Mulheres enfrentam preconceito pela forma como se vestem e são intimidadas

A socióloga Eva Blay diz que “é preciso reagir a essa situação e impedir esse retrocesso, esse conservadorismo” de cunho cultural

 01/06/2021 - Publicado há 4 anos     Atualizado: 30/07/2024 às 16:24
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Estudo com mulheres brasileiras expõe efeitos da falta de tempo para cuidar da saúde devido a família e trabalho – Foto: Freepik

 

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Desde os primórdios da humanidade, as roupas são muito importantes na vida das pessoas, especialmente das mulheres, sendo um destaque nas mais variadas épocas. Nos séculos passados, as roupas eram mais longas, pesadas e quentes. Com o passar dos anos e a evolução da humanidade, em um país tropical, como o Brasil, as vestimentas foram se modificando. Novos tecidos foram surgindo e se adequando à nossa realidade. Independentemente das mudanças, sempre houve quem se incomodasse com o decote, o comprimento, se a roupa é justa ou não. Hoje em dia, essa realidade está muito mais exposta, com as mulheres enfrentando situações constrangedoras dentro e fora de casa.

Segundo a socióloga Eva Blay, professora emérita da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP e ex-coordenadora do USP Mulheres/ONU, diversos fatores contribuem para essa realidade. “Nós estamos vivendo um momento de retrocesso, desde um presidente da República que criou um Ministério da Mulher, que realmente não é um Ministério da Mulher, mas é um Ministério para o atraso, que discute a questão de sexualidade, proíbe falar em gênero, proíbe falar em qualquer aspecto que diga respeito à liberdade das mulheres. O que nós estamos vendo, essa questão de querer controlar as roupas das mulheres, na verdade o que estão querendo controlar é a liberdade das mulheres.”   

A professora recorda que o ex-presidente Jânio Quadros proibiu o uso de biquíni na praia e ainda cita um episódio em que passou por uma situação constrangedora. “Eu me lembro que meu filho era pequeno e eu estava com meu marido e fomos almoçar em um restaurante que tinha terraço, e eu estava com um shorts muito bem comportado, que ia até o joelho. Eu fui obrigada a colocar uma roupa para poder ficar almoçando com a família.” Na opinião da professora, é preciso reagir a essa situação e impedir esse retrocesso, esse conservadorismo. Segundo ela, “tudo o que diz respeito ao corpo das mulheres mexe com a liberdade, com os direitos, com o lado cultural. Na verdade, o que se está querendo é voltar atrás, acabar com os direitos já conquistados com a Constituição de 1988, que nos deu o direito de sermos pessoas integrais. A liberdade de vestir é só a coisa mais ostensiva dessa liberdade e, aqui no Brasil, vamos fazer muita força para evitar esse retorno cultural”.

Recentemente, foram divulgados casos de mulheres que foram intimidadas ou até mesmo expulsas de espaços por estarem com roupas consideradas “inadequadas”. Em Brasília, um segurança obrigou uma mulher que estava praticando atividade física, com a parte de cima do biquíni, a colocar uma camiseta. No Paraná, uma nova moradora de um condomínio recebeu um bilhete de outro morador incomodado com o modo como ela se vestia, dizendo que ela não estava tendo respeito, usando roupa vulgar. E, nos EUA, a frequentadora de um parque em Oklahoma foi expulsa por estar com um shorts, considerado pelo segurança, curto demais.

Segundo Mariângela Gama de Magalhães Gomes, ouvidora de gênero da Faculdade de Direito da USP e professora do Departamento de Direito Penal, Medicina Forense e Criminologia da USP, “quem é vítima de intimidação, independentemente do local em que ela ocorra, em razão das roupas que está vestindo, pode se dirigir a uma delegacia de polícia e relatar os fatos, porque, possivelmente, ela vai estar sendo vítima de um crime de injúria, de ameaça”. A ouvidora destaca que tudo serve como prova: se ela recebeu bilhetinhos, recados, imagens de câmera de filmagem do condomínio, todo esse material serve como documentação, como prova. “A pessoa que foi preconceituosa, que ameaçou, vai responder criminalmente por seu comportamento e ainda pode responder civilmente pagando uma indenização por danos morais para a vítima.”


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