Desenvolvimento cerebral tem relação com o controle da atenção

Segundo Eliane Comoli, o controle da atenção permite ao indivíduo realizar a “atenção voluntária”, que consiste no foco em uma ação de maneira consciente e de livre escolha

 02/02/2023 - Publicado há 1 ano     Atualizado: 07/02/2023 as 12:32
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Fatores externos, sejam sensoriais ou de qualquer outra natureza, impactam na capacidade de manter a concentração – Foto: Freepik

Para muitos, a concentração se resume ao ato de estar focado inteiramente em uma tarefa, mas o que ela representa para o cérebro e como consegui-la ainda são pontos pouco comentados. “O prestar atenção não é uma capacidade única, exige esforço cognitivo”, comenta a professora Eliane Comoli, do Departamento de Fisiologia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP. A concentração também varia muito conforme fatores ambientais, sendo necessária uma análise de vários pontos de vista.

Eliane Comoli – Foto: Reprodução/Fapesp

O desenvolvimento cerebral, segundo Eliane, tem relação com o controle da atenção. Com ele é possível realizar a “atenção voluntária”, que consiste no foco em uma ação de maneira consciente e de livre escolha. “É aquela que o aluno possui ao prestar atenção no professor que está explicando um conteúdo na sala de aula, mesmo quando há interferências de outros alunos conversando ao redor. Esse tipo de atenção é diferente da tensão desencadeada quando a informação sensorial é intensa e repentina, como quando você está lendo um livro e algo cai no chão produzindo um som intenso”, exemplifica a professora.

Fatores externos, sejam sensoriais, como no exemplo, ou de qualquer outra natureza, impactam a capacidade de manter a concentração. O professor André Russowsky Brunoni, da Faculdade de Medicina da USP, comenta sobre a influência ambiental no foco: “A primeira coisa que a gente sempre aconselha é desligar os estímulos concorrentes. Isso é cada vez mais difícil, porque a gente acha que é multi, mas na verdade as pessoas não são: não dá para dividir essa memória de trabalho em quatro ou cinco coisas ao mesmo tempo, depois, no longo prazo, isso acaba gerando um menor desempenho nas tarefas”.

Estado de flow

Por mais que concentração e foco sejam duas palavras que resumem a mesma “ação”, existe o estado de flow. Ele diz respeito a uma concentração caracterizada pela intensa imersão na atividade realizada. 

Estabelecer metas claras, intervalos de descanso e manter-se afastado de distrações são algumas dicas dadas para atingir tal estado, mas existe um mecanismo complexo no organismo responsável por isso. “Ele está muito relacionado com a memória de trabalho, que é a capacidade de manipular informações que chegam de diferentes regiões do cérebro. Quando a gente vai se concentrar numa tarefa, precisa acessar nossa memória de longo prazo, cuja função principal relacionada a isso é o hipocampo. A gente precisa também ativar algumas áreas de memória verbal e memória visual e integrar tudo isso nessa memória de trabalho”, explica Brunoni.

Andre Russowsky Brunoni – Foto: Reprodução/Fapesp

O professor ainda faz uma analogia, comparando a memória de trabalho a uma mesa em que você pega os materiais e as ferramentas, manipulando-os conforme a intenção ― que, no caso, é a concentração. Esse estado ainda envolve redes de neurônios, sendo as mais importantes a Central Executive Network, com enfoque maior na resolução de tarefas, e a Default Mode Network, responsável por uma atenção ao próprio indivíduo e, por isso, relacionada à depressão, ao estresse e com uma influência corporal significativa.

Práticas

Saber o que é a concentração e sua presença também no estado de flow é importante, mas o mais buscado é como atingi-los. A professora Eliane comenta sobre a meditação, que é uma de muitas práticas que ajudam desde alcançar o foco até mantê-lo: “A meditação é um ótimo exemplo de prática para se concentrar intencionalmente no momento presente, prestando total atenção às sensações, pensamentos e emoções que surgem. A neurociência define a meditação como forma de treinamento mental que reduz o estresse e ajuda a melhorar a capacidade psicológica e autorregulação atencional e emocional”.

Ela ainda acrescenta que yoga e exercícios físicos, bem como a meditação, promovem o bem-estar mental e físico. Segundo a professora, a neurociência aponta o efeito dessas atividades sobre a neuromodulação, o aumento de substâncias como gaba, serotonina e dopamina que, respectivamente, neutralizam os sintomas de ansiedade, melhoram o ânimo e regulam a motivação. Além disso, essas práticas geram aumento da proteína BDNF, que ajuda na produção de novas células cerebrais e fortalece as já existentes. “É importante mencionar que cuidados com o sono são muito importantes, já que a privação do sono adequado reduz a atenção, a concentração e memória, afeta o desempenho das atividades cognitivas e tarefas que requerem criatividade. Por fim, a verdade é que não há forma mágica, é preciso empenho e autodisciplina”, pontua Eliane.


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