Modelo atual de organização sindical favorece greves ilegais no País

Democracia e alternância de poder nos sindicatos, além da possibilidade de mais entidades por categoria, são alternativas para falta de representatividade trabalhista

 05/07/2021 - Publicado há 3 anos
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Uma greve legal é aquela convocada pelos trabalhadores através de seus sindicatos, exigindo melhores condições de trabalho. Trata-se de um direito assegurado pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. No entanto, uma análise feita em 2016, nos bancos de dados dos 24 Tribunais Regionais do Trabalho e do Tribunal Superior do Trabalho, encontrou 44 decisões julgadas sobre greves sem a presença dos sindicatos. O resultado, avaliam os pesquisadores, mostra que os trabalhadores não se sentem representados pelos sindicatos e, portanto, a sociedade deve debater novas formas de organização sindical.

Responsável pela pesquisa, Paulo Henrique Martinucci Boldrin, advogado e mestre pela Faculdade de Direito de Ribeirão Preto (FDRP) da USP, acredita que a estrutura sindical atual, com a “presença de um único sindicato por categoria profissional”, favorece esses movimentos grevistas sem a participação dos sindicatos. Trabalhadores descontentes com a entidade que os representa ficam sem opção de “procurar outro” ou de “criar uma nova entidade” e “acabam paralisando as atividades e fazendo as greves sem a presença dessas entidades”, afirma.

Todos os 44 acórdãos identificados por Boldrin decorreram de discordâncias entre o sindicato e os trabalhadores, que não se sentiam representados pelas entidades e deflagraram as chamadas “greves dissidentes”. Outro fator observado foi a “disputa por representação sindical” com desentendimentos sobre qual era o sindicato da categoria. O pesquisador diz ainda que encontrou registros de greves iniciadas espontaneamente pelos trabalhadores, sem respaldo dos sindicatos.

Fim das greves sem a participação dos sindicatos

Para Boldrin, alguns caminhos podem evitar o problema. No âmbito interno, cada entidade deve ampliar a democracia sindical por meios efetivos de participação dos trabalhadores. Assim, os descontentes podem “manifestar suas próprias opiniões” e “ter seus interesses representados”. Deve também aumentar a rotatividade da diretoria nas eleições, permitindo “mecanismos de alternância de poder”.  

Como fator externo, o advogado acredita na pluralidade sindical, ou seja, na “possibilidade de criação livre de sindicatos e demais entidades representativas dos trabalhadores”, o que seria o caso de uma “emenda na Constituição Brasileira”. É o que defende também sua orientadora, a professora da FDRP Maria Hemília Fonseca, para quem a situação mostra necessidade de renovação na organização sindical do Brasil. Esses “movimentos grevistas, paredistas e de defesa”, diz Maria Hemília, podem até ter motivos justos, mas são inconstitucionais e, por isso, não têm efetividade.  

Para o Poder Judiciário, as greves sem a participação dos sindicatos são abusivas, provocando até “dispensa por justa causa” para alguns trabalhadores. Já no caso dos sindicatos, apesar de não participarem ativamente dos tais movimentos, em alguns casos, são condenados ao pagamento de multas, pois são “efetivamente o representante da categoria”. Além disso, a situação os leva ao “enfraquecimento na luta sindical” e à percepção da importância de ouvir as reivindicações dos trabalhadores.


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