Pensar o “desgoverno” é fundamental para entender a crise da segurança no Rio

A opinião é de Bruno Paes Manso, que, ao lado de Sérgio Shecaira, analisa a intervenção federal no Rio em mais um “Diálogos na USP”

 23/02/2018 - Publicado há 6 anos     Atualizado: 26/02/2018 as 15:33

Foi aprovado, no último dia 20, o decreto que institui a intervenção federal na área da segurança pública no Rio de Janeiro. Esta é a primeira intervenção desse tipo desde a promulgação da Constituição de 1988. A medida do governo federal levanta debates sobre uma situação que desafia governos do Estado há décadas e que parece estar fora de controle. O Diálogos na USP desta semana, com apresentação de Marcello Rollemberg, discute a questão da violência e da segurança no Rio de Janeiro, e as perspectivas para o futuro a partir do decreto do presidente da República.  

Forças Armadas fazem operação conjunta com as polícias Civil e Militar em comunidades do Rio de Janeiro – Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil via Fotos Públicas

Para Bruno Paes Manso, jornalista e pesquisador do NEV (Núcleo de Estudos da Violência da USP), em um momento político difícil, a medida pode representar uma ótima oportunidade para o governo federal se mostrar preocupado com uma questão de interesse da opinião pública, mas que, em termos técnicos, há muitas razões para ser cético em relação à intervenção. Para ele, é necessário que se discuta a segurança pública de forma estratégica, que a União coordene um trabalho de inteligência para redução dos índices de homicídios. Enxergar o problema como uma guerra e atuar a partir da violência é “jogar gasolina numa fogueira que já queima há 40 anos”.

Programa Diálogos na USP com o tema Interdição no Rio de Janeiro, com os convidados Sérgio Salomão Shecaira, da FD, e Bruno Paes Manso, pesquisador do NEV. Apresentação : Marcello Rollemberg – Foto: Cecília Bastos/USP Imagens

Sérgio Salomão Shecaira, chefe do Departamento de Direito Penal da Faculdade de Direito da USP, lembra que a medida está prevista na Constituição, mas que a intervenção surpreende por se dar no Rio de Janeiro, que ocupa apenas a décima colocação no ranking de Estados mais violentos do País. O professor entende a decisão como desnecessária, uma vez que vê a violência no Rio como um problema estrutural, não conjuntural. Ainda segundo ele, os efeitos colaterais de uma intervenção podem ser significativamente graves. Seria mais razoável que o governo federal atuasse como agente indutor, não interventor.

Shecaira afirma ser necessário reconfigurar a polícia internamente: sem combater a corrupção da corporação, é complicado pensar em intervenção. Para ele, a população é refratária à polícia porque, quando “quando o Caveirão sobe o morro, o morador sabe que é o destinatário daquela violência”.

Ambos os convidados concordam ser importante entender a crise na segurança pública do Rio de Janeiro como reflexo de uma situação política complexa e em crise. Para Paes Manso, “a crença de que a violência resolve os problemas é muito forte justamente porque o Estado é fraco”.

O Diálogos na USP, na íntegra, pode ser ouvido nos áudios acima.


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