Consultas públicas são essenciais para o bom funcionamento do Estado Democrático de Direito

Eunice Prudente e Alberto Ribeiro explicam que aprovar projetos sem ouvir a população traz riscos até mesmo para o governante

 Publicado: 04/07/2024
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Desde o fim da ditadura e a abertura democrática, a sociedade civil se tornou bastante organizada no Brasil – Foto: Herton Escobar/USP Imagens
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Eunice Aparecida de Jesus Prudente – Foto: Cecília Bastos/USP Imagens

Em maio de 2024, foi apresentado o projeto de concessão da rodovia Raposo Tavares (SP 270) para a iniciativa privada. O projeto, intitulado Nova Raposo Tavares, pretende também ampliar faixas, instalar novos pedágios e retirar pontos de ônibus da rodovia, para isso desmatando áreas verdes e desapropriando imóveis. O projeto enfrenta muita resistência por parte de setores civis: associações de moradores da Granja Viana, em Cotia, e de São Paulo já se posicionaram contra e o Conselho Deliberativo do Clube Alto dos Pinheiros também demonstrou preocupação com a maneira com que o projeto está sendo tocado. A principal crítica é que ele não passou pelas devidas consultas públicas, as audiências foram mal divulgadas e, portanto, esvaziadas.

Conforme explica Eunice Prudente, professora de Direito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, é obrigatório que a população seja consultada antes desses grandes projetos: É obrigatório que esse tipo de processo passe por uma consulta pública em um Estado Democrático de Direito, inclusive para segurança da própria administração pública, que vai dispor de verba pública, serviços públicos, de diversos funcionários, diversos servidores, vai promover contratações. É mais seguro para o próprio governante realmente organizar as audiências”.

Organização civil

A professora conta que, desde o fim da ditadura e a abertura democrática, a sociedade civil se tornou bastante organizada no Brasil, portanto, as audiências públicas são essenciais para o aprimoramento do projeto. “Desde 88, o Brasil construiu uma sociedade civil muito forte, muito organizada, então as informações que advêm dela também são corretas. Por exemplo, o Fórum Brasileiro de Segurança nunca apresentou um dado errado. A sociedade civil brasileira tem entidades sérias e isso ajuda muito a administração pública,” expõe Eunice.

Alberto Ribeiro Gonçalves de Barros – Foto FFLCH –
http://lattes.cnpq.br/9398953839662428

Alberto Ribeiro, chefe do Departamento de Filosofia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, pesquisou sobre as relações entre direito, soberania e poder. Para o professor, a participação popular é a base de todo regime democrático. “O fundamento dessas práticas remonta à ideia de que o que concerne a todos deve ser decidido por todos e ao princípio, que está no fundamento do pensamento político moderno de que todo poder tem origem no povo. Quanto mais participação popular, mais democrático é o regime político. Entre as diversas formas de participação popular, fora do período eleitoral, encontram-se as consultas populares e os plebiscitos. Consulta popular é uma prática democrática bem recente no Brasil, foi institucionalizada por Emenda Constitucional em 2021, já o plebiscito remonta à antiguidade, desde a Roma antiga”, explica Ribeiro.

Mas o professor lança um aviso: a participação popular deve ser sempre proposta com o princípio de expandir direitos e jamais o contrário. Observando o contexto político global na atualidade, podemos perceber que a vontade popular por vezes é canalizada em ações que atuam na contramão da democracia. “Claro que práticas como as consultas populares e os plebiscitos devem ser incentivadas, visando a essa democracia mais participativa, mas sem cair no extremo de modelos de democracia publicitária que podem sustentar, como nós temos visto na nossa contemporaneidade regimes populistas e autoritários”, completa Alberto Ribeiro.

*Sob supervisão de Paulo Capuzzo e Cinderela Caldeira


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