Agressões a jornalistas fazem parte de quadro mais amplo de intolerância

Professores da ECA afirmam que o aumento dos ataques, especialmente nos dois últimos anos, demonstra a articulação de um discurso organizado a fim de deslegitimar a atuação jornalística

 10/12/2020 - Publicado há 3 anos
Por
Logo da Rádio USP
Brasil é o 6º país mais perigoso do mundo para jornalistas, diz Unesco – Foto: Fernando Frazao/Agência Brasil

Cenas de agressão a jornalistas se tornam comuns hoje no Brasil e no mundo. Um exemplo aconteceu no início do mês de novembro, em Santa Catarina, quando jornalistas da NSC TV, afiliada da Rede Globo, cobriam o descumprimento da lei que proíbe aglomerações nas praias do Estado e foram agredidos e impedidos de prosseguir com a reportagem. 

Daniela Osvald Ramos, professora da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP e pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência (NEV), explica que a agressão a jornalistas é uma herança da ditadura que não acabou com o fim do regime militar, especialmente em lugares mais remotos. A grande mudança se dá a partir das chamadas Jornadas de Junho, em 2013. 

“A partir dos protestos nos grandes centros, aparece a violência contra jornalistas famosos, de grupos importantes, em ataques difusos de orientação política diversa: tanto de quem se colocava à esquerda, com um discurso de que a mídia é golpista, quanto com o discurso da direita de que a mídia não fala a verdade”, aponta. 

Já Vitor Blotta, também professor da ECA e pesquisador do NEV, ressalta que o ataque à imprensa tem aumentado ainda mais nos últimos dois anos, como demonstra pesquisa da Artigo 19, organização não-governamental que defende e promove a liberdade de expressão. “Já foram contabilizadas mais de 450 violações à liberdade de imprensa e aos direitos de profissionais do jornalismo praticados pela família Bolsonaro ou por agentes do Estado”, analisa. 

Segundo ele, a média, nos anos anteriores, era de 100 violações a esses direitos. Isso demonstra que esta administração é direta e declaradamente contrária à liberdade de imprensa e à atuação crítica do jornalismo. “Para eles, a instituição jornalística deveria ser elogiosa ao governo e à sua administração.”

Daniela afirma ainda que essa questão está ligada a um quadro mais amplo de intolerância, calcado na linguagem e no discurso das redes. “Primeiramente, essa intolerância se organiza na forma de jargões e discursos de ataques. Essa manifestação passa a ser munição na formação de um ambiente de intolerância no qual jornalismo e jornalistas são alvos, como forma de disputa de hegemonia de discurso na esfera pública.” 

 


Política de uso 
A reprodução de matérias e fotografias é livre mediante a citação do Jornal da USP e do autor. No caso dos arquivos de áudio, deverão constar dos créditos a Rádio USP e, em sendo explicitados, os autores. Para uso de arquivos de vídeo, esses créditos deverão mencionar a TV USP e, caso estejam explicitados, os autores. Fotos devem ser creditadas como USP Imagens e o nome do fotógrafo.