Cientistas pela democracia

Por Vinícius Soares, presidente da Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG), e Amanda Harumy, doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Integração da América Latina da USP e diretora das relações internacionais da ANPG

 11/08/2022 - Publicado há 2 anos
Vinícius Soares – Foto: Arquivo Pessoal
Amanda Harumy – Foto: Arquivo Pessoal

 

Um dos princípios para se produzir ciência é a possibilidade de exercer o pensamento crítico diante da realidade. O ambiente de liberdades democráticas é um apanágio do processo de produção do conhecimento, pois o cientista pode lançar mão de suas habilidades para observar fatos, criar e testar hipóteses, apresentar alternativas e mudar a realidade.

Lamentavelmente, é tudo o que não existe no Brasil de 2022. Além de vivermos um período de sabotagem e perseguição, com o parque nacional de ciência e tecnologia sendo desmontado, a jovem democracia brasileira está sob graves riscos diante do governo Bolsonaro. Nesse contexto, nós, cientistas, assim como no passado, somos convocados a defendê-la.

Desde que assumiu, o presidente fomenta o negacionismo e o autoritarismo político. Ele elegeu o setor da ciência como um dos seus principais inimigos e atua para destruí-lo em duas frentes: a asfixia financeira, com sucessivos cortes e contingenciamento de recursos, e o enfrentamento ideológico, negando o conhecimento produzido, difamando e perseguindo pesquisadores.

Bastar lembrarmos dos casos dos reitores eleitos que não foram nomeados, do caso do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), que teve seu diretor exonerado por divulgar dados sobre o desmatamento, ou até mesmo o caso da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), que teve censurado pelo Ministério da Justiça um estudo sobre uso de drogas pela população brasileira. Bolsonaro não respeita a democracia universitária, cerceia a liberdade didático-cientifica e censura dados. Um cenário que remota ao trágico caso do massacre de Manguinhos, no qual dez cientistas da Fiocruz foram suspensos de suas atividades e tiveram seus direitos políticos cassados durante a ditadura militar.

Aumentando a escalada autoritária e colocando em xeque a democracia, Bolsonaro vem reiteradamente atacando o Estado Democrático de Direito, com ataques cotidianos ao sistema eleitoral e às instituições republicanas, em escancaradas ameaças golpistas. Ele aposta no caos e na desestabilização da democracia brasileira para garantir a continuidade no poder caso perca as eleições. Isso em um momento que o Brasil deveria estar discutindo como retirar mais de 33 milhões de pessoas da fome, mais de 10 milhões do desemprego e como recompor imediatamente o orçamento de setores estratégicos para a retomada do desenvolvimento.

Mas, ao contrário de Bolsonaro, um presidente cada vez mais desmoralizado, o povo confia na ciência: somos o segundo grupo em que a população mais confia, de acordo com levantamento do Instituto Ipsos.

Por isso, em defesa da ciência e de nossa própria credibilidade, não nos cabe a neutralidade ou o alheamento aos processos sociais nacionais. Estamos diante de uma encruzilhada histórica. Dessa vez, ou mudamos a chave e construímos um caminho de redemocratização e reconstrução nacional, colocando a ciência como elemento estruturante para retomada do desenvolvimento, ou teremos a barbárie como desoladora perspectiva.

É importante apoiarmos todas as iniciativas que defendam a garantia da realização das eleições de 2022, para que elas sejam limpas e democráticas, e que tenhamos a garantia de posse do candidato que for eleito. Nesse sentido, o dia 11 de agosto é um importante marco em defesa da jovem democracia brasileira. Ela é imprescindível para que a chama da ciência possa se manter acesa e iluminar um caminho de soberania, independência e retomada de desenvolvimento econômico e social para o país.


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