Professora da USP recebe prêmio de excelência acadêmica em sociologia

Nadya Araújo Guimarães recebeu a homenagem por suas contribuições ao campo do “cuidado” durante o 47º Encontro Anual da Anpocs, em Campinas

 27/10/2023 - Publicado há 6 meses     Atualizado: 30/10/2023 as 12:32
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Nadya Guimarães (à direita) foi uma das três mulheres homenageadas no 47º Encontro Anual da Anpocs – Foto: Valério Paiva – IFCH Unicamp
A professora Nadya Araújo Guimarães, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, foi homenageada pela Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs) com um prêmio que celebra sua carreira acadêmica e suas contribuições à sociologia. Criado há dez anos, o Prêmio Anpocs de Excelência Acadêmica homenageia intelectuais reconhecidos por suas importantes contribuições nas áreas de antropologia, ciência política e sociologia a cada edição.

Neste ano, Nadya Guimarães foi premiada ao lado de outras duas mulheres, cada uma delas representando uma das três áreas clássicas das ciências sociais. A cerimônia de premiação aconteceu durante o 47º Encontro Anual da Anpocs, realizado nesta semana em Campinas.

Na cerimônia, a reconhecida socióloga Helena Hirata destacou a contribuição de Nadya à sociologia a partir da elaboração de conceitos e categorias como o “circuito de cuidado” e o cuidado como profissão, obrigação ou ajuda.

“Eu conheci a Nadya nos idos de 1980, em um seminário que organizei na USP sobre processos de trabalho com especialistas de todo o Brasil sobre esse tema. Ela veio da Bahia para enriquecer esse seminário com as pesquisas sobre o pólo petroquímico de Camaçari e a questão das identidades operárias”, contou Helena, que também lembrou da parceria das duas pesquisadoras em trabalhos e cursos sobre temas como desemprego e divisão sexual do trabalho.

Nadya Guimarães (no centro), com a cientista política Andréia Galvão, da Unicamp, e a socióloga Helena Hirata na cerimônia de premiação da Anpocs - Foto: Valério Paiva - IFCH Unicamp
Nadya Guimarães (no centro), com a cientista política Andréia Galvão, da Unicamp, e a socióloga Helena Hirata na cerimônia de premiação – Foto: Valério Paiva – IFCH Unicamp

Nadya disse sentir-se honrada em receber o Prêmio Anpocs de Excelência Acadêmica Antônio Flávio Pierucci em Sociologia, cujo nome homenageia seu falecido colega no Departamento de Sociologia da FFLCH. A docente dedicou o prêmio a seus orientadores: Glaucio Ary Dillon Soares, Barbara Freitag e Ruy Mauro Marini.

“Uma trajetória se constrói de escolhas. Escolhas que são e que devem ser individualmente assumidas em suas boas e em suas más consequências. Entretanto, se as escolhas são solitárias, a possibilidade de chegar até elas é sempre partilhada”, disse a homenageada na categoria da sociologia. “Com frequência, apenas nos damos conta, depois, que perseguimos caminhos porque admiramos pessoas que antes o trilharam, ou admiramos o seu modo de trilhá-los, o seu modo de ser, e nele nos espelhamos. Assim, ao receber esse prêmio, eu gostaria de partilhá-lo com algumas dessas pessoas que foram, e continuam sendo, os meus faróis”, completou.

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Especialista em sociologia econômica e do trabalho, Nadya Guimarães atuou no movimento estudantil de Salvador durante a juventude e migrou da história para as ciências sociais na graduação. É mestre em Sociologia pela Universidade de Brasília (UnB) e doutora na mesma área pela Universidad Nacional Autónoma de México (UNAM). Fez pós-doutorado no Massachusetts Institute of Technology (MIT), nos Estados Unidos. Lecionou na UnB e na Universidade Federal da Bahia (UFBA), ingressando como docente na USP em 2002.

Atualmente, é professora titular sênior da FFLCH e pesquisadora do Cebrap, onde coordena a equipe brasileira do projeto Who Cares?, que se propõe a contribuir com a construção das políticas de cuidado pós-pandemia. Publicou os livros Trabalho flexível, empregos precários?, vencedor do prêmio Jabuti em 2009, e Caminhos Cruzados: Estratégias de Empresas e Trajetórias de Trabalhadores, fruto de sua tese de livre docência.

Mulheres da antropologia e da ciência política

No evento, também foram homenageadas a antropóloga Beatriz Góis Dantas, professora emérita da Universidade Federal de Sergipe (UFS), e a cientista política Evelina Dagnino, professora titular colaboradora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Homenageada com o Prêmio Anpocs de Excelência Acadêmica Gilberto Velho em Antropologia, Beatriz Góis Dantas começou sua carreira acadêmica na década de 1960 e participou da criação dos programas de pós-graduação da UFS. Fez contribuições à pesquisa e docência em temas como folclore, cultura popular, religiões afro-brasileiras e relações étnico-raciais.

“Foi a primeira pessoa que eu conheci que recusou que seu mestrado aqui na Unicamp fosse imediatamente transformado em doutorado. E essa recusa até hoje eu tenho dificuldade de entender”, disse Manuela Carneiro da Cunha, professora da FFLCH, que apresentou a pesquisadora premiada na categoria da antropologia.

Beatriz Góis Dantas e Manuela Carneiro da Cunha – Foto: Valério Paiva/IFCH Unicamp

Um dos trabalhos mais impactantes de Beatriz trata do conflito fundiário em torno das terras dos indígenas Xocó. A pesquisa da professora sergipana fundamentou a argumentação da Comissão Pró-Índio em defesa dos direitos dos povos originários e deu origem ao livro Terra dos índios Xocó: estudos e documentos, em coautoria com Dalmo Dallari. Manuela lembrou também que pesquisas de Beatriz inspiraram a fundação do Núcleo de História Indígena e do Indigenismo da USP, em 1986.

Por sua vez, a homenageada com o Prêmio Anpocs de Excelência Acadêmica Gildo Marçal Brandão em Ciência Política tem sua trajetória marcada pelo compromisso com a construção da democracia no Brasil e a crítica a uma visão essencialista da sociedade civil como um polo virtuoso que seria contraposto a um Estado autoritário e corrupto. Como lembrou Luciana Tatagiba, professora da Unicamp que foi orientanda de Evelina Dagnino na pós-graduação, tal posicionamento está no cerne do conceito de “projeto político”, cunhado pela docente premiada na categoria da ciência política para explicar como as ideias políticas que motivam a ação coletiva e as decisões estatais perpassam tanto a sociedade civil quanto os políticos e a burocracia – o que implica em reconhecer que existem democratas e autoritários tanto na sociedade civil quanto em cargos estatais.

Evelina Dagnino com o Prêmio Anpocs de Excelência Acadêmica Gildo Marçal Brandão em Ciência Política, ao lado de sua ex-orientanda Luciana Tatagiba - Foto: Valério
Evelina Dagnino com o Prêmio Anpocs de Excelência Acadêmica Gildo Marçal Brandão em Ciência Política, ao lado de sua ex-orientanda Luciana Tatagiba – Foto: Valério Paiva/IFCH Unicamp

Formada em jornalismo pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Evelina fez mestrado em ciência política na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e doutorado na mesma área na Universidade Stanford, nos Estados Unidos. Na época, pesou na decisão de estudar no exterior o fato de ter sido presa pela ditadura militar. De volta ao Brasil, a docente influenciou profundamente o programa de pós-graduação em ciência política da Unicamp. Suas obras tiveram impacto internacional importante, algumas delas tendo sido publicadas em mais de 20 países.

“Quero repartir esse prêmio com meus ex-alunos e alunas, meus ex-orientandos e orientadas e também os meus parceiros de pesquisa em vários lugares do mundo, que foram muito importantes na minha trajetória intelectual e pessoal”, disse Evelina ao agradecer à Anpocs pela homenagem.

Confira o vídeo da cerimônia completa no Youtube.


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