de arqueologia do Mediterrâneo e de arqueologia brasileira, mas pela primeira vez o material produzido é focado na educação antirracista. Também mostramos um projeto comunitário desenvolvido em Cidade Tiradentes, que exibe uma mostra itinerante com retratos de mestres capoeiristas pioneiros, históricos e de contemporâneos da cidade de São Paulo, na região periférica da capital. 

Além dos avanços no âmbito educacional, em maio contamos as trajetórias de três personagens da história brasileira que entraram para a lista oficial de heróis e heroínas da pátria: Jaime Nelson Wright, pastor presbiteriano e defensor dos direitos humanos no Brasil; Adhemar Ferreira da Silva, atleta negro e primeiro bicampeão olímpico brasileiro; e Antonieta de Barros, primeira mulher negra parlamentar do País. Outra importante homenagem foi a Kabengele Munanga, que recebeu o título de Professor Emérito da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. O docente tem contribuições importantes nos debates sobre identidade, políticas afirmativas e racismo.

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Museu da USP vai produzir, pela primeira vez, kit educativo que visa despertar educação antirracista

Projeto comunitário que tem como base pesquisa da USP leva ensinamentos da capoeira à população

Dos direitos humanos às arenas olímpicas: conheça os novos heróis e heroína da pátria

Kabengele Munanga será homenageado com título de Professor Emérito na USP

Junho

A música desempenha um papel fundamental na construção da identidade cultural, refletindo valores, tradições e experiências de uma comunidade. Em junho, pudemos acompanhar alguns destaques da presença da quarta arte na discussão étnico-racial, seja no combate ao apagamento cultural dos povos originários com o rap indígena, ou com o tradicional samba brasileiro e a importância de artistas negros em sua históriaAinda dentro das manifestações artísticas, mostramos o projeto Docências compartilhadas, formação continuada e a Lei 10.639/03 da Faculdade de Educação da USP, cuja proposta é ampliar os debates étnico-raciais em salas de aula a partir de conhecimentos da cultura africana.

Da música para a matemática, lembramos que o ambiente competitivo e excludente no bacharelado influencia mulheres negras a preferirem a licenciatura, cuja presença feminina fortalece rede de alianças. 

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De marco temporal a conflitos do passado, rap indígena combate apagamento cultural

Como artistas negros e intelectuais brancos moldaram a história oficial do samba no Rio e em SP

Educadores fortalecem narrativas africanas em aulas com hip hop, capoeira, grafite e dança

Bacharelado em matemática é mais desigual para mulheres negras

Julho

O racismo persiste como uma preocupante manifestação de discriminação e violação de direitos. Um relatório do Núcleo de Estudos da Violência (NEV) da USP mostrou que a discriminação racial e a seletividade das abordagens policiais estão presentes desde cedo na vida das crianças negras. Segundo o estudo, jovens negros se tornam alvos da polícia desde os 11 anos. 

Na saúde, virou notícia um caso de racismo em uma UTI de hospital particular. Um médico plantonista do Hospital São Luiz, na zona sul de São Paulo, se referiu a uma alta médica como “carta de alforria” após uma paciente negra ter perguntado sobre sua liberação. Além da violência racista, a paciente deixou o hospital se queixando também de não ter recebido o cuidado adequado para seu quadro de saúde.

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Adolescentes negros são abordados cada vez mais cedo por policiais, aponta relatório

Enfrentar o racismo na medicina passa pelo acolhimento imediato das vítimas

Agosto

Em 9 de agosto celebra-se o Dia Internacional dos Povos Indígenas. Criada pela ONU em 1995, a data simboliza a luta pela garantia de condições de existência dignas aos povos indígenas de todo o planeta. Durante o mês, algumas pautas do Jornal da USP abordaram assuntos da realidade dos povos originários do Brasil, como o direito à educação indígena e as complexas relações entre cultura e território.

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Educar a partir de uma perspectiva indígena é caminho para a autoafirmação

Educação indígena no Rio Negro se destaca em meio a histórico violento de missões religiosas

“Território vivo”: como os Tupinambá vivenciam os conflitos no Baixo Tapajós

Setembro

Em setembro, no julgamento do marco temporal, o Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria contra a tese jurídica que afirma que os povos indígenas só teriam direito às terras que ocupavam na data de promulgação da Constituição Federal de 1988. O Jornal da USP conversou sobre o assunto com Maurício Terena, doutorando em Antropologia na USP e coordenador jurídico da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib). Terena falou sobre a resistência indígena e a morosidade dos processos de demarcação de terras.

Enquanto isso, no campo da cultura,  a animação Eîori! Um horizonte existencial foi selecionada para exibição na Student Animation Showcase, exposição internacional que reúne trabalhos de conclusão de curso de todo o mundo. E outra exposição na USP teve como tema a língua, mas desta vez a diversidade cultural do português falado pelo mundo, com especial destaque para os sotaques e gírias usados em países africanos.

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Para pesquisador e ativista indígena, STF rejeitará o marco temporal com tese diversa do relator

Visão indígena da vida inspira curta-metragem da USP selecionado em exposição internacional

Exposição explora as várias línguas portuguesas faladas pelo mundo

Outubro

Em outubro, Ailton Krenak, filósofo, ambientalista e poeta, se tornou um dos Imortais da Academia Brasileira de Letras. Krenak se tornou a primeira pessoa indígena a ocupar uma cadeira na instituição. O Jornal da USP acompanhou a repercussão da nomeação e trouxe os comentários de algumas pessoas indígenas de dentro da Universidade que falaram sobre a conquista.

No mundo acadêmico, tivemos uma abordagem sobre a influência da cor da pele na saúde mental. Pesquisa de mestrado mostrou que pessoas que se autodeclaram negras estão mais sujeitas a desenvolverem um primeiro episódio de psicose. Estudo foi desenvolvido na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP.

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Krenak chega à Academia Brasileira de Letras e eterniza os povos originários na instituição

Casos de psicose em Ribeirão Preto e região estão ligados à cor da pele e às adversidades sociais

Novembro

Novembro é o mês da consciência negra, em que se celebra, no dia 20, o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra. Em 2023, também foram completados 20 anos da implementação da Lei 10.639/2003, que tornou obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira e africana em todas as escolas do País. O Jornal da USP trouxe algumas matérias dentro dos temas em comemoração às datas.

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Universidades públicas de São Paulo buscam soluções para uma educação antirracista

Territórios negros urbanos resistem mantendo memória negra e tradição quilombola

Lei do ensino de História da África nas escolas completa 20 anos e escancara lacunas na formação de professores antirracistas

Mostra Internacional do Cinema Negro celebra o griô antirracista Kabengele Munanga

Dezembro

Dezembro ainda teve tempo de trazer mais destaques dentro da discussão étnico-racial. Tivemos a abordagem da arte como manifestação de resistência, que foi tema de artigo na área da Antropologia Social. O texto aborda a reconfiguração do teatro negro, suas transformações estéticas e técnicas, e sua permanência como ferramenta de resistência política. 

No mesmo mês, Mauricio da Silva, arqueólogo do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP, teve seu trabalho premiado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. A pesquisa abordava comunidades tradicionais do Amazonas e a valorização dos achados arqueológicos. 

Fechando o ano, a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP anunciou a unificação de concursos distintos para cargos de docente, viabilizando pela primeira vez a adoção do sistema de reserva de vagas para candidaturas de pessoas que se autodeclaram pretas, pardas ou indígenas.

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Cerâmicas milenares da Amazônia unem comunidades e cientistas em arqueologia “parente”

Teatro negro teve papel fundamental na resistência política durante a ditadura militar

Concurso na USP vai unificar editais para destinar vagas a docentes negros e indígenas

*Estagiário sob supervisão de Silvana Salles e Tabita Said

**Estagiária sob supervisão de Moisés Dorado

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