Impacto da Selic nos preços da economia não é homogêneo e varia entre grupos de bens e serviços

A partir dessa constatação, Marina Sanches alerta que o Banco Central deve levar em conta a dinâmica dos diferentes componentes do IPCA na aplicação de sua política monetária

 08/10/2024 - Publicado há 2 meses
Desenho de cifrões, cédulas e moedas para ilustrar matéria sobre preços da economia
O estudo utilizou dados do Brasil entre 2007 e 2023 e aplicou um modelo econométrico para medir esses impactos – Arte por Rebeca Alencar com imagens de Flaticon
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Um estudo recente, conduzido pelo Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades (Made), revela que o impacto da taxa Selic sobre os preços da economia brasileira varia entre os diferentes grupos de bens e serviços que compõem o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Segundo a pesquisadora Marina Sanches, doutora em Economia pela Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária (FEA) da USP e uma das autoras do estudo, a política monetária brasileira, baseada no controle da Selic, nem sempre tem a mesma eficácia na contenção da inflação em todos os setores.

Marina Sanches – Foto: Linkedin

“O aumento da taxa de juros afeta a economia, principalmente por meio do controle da demanda agregada”, explica Marina. Ela detalha que, ao elevar a Selic, o Banco Central encarece o crédito, desestimula o consumo e o investimento e aumenta o desemprego, o que ajuda a aliviar a pressão sobre os preços. No entanto, esse efeito não é homogêneo entre os diferentes componentes do IPCA. Grupos como alimentação e bebidas, artigos de residência e vestuário são mais sensíveis ao aumento dos juros, enquanto outros, como saúde e habitação, não respondem da mesma forma.

Marina enfatiza que a sensibilidade dos preços à Selic varia conforme o setor. “Os preços de alimentação e bebidas, por exemplo, caem quando a taxa de juros sobe, porque esses setores dependem mais de crédito e renda disponível”, explica. Entretanto, setores como habitação e comunicação, que têm contratos mais longos e regulação de preços, não mostram a mesma resposta. “O setor de saúde e cuidados pessoais, curiosamente, respondeu de forma positiva, já que a demanda é inelástica e o aumento dos custos de financiamento acaba sendo repassado ao consumidor”, acrescentou a economista.

Estudos e dados

A pesquisadora destaca que o estudo utilizou dados do Brasil entre 2007 e 2023 e aplicou um modelo econométrico para medir esses impactos. O resultado principal aponta que, em média, a elevação da Selic reduz a inflação agregada em apenas 0,02 ponto porcentual após 24 meses. “Isso sugere que a inflação, no agregado, não é muito sensível à taxa de juros”, afirma Marina, corroborando resultados similares encontrados na literatura econômica.

O estudo também sugere que a eficácia da política monetária depende do grupo de bens que está impulsionando a inflação. “Se a alta da inflação for puxada por alimentos ou artigos de residência, que respondem mais à taxa de juros, a política monetária será mais eficaz. Mas se a inflação for causada por transporte ou saúde a Selic terá menos impacto”, explicou a pesquisadora, ressaltando que isso limita a eficácia da política monetária.

Marina Sanches alerta para as implicações sociais desse cenário. “A política monetária tem um custo social elevado, como aumento do desemprego e da desigualdade de renda. Se o Banco Central não levar em conta a dinâmica dos diferentes componentes do IPCA pode acabar sacrificando a economia e a população sem alcançar o objetivo de controlar a inflação”, disse ela, sugerindo uma abordagem mais cautelosa na formulação das decisões sobre a taxa de juros.

O estudo do Made reforça a necessidade de reavaliar os mecanismos de transmissão da política monetária no Brasil. Marina conclui dizendo que o Banco Central deve considerar não apenas a inflação agregada, mas também os setores que estão exercendo maior pressão sobre os preços, para que a política seja mais equilibrada e eficaz, minimizando os impactos negativos sobre a sociedade.


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