Muita tecnologia na preparação da cirurgia e acompanhamento dos bebês desde a gestação são os destaques do mais recente procedimento do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (HCFMRP) da USP para separar as gêmeas Mariah e Alana, de 1 ano e 7 meses, que nasceram unidas pelo crânio.
Esse é o segundo caso de separação de siameses que o HCRP realiza. O primeiro, inédito no Brasil, ocorreu com sucesso, em 2018, com as gêmeas Maria Ysabelle e Maria Ysadora. Assim como ocorreu com as antecessoras, Mariah e Alana passaram pela primeira cirurgia, realizada com sucesso no dia 6 de agosto, em que tiveram parte das veias do cérebro seccionadas.
O processo é conduzido por uma equipe multidisciplinar de 40 profissionais do HCRP e prevê a realização de pelo menos mais três outras cirurgias para a separação total de Mariah e Alana, o que deve acontecer somente daqui há um ano, mas o trabalho da equipe começou já há um bom tempo, ainda no pré-natal.
“A UTI neonatal cuidou dessas crianças para que elas pudessem chegar na condição boa que estão agora para serem submetidas a esse processo de separação”, afirma a professora Ana Paula Carlotti, coordenadora do Centro de Terapia Pediátrico do HCRP, que acompanha as gêmeas desde o pré-natal.
Ao lado dos cuidados pré e pós-natal, os avanços tecnológicos também estão fazendo a diferença, acreditam os professores da USP em Ribeirão Preto, ao permitir que a equipe estude antecipadamente as etapas cirúrgicas. “São cirurgias que acontecem, por incrível que pareça, antes do procedimento”, conta o professor Hélio Rubens Machado, neurocirurgião do Departamento de Cirurgia e Anatomia.
“Quando chegamos ao centro cirúrgico, já sabemos o que vamos fazer”, continua Machado, já que o trabalho começa com as imagens dos crânios, transformadas em modelos tridimensionais, numa fase pré-cirúrgica em que a equipe estuda e planeja minuciosamente todo o processo.
São imagens de exames de tomografia e ressonância magnética dos crânios das gêmeas processadas por um software específico. Os resultados dos exames “são dissecados minuciosamente e transferidos para uma impressora 3D, que vai produzir aquilo que foi a primeira grande revolução no tratamento desses casos, que são os modelos”, diz o professor.
Esses modelos tridimensionais permitem a visualização e estudo de cada uma das veias que serão seccionadas, auxiliando o meticuloso planejamento de cada etapa da separação. A tecnologia que possibilita a confecção desses modelos, assegura Machado, promoveu mudança gigantesca para viabilizar esse tipo de cirurgia, ao possibilitar o manuseio das peças como se fossem os próprios crânios, podendo observar e escolher “quais são as veias [que serão separadas]”, diz.
Condições favoráveis para a separação
Os cuidados que precederam o início da etapa cirúrgica garantiram “um bom estado nutricional e físico”, informa a professora Ana Paula. As gêmeas nasceram “em um serviço especializado” e foram acompanhadas no HC Criança, com alimentação e crescimento saudáveis, “para enfrentar todo esse desafio do processo de separação”.
A mesma avaliação é feita pelo professor Machado, que credita aos cuidados pré e pós-natal a grande diferença entre o caso de Mariah e Alana e outros gêmeos unidos pelo crânio. No passado, “essas crianças não tinham a chance de nascer em bom estado e não chegavam a centros como o nosso”.
Talita Francisco Ventura Sestari, mãe das meninas, diz que sua família, desde o início, é acompanhada por “uma equipe maravilhosa” que vem passando segurança total. “A gente tem uma segurança muito grande de entregar as nossas filhas na mão de toda a equipe.”
Cuidados da cirurgia plástica
Para além da anatomia, os procedimentos de separação são decididos em conjunto com a equipe da cirurgia plástica, que planeja “as incisões que serão feitas no couro cabeludo das meninas desde a primeira cirurgia”, conta o professor Jayme Farina, chefe da Divisão de Cirurgia Plástica do HCRP.
Segundo o professor Farina, os “retalhos” de pele deverão cobrir as cabeças das duas meninas ao final da separação, sem que haja danos ao tecido. ”Desde o início, tem que ter esse planejamento das incisões para que não ocorra sofrimento maior desses retalhos.” A equipe demarca a localização dos “futuros expansores de pele”, instalados “antes da cirurgia final”, informa Farina. A técnica é utilizada para que as crianças “ganhem mais pele” e o topo da cabeça seja fechado mais facilmente.
Colaboração: Giovanna Grepi e Patrícia Cainelli
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