Indústria nacional depende de políticas efetivas que incentivem investimentos para melhorar

Carlos Vian afirma que o Brasil corre o risco de ficar para trás frente à reorganização da indústria global

 09/10/2023 - Publicado há 7 meses
Para fazer o cálculo do nível da produção dos diversos setores no País é necessário contabilizar as horas trabalhadas ou o número de empregos – Foto: Wikipédia
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Uma nova edição do Boletim de Conjuntura Industrial da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da Universidade de São Paulo aponta que a confiança empresarial no Brasil diminuiu. Contudo, alguns aspectos, como o preço dos metais e o retorno ao status de atividades em suspenso, apresentam a possibilidade de melhora no cenário.

O professor Carlos Vian, do Departamento de Economia, Administração e Sociologia da Esalq, detalha os motivos para essa desconfiança industrial e como superá-la.

O cenário no segundo semestre

No primeiro semestre de 2023, o empresariado brasileiro criou expectativas de melhora para o setor industrial, visto que houve a retomada da discussão da reforma tributária e um debate acerca de políticas industriais mais efetivas. Todavia, na visão do professor, o segundo semestre demonstrou uma lentidão na possibilidade de implementação dessas medidas.

“A reforma tributária está sendo bastante debatida, com aspectos que envolvem determinados setores, porém, na política industrial, ficou praticamente no discurso. Falou-se, lá atrás, muito de uma neoindustrialização, de que iríamos buscar uma economia mais ligada com a economia verde, mas até agora nós não vimos medidas mais efetivas”, afirma Vian.

Em relação à bioeconomia, foi anunciado pelo governo brasileiro um incentivo para fabricação de produtos sustentáveis, porém, por conta da suspensão das discussões referentes à efetivação dessas políticas públicas, a indústria está na espera e a confiança tende a cair, na opinião do especialista. De acordo com o professor, os índices econômicos estão estagnados no setor industrial, com poucas áreas demonstrando uma pequena melhora. “Se nós não estamos crescendo e não temos investimento, a gente acaba tendo impacto no emprego e o único setor mais dinâmico nos últimos meses, em termos de geração de emprego, foi o setor de serviços.” Ele ainda complementa que, no geral, os empregos no setor de serviços possuem remuneração abaixo do que na indústria e exigem uma qualificação menor.

Carlos Vian – Foto: Cepea/Esalq-USP

Dificuldades para o setor industrial

Para o especialista, o setor industrial brasileiro sofre, há pelo menos duas décadas, com problemas de inserção internacional, de competitividade, de produtividade e, hoje, sofre com um parque industrial envelhecido — não há substituição das máquinas por conta da incerteza na área. 

As adversidades geopolíticas atuais, segundo Vian, apontam para uma reorganização da indústria global que possibilite uma janela de oportunidade para o Brasil se colocar mais alto na cadeia produtiva. Entretanto, ele afirma: “O Brasil está sendo lento na discussão de como aproveitar essa oportunidade. Ser um país com produção de energia limpa e barata é importante, mas é preciso ter uma indústria forte que demande essa energia e que possa colocar produtos no mercado internacional”.

O professor comenta que o Brasil corre o risco de ficar para trás mais uma vez, porque o mundo não está atrasado perante essa janela e isso reflete na perda de investimentos internacionais no País.

Produção nos setores

Para fazer o cálculo do nível da produção dos diversos setores no País é necessário contabilizar as horas trabalhadas ou o número de empregos, segundo o professor. Conforme Vian, a indústria de transformação apresenta uma certa estabilidade desde metade do primeiro semestre, já o setor de veículos teve um pequeno aumento no começo do ano, por conta da política de redução de impostos na compra de carros. No entanto, a partir de julho, a indústria automobilística demonstra queda. E o setor de máquinas e materiais elétricos, diferentemente da área de veículos, após um crescimento inicial está estável atualmente. 

Em um aspecto positivo, o especialista declara que, nos últimos meses, não se nota mais uma queda generalizada e contínua como anteriormente. Porém, ele faz um alerta: “Esse compasso de espera nos indicadores é preocupante. Em geral, no último trimestre há um crescimento em função das vendas de fim de ano, mas não estamos vendo isso. Então, é um indicador de que talvez a demanda de produtos industrializados, no fim do ano, não será tão grande quanto foi em anos anteriores”.

Fatores influentes na indústria

O professor comenta que uma possível melhora nesse cenário depende do desenho de políticas industriais efetivas que incentivem investimentos da reforma tributária —  que para ele irá gerar certa confusão no início, por conta da nova metodologia de recolhimento de impostos — e de uma melhora na geopolítica, visto que o Brasil depende muito da exportação. Contudo, ele diz que a incerteza referente a essa possível melhoria é muito grande.

Para finalizar, Vian explica quais as consequências dos problemas na geopolítica mundial: “Isso interfere no comércio internacional, na logística e nos custos de exportação. Como eu disse, essa mudança geopolítica está relocalizando a indústria e até o momento o Brasil está fora. A indústria está olhando, por exemplo, aqui na América Latina, para o México, mas no Brasil a gente não vê anúncios de novos investimentos”.


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