História da política cultural no Brasil é tema de debate

Com participação de professores da USP, evento em São Paulo discute as mudanças na cultura entre 1981 e 1993

 04/04/2018 - Publicado há 7 anos     Atualizado: 05/04/2018 às 16:14
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A dificuldade de incentivar toda a produção cultural num país rico em cultura como o Brasil será um dos temas em debate no ciclo História da Política Cultural no Brasil – Foto: Mosaico de fotos do Wikimedia Commons

A partir desta sexta-feira, dia 6, o Centro de Pesquisa e Formação do Sesc, em São Paulo, realizará o ciclo História da Política Cultural no Brasil (1981-1993). O evento, que se estenderá até o início de maio, terá a presença de professores da USP, que vão discutir um período da história do País em que a cultura passou por mudanças legislativas. Entre os docentes da Universidade que estarão no ciclo estão Nabil Bonduki, Brasílio Sallum, Francisco Weffort, Maria Arminda do Nascimento Arruda e Pablo Ortellado.

O ciclo de debates tem a curadoria e mediação de Fábio Maleronka Ferron e foi baseado na sua recém-entregue dissertação de mestrado, realizada na Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP. O título do trabalho é O Primeiro Fim do MinC. O objetivo da dissertação é propor “uma reflexão sobre as razões que levaram o presidente Fernando Collor a impor, de forma abrupta e imediata, mudanças profundas no setor cultural”.

Apesar de os debates terem um enfoque mais político, Ferron comenta a importância sociológica e histórica dessa discussão e por que ela acaba não sendo apenas política mas, também, cultural.

“Um debate decisivo é sobre quais forças atuaram na construção do Ministério da Cultura (MinC), como ele foi construído e o que explica a sobrevivência do MinC até hoje. Se a gente não entender o que aconteceu nesse período, não vai conseguir entender a importância que a institucionalidade que o MinC tem. Uma série de sonhos estava represada no período militar que converge para a criação do Ministério da Cultura. Por que não conseguem acabar com o MinC? É exatamente este o debate e acaba sendo um debate de cultura, não só de política.”

A Lei Rouanet pode ser considerada uma das principais políticas públicas a favor da cultura na época. No ciclo, essa lei será o tema principal do professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP Nabil Bonduki, ex-secretário da Cultura do município de São Paulo. O professor vai relacionar a lei com as políticas culturais da capital paulista, onde também atuou como vereador. Em um país rico em cultura, Bonduki acredita que, embora a Lei Rouanet seja imprescindível, ela não consegue abranger toda a produção cultural brasileira.

“Eu vou falar um pouco da minha experiência aqui em São Paulo, que foi exatamente buscar criar alternativas de financiamento que não fossem baseadas principalmente no incentivo cultural, mostrando como as leis de incentivo não conseguem atender a toda a gama de evolução cultural no País. A Lei Rouanet é o exemplo mais forte disso.”

Não é raro essa lei receber duras críticas, principalmente quanto ao seu retorno social, mas mesmo assim ela continua em vigor desde sua criação, o que é justificado por Bonduki não só pela quantidade de projetos que ela atende, mas também pelo apoio que recebe de setores privados. “Apesar das críticas e de certos posicionamentos contrários de setores próximos do governo, ela continua, porque ela também tem o apoio de empresas importantes e bancos.”

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calendárioÉpoca de fatos marcantes 
Os anos entre 1981 e 1993 serão o período analisado no ciclo História da Política Cultural no Brasil, no Centro de Pesquisa e Formação do Sesc. Esse período inclui acontecimentos significativos para a cultura no Brasil. Confira a seguir alguns desses acontecimentos.

1981
Atentado no Riocentro

Em 1º de maio de 1981, para comemorar o Dia dos Trabalhadores, grupos de esquerda organizaram um show no Riocentro, centro de convenções localizado no bairro de Jacarepaguá, no Rio de Janeiro. Militares contrários à abertura política planejaram um atentado à bomba no local, com a intenção de culpar os militantes de esquerda, mas essa ação fracassou. Segundo o curador do ciclo História da Política Cultural no Brasil, Fábio Ferron, o atentado significou a presença, ainda no começo da década de 80, do “fantasma” da perseguição política aos artistas e intelectuais.

1984
Campanha das Diretas Já!

Embora anos antes já houvesse reações em favor da abertura política, foi a partir de 1984, com a campanha das Diretas Já!, que esse movimento tomou maior vulto. A campanha tinha como principal objetivo a realização de eleições diretas, prometidas pelos militares desde quando eles tomaram o poder, em 1964. As eleições diretas não foram aprovadas, mas em 1985 o Brasil retornou à democracia com a eleição indireta do civil Tancredo Neves, que morreu antes de assumir a Presidência da República, e a posse do vice-presidente José Sarney.

1985
Criação do Ministério da Cultura

Por decreto presidencial, O Ministério da Cultura (MinC) foi criado a partir da divisão do Ministério da Educação e Cultura. Assim, começaram a ser desenvolvidas ações específicas para o reconhecimento da importância da cultura para a construção da identidade nacional.

1986
Gestão de Celso Furtado

O presidente José Sarney convidou o economista Celso Furtado para comandar o Ministério da Cultura. Uma de suas tarefas foi a busca de uma solução para financiar a produção cultural. Sua atuação no Ministério foi elogiada principalmente por levar em conta temas como a cultura no cotidiano e a dimensão social e econômica do fazer cultural.

1986
Primeira lei de incentivo, a Lei Sarney

José Sarney apresentou essa proposta pela primeira vez em 1972, como senador. No entanto, devido às dificuldades de implementar uma parceria público-privada em plena ditadura militar, não houve aprovação. Houve outras duas tentativas de aprovação de projetos parecidos, novamente sem sucesso. Até que, como primeiro presidente civil após o regime militar, Sarney conseguiu aprovar a legislação que ficou conhecida por Lei Sarney. A lei 7.505/86 permitia abater do Imposto de Renda doações, patrocínios e investimentos em cultura.

1990
Extinção do Ministério da Cultura

Após a posse de Fernando Collor de Mello, a Lei Sarney foi revogada pelo governo e o Ministério da Cultura passou a ser Secretaria da Cultura, diretamente vinculada à Presidência da República. Dois anos depois após o impeachment, já no governo do presidente Itamar Franco, a decisão seria revertida pela Lei nº 8.490.

1992
Sérgio Paulo Rouanet e a Lei Rouanet

Embaixador na Dinamarca desde 1987, Rouanet foi chamado por Fernando Collor de Mello para ocupar o cargo do cineasta Ipojuca Pontes na Secretaria de Cultura da Presidência da República. Rouanet marcou sua passagem pelo seu empenho nas aprovações do Programa Nacional de Financiamento da Cultura (Pronac) e da Lei de Incentivo à Cultura (Lei nº 8.313), conhecida como Lei Rouanet, que restabeleceu princípios da Lei Sarney e reformulou outras bases. O tríptico da Lei é formado por três mecanismos: o Fundo Nacional de Cultura (FNC), o Incentivo Fiscal (Mecenato) e o Fundo de Investimento Cultural e Artístico (Ficart).

1993
Lei do Audiovisual

Foi criada a Lei do Audiovisual, que impulsionou a retomada do cinema brasileiro, já que a Embrafilme, produtora e distribuidora estatal brasileira, havia sido extinta em 1990 pelo governo Collor. As mudanças nos incentivos do setor audiovisual continuaram com a criação da Agência Nacional do Cinema (Ancine), em 2001, e com a lei da TV Paga de 2011.

O ciclo História da Política Cultural no Brasil (1981-1993) acontece nos dias 6 de abril, sexta-feira, às 19 horas, 11, 18, 25 de abril e 2 de maio, quartas-feiras, também às 19 horas, no Centro de Pesquisa e Formação do Sesc (Rua Dr. Plínio Barreto, 285, 4º andar, Bela Vista, em São Paulo). A entrada custa R$ 60,00 (inteira), R$ 30,00 (meia), R$ 18,00 (matriculados no Sesc). Mais informações podem ser obtidas neste link.


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