Busca por identidade e fuga do anonimato são temas de romance

“Céu Subterrâneo”, de Paulo Rosenbaum, retrata a angústia existencial de um professor universitário aposentado compulsoriamente

 28/03/2017 - Publicado há 7 anos     Atualizado: 31/03/2017 as 13:04
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Paulo Rosenbaum - Foto: Cecília Bastos/USP Imagens
Paulo Rosenbaum, autor de Céu Subterrâneo – Foto: Cecília Bastos/USP Imagens

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Desde a Antiguidade, o homem se questiona sobre sua origem, seu propósito e sua vocação. A angústia dessas dúvidas sufoca aqueles que aspiram a ser lembrados pela história, mas estão à mercê da trivialidade. Adam Mondale, protagonista do romance Céu Subterrâneo, segunda obra do médico Paulo Rosenbaum, começa a se incomodar com essa angustiante possibilidade após se aposentar compulsoriamente da vida acadêmica.

Depois de dedicar sua carreira ao estudo do comportamento de animais e ter exercido o cargo de diretor do Instituto de Psicologia (IP) da USP, a personagem fictícia se vê fadada ao esquecimento, à mediocridade do anonimato. Superficialmente impulsionado pela ambição, Mondale decide dar uma reviravolta em sua vida e garantir seu lugar ao sol.

Ao encontrar um misterioso e danificado negativo de polaroide em sua viagem a Israel, o acadêmico judeu acredita que seu achado pode ressignificar a história da humanidade que conhecemos. A imagem fracamente projetada pelo negativo mostra uma gruta intocada, com escritos em diferentes línguas e um pé muito maior do que o de qualquer outro hominídeo.

Além da aventura arqueológica, ao longo dos capítulos Rosenbaum apresenta ao leitor flashbacks de Mondale que revelaram que suas questões superam a mera vaidade. “No fundo, a busca é por identidade”, diz Rosenbaum. “Mondale é um professor que viveu a vida inteira para a Universidade e perdeu isso. O que que ele vai fazer agora? O que ele vai buscar? Por ser judeu, ainda que laico, ele vai atrás de suas tradições. Ele vai buscar aquilo com que ele possa se identificar. Esse é o motor dele, aquilo que move o sujeito no mundo.”

Processo criativo

Para produzir seu segundo romance, Rosenbaum viajou até Israel com o apoio de uma bolsa literária cedida pela Fundação Mamash. No país, o autor se hospedou na cidade de Hebrom, especialmente marcada pelo conflito israelo-palestino pelo controle do Túmulo dos Patriarcas, onde estariam enterrados os casais Adão e Eva, Abraão e Sara, Isaac e Rita e Jacó e Lia.
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Paulo Rosenbaum - Foto: Cecília Bastos/USP Imagens
Paulo Rosenbaum conversou com grandes nomes da literatura israelense – Foto: Cecília Bastos/USP Imagens

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Por muitos séculos, o túmulo esteve sob poder dos árabes. Somente após a Guerra dos Seis Dias, em 1967, os judeus retomaram o controle sobre o território. Na época, foi realizada uma missão arqueológica israelense à região, que inspirou a trama do romance: a fim de desvendar o que havia na gruta do túmulo, uma garota de 12 anos, filha de um dos militares que coordenava a escavação, adentrou a caverna milenar por um buraco estreito, pelo qual mais ninguém conseguiria passar. A menina reportou aos militares e cientistas o que encontrara, mas a missão foi abafada pelos governantes para evitar confrontos ideológicos acerca da “invasão” aos túmulos sagrados. A partir dessa história, Rosenbaum criou o enredo da polaroide, que seria um vestígio dos fantásticos e intocáveis segredos que a garota vira.

Durante a viagem, o autor também teve a oportunidade de conversar com grandes nomes da literatura israelense, como Amos Oz e Amalia Kahana-Carmon. Trechos das entrevistas estão diluídos na ficção, que revela ao leitor traços da personalidade de cada escritor e suas relações ímpares com o fazer literário.

Foto: Reprodução
O novo livro de Rosenbaum – Foto: Reprodução

Além dos contatos privilegiados, Rosenbaum também se aproximou do cotidiano popular de Hebrom. “Quis ficar num lugar central, perto dos mercados, onde está a vida do povo. Não queria uma vida turística”, explica. “É ali que você acha o modo prático de como as pessoas vivem e se relacionam. Não na universidade, no meio político ou no Exército. É no meio das relações interpessoais que você encontra a verdade de um povo. Foi o que eu tentei captar. O grande desafio é transformar isso em algo literário.”

Sobre o autor

Céu Subterrâneo (Perspectiva, 2016) é o segundo romance de Paulo Rosenbaum, médico que há décadas concilia os consultórios com a veia literária. Seu romance de estreia foi A Verdade Lançada ao Solo (Record, 2010). Antes disso, aos 20 anos, publicou seu primeiro livro, Impreciso Emigrar, uma coletânea de poesias editada por Massao Ohno, em 1979. Nessa época, estudava Filosofia, curso que não chegou a concluir por trocar pela Medicina.

Fez mestrado, doutorado e pós-doutorado na Faculdade de Medicina (FM) da USP e publicou 12 livros nas áreas de medicina preventiva e epistemologia da medicina.

Céu Subterrâneo, de Paulo Rosenbaum, Editora Perspectiva, 254 páginas, R$ 49,00.


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