Cerca de 200 línguas podem estar em circulação nos campi da USP

Em maio e junho, encontros vão abordar idiomas menos falados na Universidade, como o havaiano e o esperanto

 14/05/2021 - Publicado há 3 anos     Atualizado: 18/05/2021 as 12:50
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Arte: Jornal da USP

 

Pode-se estimar que cerca de duas centenas de línguas diferentes são faladas no cotidiano da USP – dada a intensa mobilidade de professores e estudantes originários de outros países. Entre elas estão o crioulo haitiano, havaiano, polonês, esperanto, guarani e eslavo eclesiástico. Pouco comuns e menos faladas, essas seis línguas serão estudadas de 18 de maio até 25 de junho numa série de encontros promovidos pelo projeto de extensão universitária Línguas na USP/Línguas da USP, coordenado pelo professor Milan Puh, da Faculdade de Educação da USP. Os encontros são gratuitos e abertos a todos os interessados, com transmissão pelo canal do projeto no Youtube.

O projeto foi criado por Puh no final do ano passado e tem como objetivo formar um espaço para essas línguas e culturas, ampliando a democratização e a diversidade do ensino de línguas menos divulgadas, como conta o professor. “Para além da série de encontros, o projeto visa a pensar em maneiras de tornar mais visível essa riqueza de línguas que temos na Universidade e na própria cidade de São Paulo”, afirma Puh. Segundo o professor, a mobilidade e a recepção de alunos estrangeiros ingressantes em cursos de graduação e pós-graduação, além do crescente número de imigrantes e refugiados, vindos de diferentes lugares do mundo, se relacionam com a internacionalização da Universidade, daí a importância de mapear a presença dessas línguas.

Línguas na USP/Línguas da USP é um desdobramento do pós-doutorado do professor Milan Puh, realizado entre 2018 e 2019 no Paraná, que tinha como premissa pensar a internacionalização que partisse também da realidade local das instituições, e de suas línguas e culturas. “A realidade paranaense não é semelhante à de São Paulo, mas é uma realidade interessante de línguas”, afirma, explicando que só depois a ideia foi trazida para a USP e transformada em um projeto de extensão. Inclusive, diz, nesse primeiro ciclo de encontros, o projeto conta com a parceria da Universidade Federal do Paraná (UFPR), que tem uma proposta semelhante, intitulada Línguas em Diálogo.

O professor Milan Puh, da Faculdade de Educação da USP – Foto: Divulgação

 

Diversidade linguística

No total serão 12 encontros, sempre às terças e sextas-feiras, a partir  das 17h45, com duração de 1h30, em que cada uma das seis línguas será estudada em dois dias de eventos. Além de apresentar noções da língua, os encontros pretendem sensibilizar o público para a diversidade linguística, como espera o professor. Por esse motivo, as línguas escolhidas para essa série inicial incluem desde uma língua religiosa, o eslavo eclesiástico, até uma língua inventada, o esperanto. Além disso, cada curso vai trabalhar com um tipo de atividade para aprofundar o conhecimento da língua.

Texto em eslavo eclesiástico. Idioma usado pelas Igrejas Ortodoxas espalhadas pelo mundo – Foto: Wikimedia Commons

Nos dias 18 e 21 deste mês, a primeira língua a ser analisada será o eslavo eclesiástico, utilizada atualmente em Igrejas Ortodoxas ao redor do mundo. “Ela é usada pela Igreja Ortodoxa assim como o latim é usado pela Igreja Católica, e também é uma base para várias outras línguas eslavas”, explica Puh. O palestrante será Diego Vieira, mestrando da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, que trabalha e canta o eslavo eclesiástico, e vai propor atividades acerca da música religiosa.

Na sequência, nos dias 25 e 28, Sthakana Habiganov Cadet, licencianda em Química pela USP, apresentará o crioulo haitiano. “É uma língua que surgiu a partir do contato de diferentes línguas africanas com o francês no Haiti”, explica Puh. Além de discutir o que é uma língua crioula e o seu significado, diz o professor, Sthakana vai abordar por que, em determinada época, o próprio português brasileiro era chamado de uma “língua crioulizada”. A palestrante é imigrante haitiana e possui um blog dirigido a jovens haitianos para promoção de melhor qualidade de vida.

A terceira língua a ser contemplada, nos dias 1º e 4 de junho, será o esperanto, uma língua inventada no século 19 pelo polonês Ludwig Lazar Zamenhof (1859-1917), que tinha como proposta criar um idioma que servisse como meio de comunicação internacional. “Zamenhof queria, naquele momento de nações e nacionalismos, propor uma língua que pudesse ser falada por qualquer pessoa, independente do lugar”, informa Puh. O curso será ministrado por três palestrantes: o professor Ivan Colling, da UFPR, Lígia Maffessoni Penia, graduada em Relações Internacionais, e o professor Luiz Fernando Dias Pita, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).

Tema do projeto Línguas na USP/Línguas da USP nos dias 8 e 11 de junho, o havaiano não é falado efetivamente no Brasil, onde não há comunidades nem falantes em grande número desse idioma originário do Havaí. Puh explica que, quando o Havaí foi colonizado pelos Estados Unidos, a língua local quase se perdeu completamente, mas passou por um processo de recuperação e se revigorou. “Isso é importante para o contexto brasileiro, em que há centenas de línguas indígenas e línguas de imigração e que também precisam passar por um processo de revitalização”, destaca o professor. “Precisamos tirar essa imagem de um Brasil monolíngue e mostrar, a partir do havaiano, o que pode ser feito.” O havaiano será analisado por Marcos Nogas, aluno de Letras da UFPR.

Já o polonês, a quinta língua a ser estudada, nos dias 15 e 18 de junho, é, entre as línguas eslavas, aquela que está mais presente no Brasil, especialmente no Sul do País, como relata o professor, lembrando que a Universidade Federal do Paraná oferece um curso de graduação em língua polonesa. Os palestrantes são professores da UFPR, onde se formaram: Claudia Kazubek e Luiz Henrique Budant. Segundo Puh, a ideia é mostrar como essa língua, presente no Brasil há cerca de 150 anos, foi se transformando ao longo do tempo, em contato com o português. “O polonês falado no Brasil é bem diferente do polonês original, e precisamos reconhecer que isso não é um problema e não faz dela uma língua corrompida ou que se perdeu”, comenta.

Capa do livro Arte da Língua Guarani, de Antonio Ruiz de Montoya, publicado em 1724 – Foto: Wikimedia Commons

Nos dias 22 e 25 de junho, finalmente, será apresentado o guarani, tanto a língua falada no Brasil como a língua oficial do Paraguai. O encontro será ministrado por Patrícia Villaverde, coordenadora do grupo de dança paraguaia Alma Guarani – que também se apresenta durante o curso – e Lucino Rodriguez Baroffi, escritor e professor da língua guarani. Como informa Puh, o curso vai mostrar o quanto o guarani é presente nos territórios da América Latina e quais são suas semelhanças e diferenças. Também será abordada a presença do guarani no cotidiano brasileiro, incluindo uma atividade que propõe a busca por nomes ou locais que tenham origem no tupi-guarani.

“Queremos destacar essa diversidade de línguas – indígena, crioula, religiosa, de imigração, criada e revitalizada – para mostrar que a concepção de língua é muito diversa”, comenta Milan Puh, que conta com a colaboração de dois bolsistas na organização dos encontros, Laís Vitória Favaro e Pedro Henrique Camargo. “Temos que abrir espaço para essas ‘diferencialidades’, já que temos essas línguas circulando invisivelmente, e promover a Universidade como um lugar plural.”

O ciclo de encontros Línguas na USP/Línguas da USP acontece de 18 de maio a 25 de junho, sempre às terças e sextas-feiras, das 17h45 às 19h15, com transmissão ao vivo pelo canal do projeto no Youtube.  Os eventos são gratuitos e abertos a todos os interessados, sem necessidade de inscrição. Mais informações sobre o projeto estão disponíveis no site Línguas em Diálogo, da Universidade Federal do Paraná (UFPR).


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