França: primeiro país europeu a regulamentar marketing de influenciadores digitais. E no Brasil?

Especialistas comentam a aplicação da lei no Brasil e poder da ação dos influenciadores digitais pelo efeito do contato com seu público

 13/07/2023 - Publicado há 10 meses     Atualizado: 14/07/2023 as 12:40
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Uma lei específica para a internet pode impor uma responsabilização mais rápida e dura ao influenciador que divulga produtos de risco para a saúde e estabilidade financeira – Arte por Rebeca Alencar com imagens de Freepik, Facebook e Tiktok

 

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O parlamento francês aprovou recentemente uma lei que regula a atividade de influenciadores digitais. A preocupação que motivou a lei foram conteúdos como propaganda de bebidas alcoólicas, cigarros, serviços de apostas e investimentos em criptomoedas apresentados por esses influenciadores. No país, cerca de 150 mil pessoas exercem essa ocupação. 

No ambiente digital, as redes sociais exigem legislações específicas devido ao seu grande alcance e presença na vida cotidiana de seus usuários. No Brasil, existe o Projeto de Lei 2347/22 que busca reconhecer como profissão o trabalho de influenciadores digitais para que sejam propostas regulamentações. Determina também, no artigo 4º, a proibição de conteúdo discriminatório.

Situação no Brasil

Rubens Beçak – Foto: Arquivo Pessoal

A realidade observada na França, primeiro país europeu a regular o marketing de influenciadores, vai além do entendimento adotado até o momento em território brasileiro, onde é predominante a norma geral do direito civil, segundo Rubens Beçak, professor de Teoria Geral do Estado na Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da USP. “Se um médico propõe uma plástica, um tratamento médico ou um endócrino propõe uma dieta específica [nas redes sociais], você tem que provar o nexo entre o dano eventualmente causado numa pessoa, mas você está muito preso numa norma geral do direito civil. O que nós temos discutido aqui é se não devia ter uma norma mais específica no direito virtual.”

Para o professor, uma lei específica para a internet pode impor uma responsabilização muito mais rápida e mais dura ao influenciador que divulga produtos de risco para a saúde e estabilidade financeira. Além dos influenciadores, plataformas que abrigam esses conteúdos também devem estar submetidas à lei. “É esse embate que nós temos nos dias de hoje entre a aparente ilimitação do direito de expressão e a necessidade exatamente oposta dele ser relativizado. Quando o direito de expressão se manifesta de uma forma ilimitada, ele pode provocar danos na área privada, na área pública e na área eleitoral”, diz Beçak. 

Na França, as punições previstas são de dois anos de prisão e multa de € 300 mil (R$ 1,6 milhão, estimativamente).

Por trás da influência 

Leonardo Goldberg – Foto: Reprodução/ResearchGate

As redes sociais permitem uma relação mais horizontal com os influenciadores, cujos efeitos são explicados pela psicologia. “Esses conteúdos revelam muitas vezes para os seguidores ou espectadores não uma tentativa de se identificar com seus ídolos, mas um certo fascínio sobre a vida cotidiana, sobre o mais ‘banal’”, afirma Leonardo Goldberg, doutor pelo Instituto de Psicologia da USP e especialista no tema de subjetividades e o campo digital.

Seus algoritmos têm o poder de mostrar conteúdos que não são necessariamente escolhidos pelo usuário, alterando a recepção das postagens e o comportamento a partir delas. “Há nas redes sociais e no campo digital em geral uma dimensão do algoritmo que vai causar um desejo no usuário, de uma maneira que o usuário não tem uma pré-reflexão frente a isso e muitas vezes que não está preparado diante disso.”

O poder de influência dos influenciadores digitais se dá também pelo efeito do contato deles com seu público, que se diferencia de outros tipos de mídia, como a televisão. Goldberg explica: “Nos anúncios televisivos há uma certa pré-reflexão do espectador, há inclusive uma certa posição hierárquica: é o ídolo de um lado, o espectador do outro. Na rede social, há um certo desfazimento dessa ordem e, portanto, o produto que vai servir como uma espécie de guia e uma espécie de isca para o usuário não vai aparecer como alguma coisa distante, mas como incluída no cotidiano, muitas vezes em um cotidiano do qual ele pode se identificar bastante”. 

Bárbara Bigas (estagiária)* sob orientação de Marcia Avanza.

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