Foto: Divulgação/Levoc MAE USP

São Paulo da pedra lascada: mapa interativo apresenta sítios com artefatos dos primeiros humanos no Estado

Material é resultado de bancos de dados de acesso aberto elaborados por pesquisadores do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP e informa sobre a ocupação humana no interior paulista; outro mapa mostra idade de sítios arqueológicos brasileiros

 16/10/2023 - Publicado há 7 meses     Atualizado: 10/11/2023 as 7:29

Luísa Hirata*

Para divulgar suas descobertas ao público especializado e geral, pesquisadores do Laboratório Interdisciplinar de Pesquisas em Evolução, Cultura e Meio Ambiente (Levoc), do Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE) da USP, vêm disponibilizando mapas interativos que ilustram bancos de dados elaborados na realização de estudos sobre o processo de ocupação dos primeiros grupos humanos. Os dados brutos também são de acesso aberto.

O primeiro mapa lançado pelo grupo foi do Banco de dados georreferenciado para artefatos líticos do interior paulista, de 2022, produzido como uma das ferramentas de pesquisa da tese de doutorado A variabilidade das indústrias líticas no interior paulista: uma síntese regional, de Letícia Cristina Correa, e complementado pelos dados obtidos pelo projeto temático em andamento A ocupação humana do Sudeste da América do Sul ao longo do Holoceno: uma abordagem interdisciplinar, multiescalar e diacrônica, liderado por Astolfo Araujo, coordenador do Levoc e professor do MAE. Ambos os projetos contaram com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), pelos processos de número 2017/20340-1 e 2019/18664-9, respectivamente.

No doutorado, Letícia buscou entender como se deu a dispersão dos artefatos de pedra lascada pelo interior de São Paulo e sugerir similaridades ou rupturas culturais presentes nesse território, além de apontar questões para pesquisas futuras na área.

A pedra lascada foi utilizada na confecção de utensílios e ferramentas. “Esse tipo de pedra mostra as ocupações mais antigas que podemos mapear porque é mais resistente à ação do tempo que materiais orgânicos como ossos e madeira”, explica Letícia. No caso de São Paulo, a existência desses vestígios poderia indicar a presença de grupos humanos entre 12 mil e 3 mil anos atrás aproximadamente, segundo a pesquisadora. 

Ao todo, o estudo obteve 847 dados a partir de um levantamento bibliográfico feito principalmente no Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e na Biblioteca do MAE. O banco está em constante atualização, então novos mapas podem ser continuamente gerados a partir dele. 

Letícia Cristina Correa, pesquisadora do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP - Foto: Instagram

No mapa já publicado neste link, os sítios podem ser visualizados de acordo com o tipo de material arqueológico (são cinco: lasca, lasca retocada, plano-convexo, ponta e seixo lascado), de forma conjunta ou isolada, em três opções de delimitação geográfica: bacias hidrográficas, biomas e malha estadual (esta última na opção “desligado”). Também é possível pesquisar pelo nome do sítio e dos pesquisadores e empresas privadas envolvidos na identificação. Clicando no ícone, você encontrará mais detalhes sobre cada local. 

Como o acesso aos sítios é restrito, necessitando de autorização, o mapa indica somente sua localização aproximada, e não as coordenadas geográficas exatas. “Não incentivamos nenhum tipo de turismo ou visita aos sítios, pois não há estrutura para essa atividade”, afirma Letícia.

Letícia Correa em trabalho de campo no sítio lítico Igualdade, na cidade de São Manuel, em São Paulo, em 2018, e uma pedra lascada encontrada no local - Foto: Divulgação/Levoc MAE USP

Mapa dos sítios de pedra lascada no interior de São Paulo

Clique na imagem para acessar o mapa interativo

Foto: Divulgação/Levoc MAE USP

De acordo com a pesquisadora, esse tipo de compilação contribui tanto como base de apoio de busca para o campo acadêmico e de licenciamento ambiental, que precisam de dados para fazer a avaliação do potencial arqueológico de áreas de interesse, quanto como meio de conscientização do público geral sobre a existência desses pontos em seu entorno. “Temos recebido um ótimo feedback de moradores locais que relataram a existência de artefatos em lugares específicos da cidade, principalmente no que chamam de ‘pontas de flecha’, que são mais fáceis de serem reconhecidas”, conta Letícia.

O mapa foi construído com o apoio de Arthur Miyazaki, engenheiro elétrico e pesquisador da Escola Politécnica (EP) da USP, e está em processo de aprimoramento para receber novos recursos, como a distinção dos tipos de artefatos por cor, e, dessa forma, facilitar a visualização e interpretação dos dados. 

Os dados brutos do banco estão disponíveis para consulta no modo leitura, necessitando de solicitação de acesso. Se você quiser comunicar alguma informação relacionada aos sítios para a equipe do Levoc, escreva para o e-mail levocmaeusp@gmail.com.

Sítio Bastos, localizado na Fazenda Monte Alto, em Dourado, interior paulista, é atualmente o sítio arqueológico mais antigo do Estado de São Paulo, com idades acima de 12.700 anos, o que o coloca também como um dos mais antigos do Brasil - Foto: Divulgação/Levoc MAE USP

Idade dos sítios brasileiros

Outro banco disponibilizado pelo grupo do MAE no formato de mapa é o Banco de dados de datações do Brasil, que compila a idade de todos os sítios arqueológicos brasileiros identificados pelos cientistas até junho deste ano, quando foi feita a publicação, de acordo com sua distribuição espacial. Essa sistematização é um dos resultados diretos do projeto temático em andamento A ocupação humana do Sudeste da América do Sul ao longo do Holoceno: uma abordagem interdisciplinar, multiescalar e diacrônica, liderado por Astolfo Araujo, coordenador do Levoc e professor do MAE, e apoiado pela Fapesp (processo nº 2019/18664-9).

Também participaram do desenvolvimento do banco os pesquisadores do MAE Letícia Cristina Correa e Glauco Constantino junto de Mercedes Okumura, do Instituto de Biociências (IB) da USP, e Enrico Dalmas, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Mapa de idade dos sítios arqueológicos brasileiros

Clique na imagem para acessar o mapa interativo

Foto: Divulgação/Levoc MAE USP

Na maior parte dos casos, o método utilizado para determinar a idade do sítio foi o radiocarbônico, popularmente conhecido como carbono-14, mas o banco também traz idades geradas pela luminescência, técnica correspondente a quase 4% dos registros, e aquelas consideradas “inconsistentes” por outros cientistas. Confira mais detalhes sobre as decisões metodológicas dos pesquisadores na construção do banco neste link

No mapa, você pode navegar pelo nome do sítio e do município ou região onde ele está localizado.  A localização é aproximada. Para mais detalhes, clique nos ícones. Os dados brutos das idades podem ser acessados na íntegra clicando aqui.

Astolfo Araujo, Mercedes Okumura e Glauco Constantino: pesquisadores da USP sistematizaram idade dos sítios brasileiros - Foto: Divulgação/Levoc MAE USP

Esse material foi utilizado na elaboração de um artigo, em processo de publicação, que discute os impactos paleoambientais dos últimos 15 mil anos da ocupação humana na porção leste da América do Sul e que hoje chamamos de Brasil.

Para entrar em contato com os pesquisadores do Levoc sobre esses e outros trabalhos, basta escrever para o e-mail levocmaeusp@gmail.com. Acompanhe as atividades do grupo no Instagram.

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* Estagiária sob supervisão de Claudia Costa e Thais Santos 


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