Privatizar a Sabesp pode não beneficiar a população

Pedro Luiz Côrtes comenta que a empresa não consome recursos do Estado, tem um bom desempenho técnico e dispensa a necessidade de privatização

 04/08/2023 - Publicado há 9 meses
“O governo do Estado não tem como garantir que isso vai levar a uma redução de tarifa, porque ele não atua diretamente na redução da política tarifária” – Foto: Fernanda Carvalho/Fotos Públicas
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A privatização da Sabesp será feita por meio de uma oferta de ações em um modelo similar ao que foi utilizado na privatização da Eletrobras, anunciou esta semana o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas. O modelo, denominado follow on, prevê a diluição das ações em poder do governo do Estado, que hoje detém 50,3% de participação na Sabesp. O governo renunciará ao controle da empresa e permitirá que investidores possam ter maior participação sobre o negócio, atuando em um direcionamento de longo prazo. Em declaração ao Portal do Governo do Estado, Tarcísio de Freitas disse que a privatização permitirá antecipar a universalização do serviço de saneamento de 2033 para 2029 e levará a uma redução da tarifa aplicada hoje.

Problemas

Uma das justificativas apresentadas pelo governador para a privatização é a de que ela poderia levar a uma antecipação das metas de universalização. Pedro Luiz Côrtes, professor titular da Escola de Comunicações e Artes (ECA) e do Instituto de Energia e Ambiente (IEE) da USP explica que metas são essas: “Essas metas são um dos frutos do Marco Legal do Saneamento Básico, que determina que a população de todo o Brasil tenha acesso a água tratada e coleta de esgoto até 2033 e, segundo o governador, com a privatização da Sabesp seria possível antecipar essas metas para 2029. Entretanto, não há estudos que fundamentem essas declarações”, argumenta.

Pedro Luiz Côrtes – Foto: Lattes

Outro empecilho é o modelo de privatização, que ainda não foi totalmente definido pelo Estado. “Embora tenha sido delineado como follow on, ele ainda não foi finalizado. Por exemplo, não se sabe qual será a participação máxima do governo. Eles dizem que vão seguir o modelo da Eletrobras, onde cada acionista não pode ter um voto superior ao equivalente a 10% das ações e o governo tem o chamado golden share, que é uma possibilidade de vetar determinadas decisões que o conselho venha a tomar caso ele julgue que isso fere interesses nacionais”, explica Côrtes. 

O professor também defende que não é possível avaliar quanto o governo pode arrecadar com isso, uma vez que o preço das ações será definido pela própria Bolsa de Valores. “É colocado um número sem que haja um estudo que defenda isso e sem que haja um delineamento de questões importantíssimas relacionadas a essa diluição das ações”, complementa. 

Política tarifária 

A promessa de redução de tarifa também é inconsistente, uma vez que quem decide os valores das tarifas é a Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo (Arsesp). A agência possui autonomia administrativa e orçamentária e faz a regulação de diversos serviços, como a distribuição de gás encanado, bem como a definição dos preços para os serviços de saneamento. A Arsesp negocia o valor da tarifa, portanto, junto ao prestador de serviço.

“Em grande parte do Estado os municípios estão se organizando em blocos para contratar os serviços de saneamento, que poderá ser contratado junto à Sabesp ou a outros prestadores de serviço a partir do marco regulatório do saneamento. Os municípios podem contratar a Arsesp para fazer essa intermediação com o prestador de serviço de saneamento, como eles podem decidir por conta própria. O governo do Estado não tem como garantir que isso vai levar a uma redução de tarifa, porque ele não atua diretamente na redução da política tarifária”, esclarece Côrtes. 

O governo também alega que haverá injeção de capital, mas não seria necessário que houvesse privatização para isso acontecer. “Ele [governo] pode ampliar a oferta de ações, mas retém para si uma parte dessas ações mantendo o controle, e é claro que ele vai ter que participar dessa capitalização, mas ele poderia captar recursos no mercado dessa forma.” E conclui: “A população no final pode ser chamada para pagar uma conta para qual ela não foi orientada, uma conta que ela não precisaria pagar”.


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