“Elis e Tom”, o filme que resgata alguns dos maiores momentos da nossa música

O filme registra a gravação do disco homônimo, a partir do material bruto captado em Los Angeles em 1974

 02/11/2023 - Publicado há 6 meses     Atualizado: 06/11/2023 as 9:42
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Eu queria comentar esse filme maravilhoso que é Elis e Tom, um filme que registra na forma do cinema o que foi feito em 1974 durante a gravação do disco Elis e Tom, a partir do material bruto que tinha sido captado em Los Angeles. Esse material sobreviveu por décadas e esperou até este momento. O disco é um capítulo essencial da história da MPB, um disco muito celebrado. E ali a gente já sentia, ao ouvir o disco, a felicidade desse encontro, um encontro até certo ponto improvável entre Elis e Tom,  porque não são exatamente dois caminhos ou dois estilos musicais que se combinam. A princípio, tinham até resistências, mas ali acontece essa mágica da arte, que é a maravilha da afinação, do ritmo, da precisão da Elis removendo, de certa forma, os rebuscados, os exageros que ela tinha. E o Tom que ganha assim uma intérprete como ele nunca teve e numa associação musical com César Camargo Mariano, com o Hélio Delmiro e toda aquela banda incrível que, apesar de todos os ruídos e problemas que o filme mostra, resultou no que havia de melhor de cada um. A gente sente, inclusive, nas imagens, naquela relação tão forte entre Elis e Tom, durante aquele tempo em que foi gravado, uma potência artística e de atração em todos os níveis, que é também uma das fórmulas do segredo do que aconteceu.

A gente ouve os discos do Tom Jobim da época, começando por Stone Flower, de 1970; Matita Perê, de 1972, e mesmo Urubu, que é de 1976, é um Tom sinfônico, tem muito de Villa Lobos e aquela coisa dos arranjos fluidos, vaporosos, que são escapadiços e que, de certa maneira também, ao fazer isso, escapa um pouco do formato da canção tal como tinha sido desenhada na bossa nova. E quando entra César Camargo, a princípio aquilo é um choque, por que quem é que vai desafiar Tom Jobim, como é que pode alguém imaginar que pode arranjar para Tom Jobim as músicas dele?

Mas a verdade é que César Camargo e a banda trazem um swing, aquelas convenções muito ligadas ao jazz, como no arranjo dos contratempos de Brigas Nunca Mais, por exemplo, e que acabam com todo o respeito que ele tinha pelo Tom. Evidentemente, a marca do Tom está impressa em tudo, sobretudo nas músicas Águas de Março e Chovendo na Roseira, que são absolutamente Tom Jobim, mas também naquelas de amor rasgado como Modinha, Por toda a Minha VidaSoneto da Separação. Mas tem outras, como Só Tinha de Ser com Você, por exemplo, onde essa marca aparece com muita originalidade e se revela inclusive no diálogo entre o arranjo, os solos instrumentais e a própria precisão da Elis, que também canta como se fosse um instrumento, gerando alguns dos maiores momentos da nossa música.


Espaço em Obra
A coluna Espaço em Obra, com o professor Guilherme Wisnik, vai ao ar  quinzenalmente quinta-feira às 8h, na Rádio USP (São Paulo 93,7; Ribeirão Preto 107,9) e também no Youtube, com produção da Rádio USP,  Jornal da USP e TV USP.

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