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Segundo o dicionário, “patente” significa “título que assegura ao autor de uma invenção sua propriedade e uso exclusivos”. E, nos últimos meses, na corrida para descobrir a vacina contra o coronavírus, o termo ganhou ainda mais destaque. Além do mais, a imposição de licença compulsória, mais conhecida como quebra de patente, também ganhou os holofotes no final do ano passado.
É porque em outubro de 2020 surgiu uma proposta na Organização Mundial do Comércio (OMC) para quebrar patentes de vacinas, medicamentos e insumos hospitalares contra a covid-19 enquanto durar a pandemia. Segundo a entidade, a ação pode beneficiar o acesso ao medicamento de países pobres, que não têm recursos para adquirir o imunizante em larga escala.
A iniciativa tem o apoio de mais de 80 países, mas está parada porque países desenvolvidos, como os Estados Unidos e os integrantes da União Europeia, são contra. Assim como o Brasil, único país em desenvolvimento contrário à ideia. A justificativa é que a quebra de patentes seria um risco à inovação.
A quebra de patente
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Professor da Faculdade de Direito de Ribeirão Preto (FDRP) da USP, Rogério Alessandre de Oliveira Castro explica que, “com a quebra da patente, outras empresas poderão explorar ou fabricar o bem patenteado, como, por exemplo, a vacina”. Apesar de, à primeira vista, a ideia parecer interessante na resolução da pandemia, especialistas a consideram delicada. Para o professor Castro, por exemplo, a “prática só deve ser utilizada em situações excepcionais”.
Especialista em propriedade intelectual, Castro afirma ter dúvidas se a quebra de patentes é uma solução fácil e imediata para um problema tão amplo e complexo. “Eu tenho receio que quebrar patente pode, em determinados casos, resultar em desincentivo em novos investimentos de pesquisa”, diz.
A quebra de patentes pode não ser a solução “quando faltarem insumos básicos para a produção da vacina ou mão de obra para a sua produção”. De acordo com o professor, se a demanda for muito maior que a oferta, “nós sempre teremos um problema para solucionar”, podendo, inclusive, faltar vacinas. “E esse problema se agrava em países pobres, em que a vacina acaba chegando de uma maneira bastante deficiente, para não dizer que não chega.”
Soluções
Castro acredita que “seria mais eficiente uma ação coordenada entre países ricos e pobres”, medida que reconhece ser difícil pela “resistência dos países mais riscos em criar mecanismos nesse sentido”. A saída, argumenta, pode vir pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pela Organização Mundial do Comércio, que possuem papel fundamental na implantação de projetos benéficos, principalmente, aos países mais pobres. E cita o exemplo da OMS, com a criação da Covax, visando ao acesso global a vacinas com a melhoria da distribuição do produto em países de baixa renda.
Com relação à OMC, Castro afirma que, mesmo com viés econômico, o órgão precisa ser sensível “ao fato de que as atividades econômicas e comerciais dos países ficarão comprometidas enquanto a vacinação não ocorrer em escala mundial, incluindo os países mais pobres”. Para isso, o professor defende que a OMC deve mudar a lógica, pois é “a retomada da atividade econômica que depende da vacinação, e não a vacinação que depende da retomada da atividade econômica”.
Já o infectologista Fernando Bellissimo Rodrigues, professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP, concorda com a quebra de patentes para controle da pandemia mundial. “Os países ricos não têm motivos para quebrar a patente”, afirma o professor, argumentando que a medida só beneficiaria, em tese, os países pobres.
“Agora, quando se trata dos países menos desenvolvidos, a questão é diferente”, ressalta Rodrigues. “Por uma questão humanitária, eu não acho que o interesse comercial das grandes firmas deve se sobrepor à catástrofe que os países menos desenvolvidos estão enfrentando”, afirma.
Exemplos na história
Por outro lado, segundo Rodrigues, a quebra de patente pode, sim, ajudar a combater a epidemia. Ele lembra que, no final da década de 90, o Brasil iniciou, com êxito, processo que quebrou patente de alguns antirretrovirais para tratamento do HIV que eram “comercializados a preços abusivos”.
Rodrigues cita também o exemplo do tratamento para a hepatite C, que revolucionou a história natural da doença. “Enquanto os países ricos pagavam, e pagam até hoje, preços muito altos por esses medicamentos, eles são vendidos a preços muito mais baixos em países com alta incidência de hepatite C e que têm uma condição socioeconômica desfavorável.”
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