Mutirões de catarata são um procedimento seguro

Evento ocorrido no Amapá é raríssimo na proporção em que se apresentou, com 104 dos 141 pacientes apresentando infecção ocular após o procedimento

 08/11/2023 - Publicado há 6 meses
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A despeito de infecções ocorridas em um mutirão de catarata no Amapá, a cirurgia para correção desse problema é bastante segura, afirma Eduardo Rocha. “É o procedimento cirúrgico mais executado ao redor do mundo. As taxas de infecção pós-operatória, sejam em hospitais públicos do SUS ou privados, mundo afora, estão em torno de uns três casos em cada mil de cirurgias feitas. A grande maioria das pessoas recupera muito bem e em poucos dias a visão, mesmo quando enfrentam algum tipo de complicação cirúrgica. Isso quando tratados também de forma adequada e oportunamente. No caso recente, ocorrido em setembro no Amapá, foi noticiado que, de 141 pessoas operadas de catarata, 104 tiveram endoftalmite, uma infecção intraocular, e sete delas precisaram remover o globo ocular, um evento muito triste e raríssimo nas proporções em que se apresentou, no qual devemos nos solidarizar com os pacientes, seus familiares e com a equipe de saúde, que certamente não esperava e está se esforçando para minimizar a dor e o dano provocado.  

Mutirões de saúde existem há muito tempo, os de catarata pelo menos desde os anos 80 do século passado no Brasil. Mutirões têm objetivos e eficácia variáveis. Investigar características de uma doença, levar assistência médica a regiões remotas são alguns deles. Há algumas décadas sabemos, através de pesquisas brasileiras e internacionais, que os mutirões de cirurgia têm o poder de diminuir filas e atender pessoas em locais remotos, mas que sua eficácia é reduzida. A qualidade do atendimento é menor e a médio e a longo prazo a população continua desassistida até que um novo mutirão retorne à região. Num mutirão, a excepcionalidade dada pela geografia, pelo grande número de casos, pela escolha e uso de material adquirido e transportado de forma excepcional e por trazer pessoal nem sempre acostumado com essa grande demanda e nova rotina, pode gerar, em alguma das etapas, uma ou mais falhas que se amplificam como numa queda de peças de dominó enfileiradas ou num castelo de cartas. 

Catástrofes tardias em cirurgias de miopia na década de 1930, no Japão, mostraram que a cirurgia de miopia não poderia ser feita com a técnica rápida e precisa que foi preconizada. As córneas inchavam lentamente e levavam à cegueira. Isso levou a uma série de normas restritivas naquele país, que até hoje são lembradas para manter regras exigentes com a segurança em saúde. Da mesma forma, o FDA americano foi proposto na década de 1920, depois que um cosmético aparentemente inofensivo deu queimaduras nas pálpebras de algumas clientes que o usaram, acreditando ser um produto seguro. 

Ao final de tudo isso, umas boas lições sobre segurança em mutirões e incentivo para serviços de saúde perenes para a população poderiam ser uma maneira de melhorar essas iniciativas e o investimento público em saúde do SUS.”  


Fique de Olho
A coluna Fique de Olho, com o professor Eduardo Rocha, vai ao ar quinzenalmente, quarta-feira às 8h30, na Rádio USP (São Paulo 93,7; Ribeirão Preto 107,9) e também no Youtube, com produção da Rádio USP, Jornal da USP e TV USP.

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