Livro retrata a “grande aventura” de ser atleta olímpico no Brasil

“Atletas Olímpicos Brasileiros”, de Katia Rubio, conta histórias de atletas brasileiros em todas as edições dos jogos olímpicos

 15/07/2016 - Publicado há 8 anos     Atualizado: 01/08/2016 as 13:22
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Foto: brasil2016.gov.br

O Brasil tem uma rica história olímpica! Trata-se de uma história que não está embasada na quantidade de medalhas, mas no esforço individual de atletas dedicados. A maioria, ilustres desconhecidos num País em que há poucas iniciativas governamentais de apoio ao esporte olímpico. Nas 20 participações em Olimpíadas foram 108 medalhas, 86 do masculino e 22 do feminino, sendo 23 de ouro, 30 de prata e 55 de bronze. “Não se pode compreender num país como o nosso tamanha conquista. Afinal, ser atleta olímpico no Brasil é uma ‘grande aventura’”, diz a professora Katia Rubio, professora associada da Escola de Educação Física e Esporte (EEFE) da USP e autora do livro Atletas Olímpicos Brasileiros, lançado no ano passado.

Professora Katia Rubio da EEFE e autora do livro Atletas Olímpicos Brasileiros - Foto: Marcos Santos/USP Imagens
Professora Katia Rubio da EEFE e autora do livro Atletas Olímpicos Brasileiros – Foto: Marcos Santos/USP Imagens

A obra é resultado de um trabalho de pesquisa que já dura 17 anos. A cada edição dos jogos, os dados foram atualizados. E tudo começou na tese de doutorado de Katia, em 2001, na EEFE. “Foi quando decidi estudar a relação da formação da identidade do atleta e o mito do herói. Três anos depois, passei a estudar a trajetória da mulher como atleta e como elas lidavam com a ‘invisibilidade’ e com o fato de treinar para chegar a lugar algum”, descreve. Em mais cinco anos de estudos, Katia passou a pesquisar mais a fundo a mulher brasileira nas Olimpíadas. “Vale lembrar que sempre houve uma espécie de preconceito em relação à mulher atleta”, lamenta a pesquisadora. Mesmo assim, ela destaca o empenho e a realização da nadadora brasileira Maria Lenk, a primeira nadadora brasileira a participar de uma edição dos jogos olímpicos, em Los Angeles (EUA), em 1932.

Perseverança e luta

Entre as muitas histórias que Katia acompanhou durante sua pesquisa, duas de fato mostram o quanto o atleta brasileiro é persistente, mesmo diante das mais duras adversidades. “Quando o então já bicampeão olímpico no salto triplo Adhemar Ferreira da Silva foi para a Olimpíada de Roma, na Itália, em 1960, esperava-se que ele tivesse um desempenho que o levasse à terceira medalha de ouro. Mas ele não passou das eliminatórias”, conta a pesquisadora. O fato é que, como ela relata, pouco tempo depois da Olimpíada, num encontro casual com um médico que o reconheceu, o atleta passou por uma consulta.

Adhemar Ferreira da Silva, campeão olímpico brasileiro - Foto: Wikipédia
Adhemar Ferreira da Silva, campeão olímpico brasileiro – Foto: Wikipédia

Foi então descoberto que ele estava doente e que teria ido aos jogos de Roma acometido por uma tuberculose não diagnosticada. “Isso mostra o quanto devemos considerar ‘verdadeiros heróis’ os atletas brasileiros.” Além do mais, como diz Katia, as diferenças das marcas entre atletas brasileiros e estrangeiros, mesmo os recordistas, são mínimas.

Adhemar Ferreira da Silva conquistou duas medalhas de ouro nos jogos de Helsinque, na Finlândia (1952), e em Melbourne, na Austrália (1956). O atleta, morto em 2001, foi o primeiro bicampeão olímpico brasileiro.

“Como não recordarmos de Aida dos Santos, que sem qualquer apoio foi a primeira mulher brasileira a disputar uma final olímpica no atletismo, nos jogos de Tóquio, em 1964?”, ressalta a pesquisadora. Além de ter sido a única mulher naquela delegação, como conta Katia, Aida dos Santos chegou à cerimônia de abertura dos jogos com um uniforme adaptado de outra competição.

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A saltadora em altura Aida dos Santos – Foto: memoriadoesporte.org.br

“E para ir aos jogos, ela teve de atingir o índice olímpico por três vezes. Sem qualquer explicação, o Comitê Olímpico Brasileiro simplesmente não considerava seu desempenho, até que na terceira vez tiveram de reconhecer sua capacidade”, conta.

Para ir aos jogos, ela [Aida dos Santos,] teve de atingir o índice olímpico por três vezes. Sem qualquer explicação, o Comitê Olímpico Brasileiro simplesmente não considerava seu desempenho, até que na terceira vez tiveram de reconhecer sua capacidade.

Na opinião da pesquisadora, além do preconceito que havia na época em relação à mulher, a situação mostra o quanto a atleta foi persistente em suas convicções. O fato é que, mesmo assim, Aida chegou à final do salto em altura, conquistando o quarto lugar. “E vale ainda ressaltar que durante a final ela teve uma contusão e não contou com a devida assistência por parte da delegação brasileira. Aida foi atendida por um médico cubano, o que possibilitou que ela disputasse a final”, diz Katia.

Pregação no deserto

Dentre outras tantas histórias, o livro é um rico documento sobre a história olímpica dos atletas brasileiros, que Katia considera como “verdadeiros heróis”, num País que dá pouca ou quase nenhuma importância às realizações destes homens e mulheres que fizeram e fazem a nossa história olímpica.

Sinto-me de fato, uma ‘pregadora’ no deserto, pois sempre defenderei que todos estes atletas, medalhistas ou não, pelo simples fato de terem ido a uma ou mais edições dos jogos olímpicos mereçam ser lembrados dignamente”, desabafa a pesquisadora.

Esse é um dos motivos pelos quais a pesquisadora pede que o público brasileiro tenha, principalmente, respeito pelos atletas brasileiros, pelo simples fato de estarem numa Olimpíada. “Apesar dos problemas de gestão, troca de governo, ministérios e tantas incertezas, podemos dizer que os jogos no Brasil serão nossa edição de ouro”, ressalta Katia, lembrando que um dos motivos são os altos investimentos que foram e que ainda serão feitos. “Houve algum progresso nas políticas de governo para beneficiar atletas. Mas ainda é pouco para um país do tamanho do nosso. Necessitamos de uma política consistente e de longo prazo”, recomenda.

Foto: Brasil2016

O primeiro medalhista brasileiro em uma olimpíada foi o atirador Guilherme Paraense, nos jogos de Antuérpia, na Bélgica, em 1920, conquistando a medalha de ouro. Foi a primeira participação do Brasil numa Olimpíada. A partir daí, só não participou dos jogos de Amsterdã, na Holanda, em 1928.

O Brasil ganhou medalhas em 14 modalidades: Atletismo, Basquete, Boxe, Futebol, Ginástica Artística, Hipismo, Iatismo, Judô, Natação, Pentatlo Moderno, Taekwondo, Tiro Esportivo, Vôlei de Praia, Voleibol. O maior medalhista: Robert Scheidt com cinco medalhas em cinco participações (2 ouros, 2 pratas e 1 bronze). Em toda a história houve a participação de 1.796 atletas, sendo 1352 homens (75%) e 444 mulheres (25%). “Ao todo foram 325 medalhistas, sendo 226 homens [69%] e 99 mulheres [31%]”, contabiliza Katia. O Brasil também tem um atleta que recebeu a medalha Pierre de Coubertin (honraria concedida por esportividade e espírito olímpico durante a competição), nos jogos de Atenas, em  2004. O maratonista Vanderlei Cordeiro de Lima.

Mais informações: (11) 30918798, com a professora Katia Rubio; email katrubio@usp.br

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