A reinvenção da Feira USP e as Profissões

Por Marli Quadros Leite, pró-reitora de Cultura e Extensão Universitária da USP

 Publicado: 25/04/2024

A vida só é possível reinventada.

                                            Cecília Meireles

Marli Quadros Leite – Foto: Arquivo pessoal
A USP vive tempos transformadores, resultantes de inovações, e inovação é o farol iluminador de caminhos que nos levam a efetivar mudanças necessárias em todos os campos em que as ações e atividades se mostrarem superadas. No âmbito da Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária, assim como nas outras quatro Pró-Reitorias, experimentamos tempos de mudanças e, portanto, devemos ter sensibilidade para “enxergar além do horizonte que nos parece próximo” para, com coragem, encerrar processos que se encontram em vigência, mas já dão “sinais trocados” em relação a suas finalidades, a fim de dar partida a outros mais adequados aos novos tempos. O gestor precisa administrar o presente para preparar o futuro, transformando-o, a fim de deixá-lo pronto para incorporar renovações pertinentes ao progresso social, cultural, científico e tecnológico.

Nesta oportunidade, o que vem à luz no que tange ao tema da renovação é o programa USP e as Profissões, também conhecido como USP Feira das Profissões. Esse programa existe desde 1990, quando foi criado sob a égide de dois objetivos principais: de um lado, divulgar amplamente a natureza pública e gratuita da Universidade de São Paulo; de outro, auxiliar estudantes terceiranistas a definirem o curso universitário no qual gostariam de ingressar. A finalidade do programa foi progressivamente ampliada e passou a ser, principalmente, a de atrair estudantes da escola pública para o ingresso nos cursos de graduação da USP.

O programa USP e as Profissões foi instituído para atender a esses objetivos. Idealizado para acontecer nos campi do interior do Estado, constava da realização de visitas monitoradas de estudantes do ensino médio (antes, segundo grau), principalmente os de terceiro ano. Tais visitas, existentes ainda hoje em toda a USP, consistem na recepção aos estudantes finalistas do ciclo da educação básica, de escolas públicas, para lhes apresentar os 184 cursos que compõem a graduação da Universidade. Os docentes e estudantes da USP dispõem-se a apresentar aos visitantes as características acadêmicas de cada curso.

A essa primeira fase do programa, acrescentou-se, a partir de 2008, uma outra que consistiu, até 2023, de realização de imensos encontros anuais com a sociedade paulista. De 2008 a 2013, os encontros aconteceram em diferentes áreas do campus Butantã, depois, de 2015 a 2019, passaram a ter lugar no Parque Cientec e, em 2022 e 2023, na Praça do Relógio, na Cidade Universitária. Esses encontros eram organizados como uma imensa “feira” havida entre docentes e estudantes da USP com alunos dos últimos três anos do ensino básico e, também, com suas famílias. Os objetivos do evento, ocorrido em três dias, sempre no segundo semestre, em agosto (salvo o de 2023, em setembro), continuaram os mesmos: apresentar os cursos para que estudantes de final do ensino básico pudessem conhecer características de diversos cursos e pudessem escolher, ou pelo menos, pensar com certa segurança a respeito do que poderia vir a ser a sua carreira profissional, como se fez desde 1990 até 2023, também pelo oferecimento de visitas monitoradas. A meta sempre foi, evidentemente, trazer grande parte de estudantes de escola pública para os cursos da Universidade, com base no pressuposto de que esses são os que conhecem menos, ou não conhecem, a USP.

Esses encontros realizados na Capital durante vários anos deram visibilidade ao(s) processo(s) de ingresso na USP, porém, os tempos vão paulatinamente mudando, e outros recursos e estratégias começaram a cumprir o papel antes exercido com mais força e visibilidade pela Feira. Para recordar esse longo processo, vale lembrar que, inicialmente, ainda nos idos dos anos 1990, criou-se o programa de bonificação para alunos de escola pública, o Inclusp, depois complementado pelo Pasusp, pelo qual os estudantes de primeiro e segundo anos faziam provas e acumulavam bônus a serem adicionados à média do exame vestibular. Tais programas foram superados porque seus resultados mostravam que o objetivo de aumentar o número de ingressantes de escola pública qualificados para o ingresso na USP não havia sido alcançado. Passou-se, então, para a incorporação do Enem, pelo Sisu, o que, depois de mais de oito anos de aplicado, também foi superado, por não dar o resultado esperado, sempre o de ampliar o acesso qualificado de estudantes de escola pública na USP. No ano passado, 2023, optou-se pelo aproveitamento direto da nota do Enem com o mesmo objetivo, o que, igualmente, não se mostrou como estratégia de sucesso. Veja resumo em Inclusp ajuda candidatos, mas pede medidas complementares.

Além disso, e com o intuito de a Universidade ser, efetivamente, conhecida pelo sistema público de educação do Estado de São Paulo, o reitor da USP, professor Carlos Gilberto Carlotti Junior, teve a ideia de, em conjunto com os reitores da Unicamp e da Unesp, propor um projeto muito avançado à Secretaria de Educação do Estado, cujo titular é Renato Feder. Trata-se do Provão Paulista, projeto muito mais efetivo e ousado do que todos os outros já existentes porque consiste na aplicação seriada de provas, cuja média é aproveitada como nova forma de ingresso direto nas universidades públicas paulistas (USP, Unesp e Unicamp). Nesse caso, os alunos de ensino médio das escolas do Estado, que fazem as provas aplicadas durante os três anos do curso, concorrem diretamente a mil e 1.500 vagas reservadas pela USP ao programa. Veja resumo em USP oferecerá 1.500 vagas a alunos de escolas públicas no Provão Paulista e USP recebe mais de 11 mil novos alunos, com 1,3 mil vindos do Provão Paulista do Governo do Estado de São Paulo.

Esse esforço final superou todos os anteriores e resultou, já em 2024, em aumento substancial de estudantes, pois, de uma só vez, trouxe mais de mil estudantes da escola pública à USP, por meio de processo qualificado, sem custo para a Universidade. Neste ano de 2024, realizou-se a primeira etapa do projeto Provão Paulista na USP, da qual apenas estudantes do terceiro ano, em torno de 400 mil, realizaram a prova. A partir do ano que vem, 2025, alunos de primeiro e segundo anos também farão as provas, e, finalmente, aproximadamente mais de um milhão de estudantes do ensino médio da rede pública de educação de São Paulo estará efetivamente conectado com a USP, pela realização das provas em cada série do ensino médio, para concorrer às 1.500 vagas a ele destinadas.

Assim, finalmente, a USP alcança e consolida a meta há tantos anos perseguida, de ter pelo menos metade de seu corpo discente oriundo de escolas públicas. Hoje, 54,1% do corpo discente da USP já é constituído de estudantes de escola pública. Veja em Mais de 54% dos alunos aprovados na USP vieram de escolas públicas, e vestibular 2023 se torna o mais inclusivo da história.

Vale registrar, todavia, que o esforço resultante de projetos anteriores, já citados, nesses incluída a versão até então vigente do programa USP e as Profissões, não foi feito em vão, pois seus resultados estão acumulados nesse porcentual de estudantes de escola pública ingressantes na USP. No entanto, os tempos são outros e exigem renovação.

Enfim, tudo isso fica dito com o intuito de mostrar que chegou a hora de reinventarmos a Feira USP e as Profissões, no que diz respeito à realização do grande encontro, realizado em três dias consecutivos em espaço da Universidade. Agora, chegou a hora de a USP ir até as escolas ao encontro de seus novos e potenciais estudantes. Dessa vez, docentes da USP apresentarão os cursos da USP diretamente aos alunos das escolas públicas, por meio digital, e os estudantes que ingressaram na USP pelo Provão Paulista atuarão como embaixadores da Universidade em suas escolas de origem. As escolas privadas que desejarem aderir ao programa também dele participarão. As Pró-Reitorias de Cultura e Extensão Universitária e de Graduação, juntamente com a Fuvest, preparam essa nova versão do programa e brevemente o apresentarão.

A primeira fase de realização do projeto, entretanto, a das visitas monitoradas que se realizam nas unidades de ensino, não sofrerá alteração. Desde o mês de maio, como sempre, de acordo com agenda pré-fixada, os estudantes são convidados a virem aos campi da USP visitarem seus cursos preferidos.

Pelos motivos apresentados, a Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária tem o dever de reconhecer que chegou a hora da reinvenção do programa USP e as Profissões, para que ele venha, em sua nova temporada, a dar resultados ainda mais positivos estando mais adequado ao espírito desse novo tempo.

________________
(As opiniões expressas nos artigos publicados no Jornal da USP são de inteira responsabilidade de seus autores e não refletem opiniões do veículo nem posições institucionais da Universidade de São Paulo. Acesse aqui nossos parâmetros editoriais para artigos de opinião.)


Política de uso 
A reprodução de matérias e fotografias é livre mediante a citação do Jornal da USP e do autor. No caso dos arquivos de áudio, deverão constar dos créditos a Rádio USP e, em sendo explicitados, os autores. Para uso de arquivos de vídeo, esses créditos deverão mencionar a TV USP e, caso estejam explicitados, os autores. Fotos devem ser creditadas como USP Imagens e o nome do fotógrafo.