Ineficiência de políticas públicas ambientais prejudica combate de acidentes contaminantes na natureza

De acordo com especialistas, a fraca fiscalização, a baixa educação ambiental e a falta de preparo adequado são fatores que exigem maior atenção na busca de uma solução para o problema

 27/03/2024 - Publicado há 1 mês
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Ao entrar em contato com a natureza, em casos de acidentes envolvendo vazamentos ou disposição inadequada, alguns produtos perigosos e resíduos podem causar sérios problemas ao meio ambiente – Foto: Adema/Secom/Sergipe via Fotos públicas

 

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Acidentes ambientais envolvendo a contaminação, vazamento ou disposição inadequada de produtos e resíduos na natureza são uma preocupação, há algum tempo, de grandes organizações mundiais, como o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma). Nesse sentido, o problema já foi pauta de projetos e reuniões desses movimentos, que intensificaram esforços para combater possíveis acidentes ou minimizar seus impactos.

Acidentes no meio ambiente

Maria Eugenia Gimenez Boscov – Foto: Marcos Santos / USP Imagens

Ao entrar em contato com a natureza, em casos de acidentes envolvendo vazamentos ou disposição inadequada, alguns produtos perigosos e resíduos podem causar sérios problemas ao meio ambiente. Maria Eugenia Gimenez Boscov, professora da Escola Politécnica (Poli) da Universidade de São Paulo (USP), afirma que as dimensões da contaminação dependem das características do poluente, das características do local e da forma e duração da contaminação.

“Um poluente altamente solúvel, em alta concentração, que vaza durante muito tempo de um tanque enterrado em profundidade muito próxima do lençol freático, e este com velocidade de percolação relativamente elevada, vai se espalhar rapidamente. Todas as condições neste caso são favoráveis para o espalhamento da contaminação e desfavoráveis para o meio ambiente”, explica a especialista. Ela ainda complementa que se, nesse caso, houver a possibilidade do poluente entrar na cadeia alimentar, seja pelo lençol freático ou pela existência de intensa vida vegetal e animal na região, as consequências do desastre poderão ser muito graves.

A docente comenta que, em outras situações, o dano pode ser menor, mas alerta que, mesmo em lugares desérticos, pilhas de fosfogesso — resíduos de mineração de fosfatos — podem causar contaminação em até grandes distâncias, se não forem devidamente projetadas, devido ao pó fino formado, causando um sério impacto ao meio ambiente e à saúde humana.

Maria também explica que, nos casos de vazamentos ou disposição inadequada, o que ocorre é a poluição localizada, na qual os poluentes potenciais são de diversas classes, diferente da poluição difusa, por gases ou aerossóis que são levados por correntes de ar até outros continentes. Na poluição localizada, a professora afirma que todo tipo de material produzido, transportado, armazenado, utilizado e descartado nas atividades humanas pode ser poluente — gases ou compostos voláteis podem contaminar a atmosfera, líquidos podem contaminar águas superficiais e subterrâneas e sólidos podem ser levados pelo vento ou se misturarem ao solo local.

“Se não houver uma preparação adequada do local que vai receber a atividade potencialmente poluidora, a contaminação não será um incidente, e sim praticamente uma certeza. No caso de preparação adequada, ainda assim podem ocorrer acidentes. Toda atividade humana acaba por envolver um risco de contaminação, o importante é prevenir da melhor maneira possível, pois remediar sempre é muito caro e nem sempre é eficaz”, comenta.

Maria ainda afirma que a ciência e a técnica possuem um papel importante na prevenção de possíveis acidentes, ajudando a conhecer o comportamento dos poluentes no meio físico e nos seres vivos e melhorando a preparação dos locais em que pode ocorrer a contaminação do meio ambiente e danos à saúde pública. “Cada caso deve ser particularmente estudado com detalhes, em caráter multidisciplinar, tentando prever todas as possibilidades de ocorrer contaminação e as possíveis consequências”, complementa.

Legislação e políticas públicas

Paulo Santos de Almeida – Foto: EACH-USP

Paulo Santos de Almeida, professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP, comenta a respeito das legislações e políticas públicas que envolvem o transporte, produção e embalagem de materiais: “Existe toda uma política pública sobre resíduos sólidos no Brasil e no Estado de São Paulo: a Lei 12.305/2010, que estabelece um bom encaminhamento, em termos de responsabilidade, em termos de produção e naturalmente destinação de resíduos. Mas são insuficientes do ponto de vista geral, quando pensamos em ocupação de áreas ou então destinação incorreta de resíduos”.

Sobre sua ineficiência, o docente explica que a principal causa é a rara e rasa fiscalização e complementa: “Principalmente pensando em termos de Brasil, diferentemente de São Paulo, que já tem uma estrutura um pouco mais avantajada e com uma capacidade econômica para uso e proteção de algumas áreas. Isso não é a regra, poderia se dizer que é exceção”.

Almeida ainda explica que, quando existe algum tipo de contaminação com vazamento, ou então com liberação de produtos perigosos, os órgãos ambientais dos Estados têm a responsabilidade de atuarem com equipes de emergência para contenção desse tipo de desastres. Em São Paulo, o especialista informa que a responsável é a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB) e elogia sua atuação, com grandes números que, segundo ele, poderiam ser melhor divulgados pela mídia.

A respeito da evolução de políticas públicas, o professor comenta: “Temos a necessidade de integrar o sujeitos, envolver, com participação social, a comunidade, de forma que se perceba que os problemas que temos implicam literalmente uma visão de falta de fiscalização, mas também de uma certa impunidade para aqueles que acabam contaminando as áreas”. Para uma minimização de acidentes, Almeida relata a importância de políticas ambientais, com boa utilização de seus recursos, além de alertar sobre a falta de uma educação ambiental, responsabilização de sujeitos e empresas — que também poderiam adentrar no sistema de logística reversa.

*Sob supervisão de Paulo Capuzzo e Cinderela Caldeira


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