A embaixada brasileira em Washington solicitou ao governo dos Estados Unidos o acesso aos documentos produzidos pela agência de inteligência norte-americana, a CIA, durante o período da ditadura militar no Brasil. A determinação do Itamaraty é uma resposta ao pedido feito por Ivo Herzog, fundador do Instituto Vladimir Herzog e filho do jornalista assassinado pelo regime. Para Ivo, a divulgação recente do documento que liga o ex-presidente Geisel à execução de opositores políticos é uma prova de que não havia “porões”, mas, sim, “palácios da ditadura”.
Ivo Herzog comenta que as revelações sobre Geisel mudam o entendimento que se costuma ter sobre esse período histórico. Conhecer o passado, diz ele, é importante para a compreensão dos dias atuais. A política de Estado de repressão, tortura e assassinato não cessou com o fim da ditadura militar. Amarildo, Marielle e o massacre do Carandiru são exemplos da manutenção da cultura da violência pela Polícia Militar, completa. Essa tradição, segundo ele, é alimentada pela impunidade.
A Lei da Anistia, promulgada em 1979, garantiu que agentes do Estado, além de opositores do regime, não seriam punidos pelos crimes cometidos à época. A decisão é contestada desde então e hoje parecem maiores as chances de revisão desse entendimento pelo Supremo Tribunal Federal, segundo avaliação de Ivo e declaração da procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat. Nesse sentido, Ivo concorda quando dizem que é preciso “virar a página” da história, mas lembra a necessidade de que a página esteja escrita antes de ser deixada para trás.
Uma nação sem memória não pode ter identidade e soberania, afirma Ivo Herzog. Ele diz, ainda, que quem acabou com a soberania brasileira foi o próprio Estado, pela destruição, por exemplo, dos documentos do período ditatorial pelo Exército. Ele lembra que o Brasil está precisando recorrer a outro país para resgatar a história nacional. A falta de registros dificulta, também, o trabalho da Comissão da Verdade, responsável por trazer à luz parte dos fatos acontecidos entre 1964 e 1985.
Concluindo, Ivo Herzog revela que a Corte Interamericana de Direitos Humanos deve divulgar nos próximos dias uma sentença de condenação severa contra o Estado brasileiro. O conteúdo ainda não é conhecido, mas Ivo tem esperanças, pelo histórico e pelo transcorrer do processo, que o documento deve “colocar o dedo” na Lei da Anistia. Ele diz ser muito importante ações desse tipo: são parte de uma política de reparação e memória, que são algumas das dimensões do trabalho da Corte.
Jornal da USP no Ar, uma parceria do Instituto de Estudos Avançados, Faculdade de Medicina e Rádio USP, busca aprofundar temas nacionais e internacionais de maior repercussão e é veiculado de segunda a sexta-feira, das 7h30 às 9h30, com apresentação de Roxane Ré.
Você pode sintonizar a Rádio USP em São Paulo FM 93.7, em Ribeirão Preto FM 107.9, pela internet em www.jornal.usp.br ou pelo aplicativo no celular. Você pode ouvir a entrevista completa no player acima.