Revista da USP sobre teatro chega ao fim após 20 anos

Referência na área das artes cênicas, “Sala Preta” dedica última edição ao Teatro Oficina

 01/06/2021 - Publicado há 3 anos
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Segundo o professor Luiz Fernando Ramos, dificuldades para manter padrão de excelência contribuíram para fim da publicação – Foto: Reprodução

 

Após 20 anos sendo ponto de encontro entre ciência e arte, a revista Sala Preta encerra suas atividades. A publicação do Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP fecha duas décadas de história com uma edição totalmente dedicada ao Teatro Oficina, publicada com data de dezembro de 2020.

De acordo com o professor Luiz Fernando Ramos, editor da revista ao lado da professora Sílvia Fernandes, uma série de circunstâncias contribuiu para o fim da publicação, destacando-se aí as atuais dificuldades para se manter uma revista acadêmica de excelência, seja em termos de estrutura operacional, seja de entrega pessoal.

O professor, que fundou a revista ao lado de Sílvia, conta que, ao longo dos 20 anos da publicação, por duas vezes transferiu as responsabilidades de editor. Na segunda vez, depois de dois anos o substituto decidiu que não poderia continuar à frente do cargo. Foi o momento de acender a luz de emergência.

O professor Luiz Fernando Ramos – Foto: Reprodução/Fapesp

“Antes de se procurar um novo editor entre os vários professores de nosso programa que poderiam assumir essa tarefa, percebemos que havia um problema anterior, quase crônico, que era a nossa crescente incapacidade de atender aos parâmetros de excelência atuais, e o quanto esses parâmetros tinham se tornado insensatos e pouco estimulantes”, explica Ramos. “Percebemos que tínhamos cumprido um ciclo vitorioso de 20 anos e que talvez fosse a hora de um novo projeto, tão inovador quanto o da Sala Preta foi em seu início, para começar com sangue novo e novas perspectivas.”

Esse início inovador da Sala Preta foi inspirado pela coleção francesa Voix de la Création Théâtrale, que trazia dossiês sobre espetáculos e encenadores de destaque. “Aos poucos, dada a inexistência de outras publicações de artes cênicas e com o crescimento e adensamento da pesquisa nessa área no Brasil, a revista começou a concentrar os resultados mais importantes da produção acadêmica brasileira na área e foi ganhando respeitabilidade”, lembra o professor. A passagem para as plataformas digitais veio em 2011, ampliando o alcance e a reputação da publicação.

Para Ramos, as principais contribuições da revista ao longo de seus 20 anos envolvem a reunião do que de melhor se produziu nas perspectivas científica e artística sobre artes cênicas. Além disso, o professor aponta a relevância dos dossiês sobre espetáculos marcantes e dossiês temáticos da publicação, que se tornaram “um modelo para outras revistas”.

É um desses dossiês, inclusive, que Ramos destaca como particularmente especial na trajetória da Sala Preta. Trata-se do segundo número de 2002, dedicado à montagem do Teatro Oficina de Os Sertões, baseada no livro de Euclides da Cunha. O primeiro dos cinco espetáculos que compõem a série estrearia no ano seguinte e integraria, para o professor, a contribuição mais expressiva que o Teatro Oficina ofereceu para a cena teatral brasileira nesse milênio. “Até por isso”, explica Ramos, “esse último número de 2020 homenageia o Teatro Oficina.”

Teatro Oficina é “o experimento mais longevo” do teatro brasileiro

Para baixar as cortinas de uma trama encenada por 20 anos, a revista Sala Preta escolheu dedicar sua última edição integralmente ao Teatro Oficina, “o experimento mais longevo, singular e potente da teatralidade brasileira”, conforme os editores Luiz Fernando Ramos e Sílvia Fernandes anunciam no editorial da publicação.

Com uma trajetória de mais de seis décadas, o grupo liderado pelo encenador, dramaturgo e ator Zé Celso Martinez Correa encarna, nas palavras dos editores, “uma vontade de saber que é prática, sempre atualizada nos corpos atuantes, e que percebe a vida como devoração, na inspiração da antropofagia de Oswald de Andrade, e rejeita o teatro metafísico, idealizado e espiritualizado, o teatro como ideia ou como expressão estética autônoma”.

Três seções procuram dar conta de investigar o fenômeno Oficina. A primeira, Oficina pelo Oficina, agrega contribuições de artistas cujas trajetórias se cruzam com o grupo, abrindo com uma “louvação afetuosa” feita pelo próprio Zé Celso Martinez Correa, diretor do Oficina desde 1958. A segunda, O Oficina, traz ensaios de pesquisadores brasileiros sobre o grupo. A terceira, por sua vez, batizada de Oficina pela Crítica, é ao mesmo tempo homenagem a Mariângela Alves de Lima, crítica que acompanhou sistematicamente a trajetória do grupo, e reunião de sua fortuna crítica sobre o Oficina.

A revista Sala Preta v. 20, n. 2, publicação do Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, está disponível gratuitamente no Portal de Revistas da USP.

 


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