Até logo

Por Vahan Agopyan, professor aposentado da Escola Politécnica e secretário de Ciência, Tecnologia e Inovação do Estado de São Paulo

 27/02/2023 - Publicado há 1 ano
Vahan Agopyan – Foto: Marcos Santos/USP Imagens

 

No começo deste mês, fevereiro de 2023, alguns colegas ficaram surpresos com a publicação da minha aposentadoria, no Diário Oficial do Estado. Após quase 48 anos de docência e mais de 53 anos de atividades na USP, incluindo a minha participação como aluno, eu antecipei, por alguns poucos anos, a minha aposentadoria que chegaria compulsoriamente. Essa antecipação logicamente tem a ver com o meu atual cargo no governo do Estado e, assim, evito, ou pelo menos minimizo, as eventuais críticas sobre conflitos de interesse.Não pretendo fazer um texto de agradecimentos, pois toda a minha carreira foi feita com apoio de inúmeros orientadores formais ou espontâneos, professores didáticos, com a generosidade de colegas e de funcionários competentes e dedicados, e dos alunos. A menção aos alunos não tem o objetivo de ser politicamente correto, mas se transmiti conhecimento aos meus alunos, eles me retribuíram com muito mais. Não me envergonho de afirmar que todas as ideias importantes que tive foram resultados de discussões, dúvidas, angústias e suposições dos meus alunos. Sou muito grato aos mais de três mil alunos de graduação e de pós com quem atuei, e dentre estes aos mais de cinquenta que conviveram comigo como orientandos, mas foram, de fato, colaboradores, parceiros, contribuintes das pesquisas que desenvolvi. Para não cometer injustiças, não vou mencioná-los individualmente, mas fazer o agradecimento coletivo. Tudo que fiz valeu a pena, porque pude conviver com essas pessoas.

Gostaria de tratar, neste documento de “tentativa de despedida”, de um tópico que mencionei na minha mensagem de agosto de 2020, quando completei quarenta e cinco anos de docência. Naquele texto comentei sobre a carreira docente, dizendo que ela “é bastante dinâmica e flexível, dependendo muito da abordagem e do rumo que cada um quer dar a ela. É uma carreira muito instigante e somos nós que imprimimos o ritmo desejado”.

Em 2018, fui apresentado ao professor Michael Arthur, da Universidade de Sulfolk, de Boston, que estava visitando a USP, e recebi dele uma cópia do seu livro intitulado An Intelligent Career, publicado no ano anterior. Li a publicação vorazmente e concluí, imediatamente, mesmo sendo leigo no tema, que a carreira docente é um exemplo de carreira inteligente, e que nós, os docentes, temos o comando do nosso trabalho e, por que não, da nossa vida pessoal. Aliás, uma frase similar é o subtítulo do livro.

Não tenho a pretensão de supor que a minha carreira docente tenha sido exemplar, mas gostaria de descrever algumas das etapas de quase cinco décadas de docência para demonstrar como ela é versátil e como o docente pode definir a sua trajetória. Reafirmo que a carreira permite trajetórias diferentes e igualmente instigantes, nenhuma delas pode ser considerada a melhor, ou uma das melhores, pois o docente molda a sua trajetória profissional conforme as suas aptidões ou desejos, com a especial vantagem de que pode desistir do rumo tomado e adotar um outro, a qualquer momento.

Para um engenheiro recém-formado que teve a oportunidade de fazer um programa de iniciação científica durante a sua graduação e por isso motivado a continuar pesquisando, fazer mestrado foi uma opção natural para mim. Como aluno de pós-graduação, acabei sendo escolhido como auxiliar de ensino, em tempo parcial, para atuar no Departamento de Engenharia de Construção Civil da Escola Politécnica, em 1975. Para a renovação do contrato nesse cargo, que era precário, a realização da pós-graduação era uma condição essencial. A maioria dos meus colegas da época realizou sua pós-graduação em tempo parcial, em prazos mais dilatados, mantendo uma atividade profissional principal fora da Universidade. Alguns até fizeram doutorado no exterior, para se aprofundar na sua área específica, mas, ao retornarem ao País, continuaram como docentes em tempo parcial ou turno completo. Vários deles conseguiram chegar a professor titular e muitos mantiveram grupos de pesquisa muito ativos na Poli. Fizeram carreiras docentes de sucesso, conciliando atividades dentro e fora da USP.

Segui uma trilha diferente, pois quando estava concluindo o meu mestrado, após quase quatro anos, resolvi fazer o doutorado no exterior, desenvolvendo estudos na minha área de interesse – Materiais de Construção Civil, e ao retornar decidi ser um docente pesquisador. Novamente, não havia vagas para docentes em tempo integral e, para contornar, consegui ser admitido no IPT – Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo, e assim me dedicar em tempo integral ao ensino e pesquisa, sendo esta mais aplicada. Após a mudança estatutária da Universidade e o aumento de vagas para docentes em tempo integral, pude finalmente ser um docente em RDIDP, em 1990.

Estava muito contente e sentia-me realizado como docente dedicado integralmente à Universidade. O meu entusiasmo e o sentimento de prazer no que estava fazendo fizeram com que eu galgasse rapidamente ao cargo de professor titular. Um novo desafio foi colocado pelo diretor eleito da Politécnica em 1997: candidatar-me para vice-diretor da Escola, já que na época as eleições do titular e do vice, nos cargos diretivos da USP, eram separadas. Sabia que esse cargo dificultaria as minhas atividades de pesquisa, mas havia sempre a oportunidade de, encerrado o mandato, poder retornar plenamente ao departamento, pois a carreira permite essas mudanças. Fui vice-diretor e em seguida diretor da Escola Politécnica. Depois não voltei integralmente ao departamento.

Um mês após o término do meu mandato fui convidado para ser o presidente do IPT, o que significava um afastamento formal da USP, mas, pela generosidade dos meus colegas, eu continuava com as atividades didáticas e de orientação. Depois aceitei um outro convite e emendei a minha estada no IPT com a um período na Secretaria de Desenvolvimento Econômico do Estado, como coordenador de Ciência e Tecnologia.

Após quatro anos afastado da Universidade, com as atividades de pesquisa sensivelmente reduzidas e sem participar diretamente da política acadêmica, foi com surpresa que recebi o convite para o meu nome ser submetido ao Conselho Universitário como Pró-Reitor de Pós-Graduação, pelo reitor recém-eleito, em 2010. Desse convite em diante, segui uma carreira de administração acadêmica, concluindo-a no começo do ano passado com o fim do meu mandato de reitor.

Agora, com a aposentadoria e as minhas funções públicas, a minha atuação na USP será mínima. No entanto, novamente pelo formato da nossa carreira, posso, após a minha participação no governo, preparar um plano de trabalho que, se for aceito pelo meu departamento ou mesmo pela unidade, me permitiria retornar a ter atividades na USP, como docente sênior. Por isso o título deste artigo, pensem bem como a nossa carreira profissional é primorosa. Até logo, meus amigos, será um prazer voltar a trabalhar com vocês em breve.

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