Adoção de moedas digitais no cenário internacional tende a crescer

Para o professor Marcelo Botelho, por facilitarem transações e terem menos burocracia, a adoção de moedas digitais como forma de pagamento e investimento é uma tendência

 24/09/2021 - Publicado há 3 anos
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Bitcoin – Foto: WorldSpectrum – Pixabay
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As criptomoedas estão se tornando cada vez mais populares devido à facilidade que elas têm em relação às transações bancárias e como investimentos de médio prazo. O interesse em torno das moedas digitais cresce entre investidores e a população em geral, que vê vantagens na autonomia oferecida por esses ativos digitais na hora de investir. Apesar do aumento na busca por criptomoedas, poucos países regulamentaram seu uso, criando um cenário de incerteza em como será sua integração no sistema monetário.

“Em termos potenciais, isso é muito positivo, porque desburocratiza o processo de remessas de fluxos internacionais de pagamentos e de recebimentos”, contou o professor Marcelo Botelho, do Departamento de Contabilidade da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto (FEA-RP) da USP, ao comentar sobre o funcionamento das criptomoedas. Por não possuírem uma regulação centralizada, elas se tornam um recurso de fácil uso para a realização de transferências de capitais internacionais.

Essas operações ocorrem fora da jurisdição das instituições financeiras e dos bancos centrais. Esse processo de transferências de remessas acontece de forma instantânea e com um grande nível de segurança devido à criptografia e à validação necessária para as operações desse tipo.

Alguns países discutem regulamentações a respeito das moedas digitais já existentes, como El Salvador e Venezuela, como forma de aumentar os níveis de bancarização da população e de fugir da zona de influência do dólar. Outros países, como o Brasil, escolheram outro caminho em relação às criptomoedas, através da criação de moedas digitais oficiais do país como forma de não ficar para trás na adoção dessa tecnologia e perder o controle sobre o seu sistema monetário.

“É importante salientar que a absoluta maioria dos países vai querer continuar controlando a moeda em circulação do seu país, porque isso faz parte de uma estratégia governamental de política econômica, de política monetária”, afirma Botelho. Segundo ele, é de interesse dos países manter esse controle sobre as moedas correntes devido às questões de arrecadações tributárias e políticas de interesses governamentais.

Sistema monetário

Foto: Tim Reckmann via Flickr – CC

Apesar de países estarem desenvolvendo suas próprias criptomoedas, moedas digitais existentes são alternativas para países que não conseguem desenvolver a sua própria moeda digital. El Salvador, por exemplo, tornou-se o primeiro país a adotar uma moeda digital, o Bitcoin, como moeda oficial do país. O país possui um alto índice de pobreza e não possui uma moeda impressa própria, sendo o dólar americano a utilizada no país. 

Para Botelho, a justificativa da adoção do Bitcoin pelo governo salvadorenho foi feita para sanar o contexto econômico do país: “Um argumento, que foi muito bom, seria aumentar a bancarização do país, porque é um país que tem pouquíssimas instituições financeiras e a maior parte da população não tem acesso a conta bancária”. 

Segundo Botelho, as regulamentações em relação às criptomoedas independentes assumem um papel importante na integração e aceitação delas na economia nacional, no entanto, elas não devem interferir na maneira como as moedas digitais existem atualmente no mercado, mantendo sua autonomia.

Mesmo com a tendência de crescimento da adoção das moedas digitais no cenário internacional, a possibilidade de que elas substituam a utilização do papel moeda é pouco provável, sendo a coexistência entre a moeda impressa e digital o mais provável para um futuro próximo. A diferença em como o mercado enxerga esses dois tipos de moedas também varia, mostrando diferentes aplicações que elas podem ter.

“Por um lado, tem a moeda emitida pelo governo, a moeda em papel, que tem um lastro da responsabilidade do governo”, ilustra Botelho, para explicar a importância que a moeda física ainda tem no sistema monetário: “Ela tem o poder de definir impostos, de definir os rumos da economia de um país. Então, de certa maneira, a moeda daquele país acaba tendo um lastro de valor baseado nesses aspectos econômicos”. 

Estabilidade x risco

Bitcoin – Foto: Gerd Altmann – Pixabay

 

A estabilidade oferecida por moedas oficiais são um atrativo para a sua utilização e investimentos, sendo que a baixa variação em sua reserva de valor garante que o uso seja seguro. Segundo Botelho, o esperado é que esse lastro de valor e estabilidade esteja presente também nas moedas digitais emitidas pelos bancos centrais. 

Por outro lado, o valor das criptomoedas independentes baseia-se somente na crença e confiança que os participantes do mercado atribuem a elas. Com isso, a tendência é que essas moedas possuam uma cotação em moedas estáveis com grandes oscilações. “Essa flutuação ocorre normalmente pelo risco, ele é alguma coisa que deve ser conhecido, mas isso não é necessariamente negativo”, afirma Botelho, ao ilustrar que a variação no câmbio das moedas digitais está ligada à percepção do mercado ainda ver esse tipo de ativo digital como um investimento, ao invés de forma de pagamento. 

Nesse contexto, criptomoedas, como o Bitcoin, tornam-se atrativas para investidores que buscam ativos financeiros com possibilidades de alta lucratividade, mas nem tanto para utilização como moeda nacional. Segundo Botelho, a problemática da flutuação do Bitcoin foi visível após a sua adoção como moeda de El Salvador: “A ideia foi boa, mas a implementação não foi, justamente pela adoção de uma moeda que tem um risco tão grande”, afirma o professor.  

Botelho explica que, com a emissão de moedas digitais pelos governos, haverá uma separação entre a moeda oficial e as independentes, de acordo com a finalidade que a criptomoeda terá para o mercado. Dessa forma, regulamentações sobre moedas independentes não afetariam a sua autonomia e seriam mais um sinal de aceitação dos bancos centrais dessas moedas. “Essas iniciativas dos governos, inclusive do Brasil, devem conseguir resolver esse problema, por trabalharem com uma lógica mais de moedas lastreadas, que devem reduzir esse risco de ficar oscilando”, conclui Botelho.


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