Direito à alimentação: integrar o debate com as práticas do cuidado em nutrição é essencial

Por Bárbara Hatzlhoffer Lourenço, professora da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP, e Dirce Maria Lobo Marchioni, professora da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP*

 Publicado: 26/04/2024
Bárbara Hatzlhoffer Lourenço – Foto: Arquivo pessoal
Dirce Maria Lobo Marchioni – Foto: Arquivo pessoal
A alimentação e a nutrição são determinantes e condicionantes da situação de saúde, especialmente considerando condições de vida atravessadas por históricas desigualdades sociais, como as de classe, gênero e raça, e grandes transformações nos circuitos de produção, acesso e consumo alimentar. No intricado panorama epidemiológico do Brasil, a problemática do avanço do excesso de peso e das doenças crônicas não transmissíveis nas últimas décadas concorre com a aguda necessidade do enfrentamento da insegurança alimentar e da fome, para garantia do pleno potencial de crescimento, desenvolvimento e qualidade de vida das pessoas.

Com estes desafios, a compreensão das práticas alimentares individuais requer um enquadramento que problematize diferentes aspectos socioculturais, econômicos e políticos, de forma situada às características dos ambientes e dos sistemas alimentares na atualidade e implicada com a superação de iniquidades. Este movimento é crucial para o avanço do campo científico e da prática profissional em alimentação e nutrição, bem como para a organização de serviços de saúde e de equipamentos de segurança alimentar e nutricional, e para a proposição de políticas públicas resolutivas, que ativem distintos setores tanto quanto possível. Contudo, à luz de visões tradicionalmente fragmentadas em saúde e nutrição, esses caminhos não são necessariamente óbvios.

Em maio de 2024, ocorrerá em São Paulo (SP) o Congresso Brasileiro de Nutrição – Conbran, maior evento da área no cenário nacional, promovido pela Associação Brasileira de Nutrição. Sua 28ª edição enuncia como tema central Alimentação e nutrição na perspectiva da integralidade das práticas do cuidado, para, precisamente, propor novas direções aos debates em nutrição.

Para tanto, o primeiro passo do Conbran 2024 reside no compromisso com o princípio de integralidade do Sistema Único de Saúde, o que confere grande potência para integrar complexos fatores da situação alimentar e nutricional da população. A integralidade convoca uma maior amplitude de perguntas de pesquisa, do fazer profissional, da estruturação da assistência e de respostas governamentais.

Adicionalmente, o destaque às práticas do cuidado em alimentação e nutrição agencia a experiência de sujeitos e coletividades sobre sua saúde e seus itinerários de adoecimento e cura, aliando saberes outros às perspectivas técnico-científicas, além de favorecer a confluência de diferentes vertentes da nutrição para colaborar em soluções sistêmicas para as necessidades de saúde e alimentação.

De forma inédita, ao invés de pautar suas atividades segundo áreas profissionais da nutrição, a organização do Conbran 2024 ocorre sobre cinco eixos temáticos estratégicos em: Sistemas e ambientes alimentares; Alimentação coletiva e segurança alimentar e nutricional; Modos de vida, padrões alimentares e repercussões à saúde; Cuidado alimentar e nutricional e prática clínica; e Processos de formação em alimentação e nutrição. Ainda, palestras, debates e mesas-redondas do Conbran 2024 são desenvolvidos de forma isenta de conflitos de interesse. De forma coerente, entende-se que o espaço de formação continuada oferecido pelo evento deve ser resguardado do financiamento da indústria de alimentos e bebidas e de quaisquer outras entidades cuja atuação fere preceitos de alimentação adequada e saudável.

A concepção da programação científica, que pode ser conferida em detalhe no site do evento, recebe forte aporte de docentes, pesquisadores e estudantes da USP, certamente acompanhada/os de outras instituições de ensino e pesquisa de relevância no País. Dada a grande convergência no reconhecimento e na abordagem integrada de questões candentes da área, a participação do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) Combate à Fome é substantiva.

Entre 21 e 24 de maio de 2024, convidamos a comunidade acadêmica e profissional para construir o Conbran 2024. A defesa do direito à alimentação é fortalecida pelo franco e renovado intercâmbio de evidências científicas e conhecimentos técnicos, políticos e socioculturais em nutrição.

* Coordenadora do INCT Combate à Fome: estratégias e políticas públicas para a realização do direito humano à alimentação adequada – Abordagem transdisciplinar de sistemas alimentares com apoio de Inteligência Artificial. E-mail INCT – inctcombatefome@usp.br

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