Transporte público pode ser passo importante na redução da violência urbana

Especialistas comentam que a integração de diferentes áreas das cidades reduz número de carros na rua, poluição e aumenta acesso à vida social

 07/08/2023 - Publicado há 1 ano
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Transporte público ajuda a conectar periferias a bairros centrais, o que promove cultura e lazer, além de ajudar na redução da violência – Foto: Kaique Rocha via Pexels

 

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Muitos fatores levam à violência urbana nos grandes centros. Da mesma forma, vários agentes podem atuar na redução desse problema, enfrentado em todo o mundo. Um deles é o transporte público. A relação está nos níveis de inclusão social, segundo Leonardo Agapito, professor da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG) e membro do grupo de pesquisa Agricultura e Urbanização na América Latina da USP. “Se você olhar o mapa da desigualdade na cidade de São Paulo, você vai ver que, muitas vezes, nas regiões que têm menor mobilidade urbana há menor acesso à saúde, aos bens culturais da cidade, aos museus, às bibliotecas públicas, às salas de teatro e de cinema”, observa.

Leonardo Agapito – Foto: Arquivo Pessoal

De fato, como mostra a edição de 2022 do Mapa da Desigualdade de São Paulo, produzido pela Rede Nossa São Paulo, os bairros periféricos da capital paulista são os que mais sofrem com a falta de transporte. É o caso, por exemplo, da Brasilândia, na zona norte, em que nenhum habitante vive a menos de 1 km de distância de uma estação de Metrô, trem ou monotrilho. O número escancara uma realidade oposta à de bairros centrais e com maior concentração de renda, como a Vila Mariana, na zona sul, que tem menos da metade da população da Brasilândia, mas onde 65% dos habitantes vivem próximos a estações desses sistemas de transporte público de alta capacidade. Na comparação dos mesmos bairros, enquanto os moradores da Vila Mariana vivem, em média, até os 78,3 anos, a expectativa de vida na Brasilândia é de apenas 62,8.

A distância entre os dois distritos, então, vai além dos cerca de 18 km em linha reta e envolve na soma quase 16 anos. Esse afastamento, portanto, torna-se não só físico, mas social. “Com isso, você reduz as possibilidades de vida social das populações e impede que elas participem da vida social”, acrescenta o especialista.

De Marsilac a Medellín

Embora negligenciada em vários aspectos, a Brasilândia está mais próxima da região central do que, por exemplo, Engenheiro Marsilac. Conhecido como o bairro esquecido de São Paulo, no extremo sul do município, o distrito se assemelha a uma pequena cidade e tem a menor população de toda a metrópole: pouco mais de 8 mil pessoas. Se por um lado existe certa paz bucólica na região, cercada por matas e cachoeiras, a distância para o centro é de, aproximadamente, 52 km. Sem cinemas, teatros e uma vida noturna agitada, a solução é viajar, às vezes horas, até os espaços culturais mais próximos. O Mapa da Desigualdade ainda traz outro dado importante: o distante Marsilac é um dos bairros com mais homicídios em São Paulo – são 11,8 por mil habitantes.

Mas é possível mudar a realidade de São Paulo. Na Colômbia, um caso notável relaciona inclusão social e baixa da violência. Trata-se de Medellín, a segunda maior cidade do País, que chegou a ter 380 homicídios por 100 mil habitantes durante a década de 1990 e conseguiu reduzir o número para 13,9 no ano passado. Foi o menor número já registrado na metrópole, que tem pouco mais de 2,5 milhões de habitantes. A marca, inclusive, ficou abaixo da média colombiana de homicídios. Por lá, um intenso trabalho de melhoria no transporte público é realizado desde 1995, quando foi inaugurada a primeira linha de Metrô.

O lançamento desse meio de locomoção aconteceu dois anos após a morte de Pablo Escobar, líder do Cartel de Medellín e um dos mais conhecidos narcotraficantes de todos os tempos. Os números de zona de guerra registrados na cidade anteriormente, inclusive, eram ligados a atividades do crime organizado, entre outros conflitos históricos. Para mudar a reputação da região, os colombianos, de olho no turismo estrangeiro, investiram em locomoção, como prova de que aquela era uma cidade segura, o que conectou algumas regiões da periferia aos bairros centrais e vice-versa.

Bondinho de Medellín – Foto: Pixabay

 

“Principalmente o bondinho foi criado porque a área de grande turismo da cidade era o centro. Com os bondinhos, que são muito parecidos com os do Rio de Janeiro, você consegue acessar novas áreas e, com isso, expandir as regiões turísticas da cidade, como as comunas, a possibilidade de visitar os grafites dessas comunidades”, frisa Agapito, que apesar de comparar Medellín à Cidade Maravilhosa no turismo, enxerga uma semelhança maior, em termos gerais, com a capital paulista. “Eu gosto muito da comparação com Medellín, porque acho a história muito parecida com a da cidade de São Paulo, inclusive a ocupação irregular de territórios periféricos”, completa.

Nem tudo são flores

Fernando Velázquez – Foto: Arquivo Pessoal

A cidade colombiana é suprida por, além dos trilhos do Metrô, uma integração de bondes, teleféricos, ônibus e espaços para bicicletas. Essa, para Fernando Velázquez, mestre em Engenharia de Transportes pela USP de São Carlos e diretor da empresa Smartvias Engenharia e Mobilidade, é uma questão fundamental para avaliar a qualidade da locomoção. Segundo o profissional, “o transporte conversa muito com a segurança. Por isso, a intermodalidade e a massificação do transporte público são importantes, porque você acaba tirando uma quantidade significativa de veículos na rua, fazendo com que diminua a exposição de acidentes, incidentes etc. Então, é importante investir não só no aumento da oferta de transporte público, mas na integração entre eles”.

Contudo, mesmo com a intermodalidade e tendo sido eleita a cidade mais inovadora do mundo em 2013, em uma competição realizada pela ONG americana Instituto Urban Land, Medellín não é exemplo em tudo. Segundo o professor Agapito, a cidade ainda apresenta diversos problemas, muitos deles comuns em solo brasileiro e inclusive relacionados ao transporte, como os engarrafamentos, e à segurança pública, o que comprova que apenas conectar uma cidade auxilia mas não elimina totalmente a violência urbana. Desta forma, é importante não colocar a metrópole do país vizinho como um exemplo, mas como “uma cidade em que a gente precisa dialogar para pensar alternativas sustentáveis”.

*Estagiário sob a supervisão de Ferraz Jr.


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