O Jornal da USP no Ar recebeu hoje (8) Biancha Angelucci, professora no Departamento de Filosofia da Educação e Ciências da Educação da Faculdade de Educação (FE) da USP, para comentar sobre a nova Política Nacional de Educação Especial (PNEE), lançada com ressalvas de especialistas sobre a abordagem para inclusão. Essa nova política busca ampliar o atendimento educacional por meio de turmas e escola especializadas apenas para alunos com deficiência, sem convivência com alunos da rede geral.
A professora Carla afirma que o decreto constitui um enorme retrocesso. “Desde 2018, no governo Temer, buscavam mudanças na política educacional inclusiva. Mas, neste momento, em meio a uma pandemia, sem consultas ou discussões com trabalhadores da educação, é uma situação pela qual não estávamos esperando”, aponta.
Segundo ela, esse decreto está em divergência com a Constituição e com documentos da Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência, que possuem caráter de emenda constitucional. Esses documentos se baseiam na educação inclusiva, ou seja, uma educação comum a todos, feita com as pessoas da rede de ensino geral. “Deficiência é um conceito relacional”, explica a professora, “ou seja, não se refere a características, não é um sinônimo de impedimento. É a nossa sociedade, junto com seus instrumentos, que faz com que essas pessoas não possam exercer sua vida dignamente”.
Outro recuo é em relação à concepção de deficiência como patologia, que volta a ganhar espaço. “Nós, como sociedade, é que devemos garantir direitos. Não podemos, de novo, propagar a ideia de que, por conta de sua deficiência, alguém não se beneficie do ambiente escolar. Nesse pensamento, culpa-se a pessoa com deficiência por não se sentir dentro de uma organização que não é preparada para ela”, critica Carla.
Ela explica que, justamente por conceber a deficiência como ausência de igualdade na sociedade, foi construída uma política de atendimento educacional especializada, como salas especiais multimídia. “Criamos esse conjunto de apoio e colocamos à disposição da rede pública”, diz. Carla afirma que, antes dessa primeira política de educação inclusiva, havia aproximadamente 3 mil matrículas de alunos com deficiência na rede pública. “Hoje, temos mais de 1,2 milhão de matrículas na rede pública. Não é o suficiente, mas é um processo que vai criando mais e mais oportunidades educacionais.”
O novo plano coloca um peso maior sobre a decisão da família de aderir ou não à nova política. “Parece ser o aspecto mais sedutor: de que a família escolhe. Mas escolher entre a garantia da participação social e segregação, isso não é escolha”, aponta Carla. Do ponto de vista das políticas públicas, não se pode ser oferta de um espaço segregado. Se a escola não está sendo suficiente para oferecer tudo aquilo a que as crianças têm direito, deve-se ter mais investimento público, estruturação e reestruturação.
Ouça a íntegra da entrevista no link.
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