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Mario Fanucchi – Foto: Cecília Bastos/USP Imagens
Fui surpreendido, um dia destes, por um apresentador de TV dos mais notáveis do País, ao declarar, à sua maneira, o amor pela nossa rica língua portuguesa. (Às vezes não a chamo apenas rica, mas, também, pobre, porque é tão maltratada, sem merecer.)
Mas, voltando ao apresentador… É claro que dele eu só poderia esperar uma atitude franca, traduzida em palavras singelas. Ele sempre foi assim em sua longa e frutífera carreira. Eu que o diga, sem que tenha a intenção de insinuar uma convivência próxima na atualidade. Aliás, desde o momento em que me atrevi a propor uma ideia como a “revisão nas falas”, tenho tomado cuidado em não envolver eventuais interessados na minha causa, revelando nomes e tendências. É uma atitude recomendável, sempre que nos lançamos com uma proposta nada ortodoxa.
Da mesma forma, no andamento de uma pesquisa de opinião, longe de mim a ideia de apontar alguém pelo pecadilho de cometer um ou outro atentado ao nosso idioma. Pecadilho quando é inconsciente, mas, mesmo assim, capaz de causar danos, tendo em conta o efeito multiplicador dos meios eletrônicos. A repetição, a indiferença em corrigir a falha é que merecem atenção.
O fato é que, lá pelas tantas, em seu popularíssimo programa de auditório, o apresentador em questão aludiu à dificuldade de estrangeiros ao lidarem com a nossa língua. E o fez com uma expressão própria (que não vou repetir), cujo significado o público entendeu instantaneamente, reagindo com visível e audível aprovação. São coisas que acontecem de maneira inesperada e nos surpreendem agradavelmente. São coisas que tocam o sentimento, a emoção.
Inspirado nesse acontecimento, puramente casual, constatei que a manifestação espontânea de um comunicador veio ao encontro de toda argumentação que procuramos construir. E mais: dá sinal de que um pensamento comum, mesmo quando se desenvolve em ambientes diversos, é capaz de nos surpreender e, não raro, consolidar-se.
Na fase atual de nossa pesquisa, que denominamos “novos rumos”, julgamos que o apelo aos comunicadores profissionais, principalmente àqueles que atuam no rádio e na televisão, é a forma adequada de obter, num primeiro momento, o apoio necessário para levar avante este projeto. Porque não se trata de algo que pode ser imposto, como se viesse para virar regra, mas, sim, de um fator positivo na valorização daqueles que trabalham diretamente com o público, que são por este admirados; que constituem modelos, tanto na atitude social, quanto no caráter individual.
A maneira correta de falar, o bom senso, a empatia não têm preço – é desejável para todas as pessoas. E estas se tornam aprendizes atentas ao comportamento dos mestres-voluntários que vemos e ouvimos a toda hora na TV e no rádio. É natural, portanto, que adotar a revisão nas falas só pode trazer benefícios – como se comprova, desde tempos imemoriais, com a prática da revisão nos textos. Chegou, portanto, o momento de convocarmos apresentadores, locutores e repórteres de rádio e TV para uma ampla discussão. Já denominamos essa operação de “pós-revisão” – pois é executada depois do assunto ir para o ar. Seu efeito é de corrigir erros nas falas, para que os mesmos não se repitam.
O problema exige:
1) um estudo, entre pessoas diretamente envolvidas, para a criação de uma metodologia específica;
2 ) avaliação dos meios necessários para a realização de testes com a cooperação de uma ou mais emissoras dispostas a colaborar;
3 ) execução dos testes e apresentação dos seus resultados.
Teoricamente, o projeto tem o potencial de melhorar o tratamento do que é dito ao microfone, em quaisquer dos meios de divulgação empregados, com evidentes benefícios ao nosso idioma. Na vigília que estamos mantendo, tanto no rádio como na televisão, verificamos que um jeito muito à vontade (e até meio descuidado) de passar a mensagem é praticado por um número crescente de locutores, repórteres, apresentadores, bem como de não profissionais (no papel de entrevistados), como se esse fosse o único meio de prender a atenção da audiência.
Felizmente, não se trata de uma atitude generalizada. É como se alguns daqueles que falam pelas emissoras estivessem dispostos a fazer concessões, em busca de uma facilidade maior na troca de ideias com os ouvintes. Divirjo desse ponto de vista e digo por que: uma vez que a introdução da revisão nas falas visa a garantir o melhor resultado possível – equivalente, portanto, à revisão nos textos –, é importante manter o máximo rigor na sua execução. Assim, no momento mesmo de iniciar as discussões e criar normas, espera-se que os profissionais participantes do projeto desempenhem seu papel com o objetivo principal de fazer da revisão nas falas um fator de progresso nos meios de comunicação.
Comentário: A cobertura dos Jogos de Inverno foi um espetáculo completo de técnica, beleza de imagens e mensagem positiva. Só pecou por uma coisa: a versão brasileira, graças aos comentaristas, que insistiram em cometer, o tempo todo, o mais grosseiro dos cacófatos, ao se referirem às maravilhosas patinadoras: “A técnica delas é fantástica!…” E teria sido tão fácil dizer, simplesmente: “Sua técnica é fantástica!”