Combate à desinformação passa pela atualização da legislação brasileira e debate civil

A opinião é do professor Marcos Perez ao falar sobre a criação da Procuradoria Nacional da União de Defesa da Democracia, cujo objetivo é lutar contra a disseminação de notícias falsas

 18/01/2023 - Publicado há 1 ano
A medida causou divergências entre os especialistas no que se refere à liberdade de expressão e na amplitude das competências – Fotomontagem por Jornal da USP
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No dia 1° de janeiro de 2023, o Diário Oficial da União trouxe o Decreto 11.328, que criou a Procuradoria Nacional da União de Defesa da Democracia. O órgão tem como objetivo atuar no combate à desinformação para o bem-estar do Estado Democrático de Direito, sendo uma área dentro da Advocacia Geral da União (AGU). Apesar de visar a contestar um entrave das democracias contemporâneas, a medida causou divergências entre os especialistas no que se refere à liberdade de expressão e na amplitude das competências.

O combate à desinformação está no caminho certo?

O professor Marcos Perez, do Departamento de Direito do Estado da Faculdade de Direito da USP, relembra a importância do problema da desinformação, sobretudo quando propagada em massa via internet: “A gente tem experimentado, infelizmente, atos antidemocráticos realizados por pessoas que são mobilizadas, em grande medida, por força da disseminação dessas fake news, desses discursos inverídicos”. Contudo, ele avalia que a questão poderia ter sido tratada sem necessidade da edição do decreto.

“O decreto faz chamar a atenção para uma atuação do Poder Executivo contra a desinformação”, sinaliza Perez. Como uma advocacia do Executivo, a AGU passa a impressão de ser uma “espécie de censor, de autoridade da verdade” em benefício do governo, na visão dele. “O governo Bolsonaro perseguiu professores universitários que emitiram opiniões em sala de aula ou pela internet em desfavor do governo”, exemplifica sobre o caso do professor Conrado Hübner, da Faculdade de Direito da USP.

Marcos Perez – Foto: Marcos Santos/USP Imagens

Além disso, o texto do decreto utiliza o termo “enfrentamento de desinformação”, considerado “meio vago” por Perez: “Ele [o texto] deveria ter falado claramente de disseminação da desinformação em massa pelas redes sociais ou pelas mídias de qualquer natureza.” Na opinião do professor, “é inócuo criar um órgão na AGU para combater essa realidade que é muito maior, para a qual as instituições públicas não estão preparadas”.

Ele ainda complementa a sua análise: “O tema da disseminação em massa das fake news é importantíssimo. Tratá-lo num decreto de 1° de janeiro, a pretexto de fazer uma divisão de funções dentro da AGU, é empobrecer demais esse tema”. Como alternativa, ele sugere a discussão da temática no Congresso Nacional, por meio da atualização da legislação brasileira e o diálogo sobre as leis nos demais países. É mencionada a necessidade de debate civil, em vista de valores como a liberdade de expressão, liberdade de imprensa e a conservação da democracia.

Liberdade de expressão

Entre críticas humorísticas e a postura do Estado brasileiro, o direito de livre expressão pode ser uma conduta criminosa quando se enquadra na difusão em massa de mentiras, segundo Perez. “Se alguém vai à internet e divulga que a vacina contra covid causa aids, isso é mentiroso e eu diria até uma conduta assassina que tem que ser perseguida”, explica. Para ele, embora a desinformação deva ser combatida sistematicamente pelo Estado brasileiro, o próprio ex-presidente da República já disseminou notícias falsas sobre a vacinação, o que dificultou o avanço na área.


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