“Não há democracia sem a presença de mulheres”, afirma especialista

Igualdade entre gêneros estabelecida na Constituição de 1988 precisa de mudança cultural para sair do imaginário e se tornar real

 29/09/2022 - Publicado há 2 anos
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As mulheres precisaram lutar por mais de dois séculos na busca pela igualdade de direitos – Foto: Freepik
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No episódio da série Mulheres e Justiça desta semana, a professora Fabiana Severi conversa com Christine Peter da Silva, doutora em Direito, Estado e Constituição pela Universidade de Brasília e ex-assessora da presidência do Supremo Tribunal Federal. Atualmente é pesquisadora e professora associada do mestrado e doutorado em Direito das Relações Internacionais do Centro Universitário de Brasília. Christine, neste episódio, aborda o tema Constitucionalismo Feminista, ou Estado Constitucional Feminista, termo que traz luz a toda luta das mulheres durante a história para conquistarem seus direitos, além de ressaltar a importância da participação feminina em uma democracia.

O Estado Democrático de Direito não está alheio às estruturas sociais, em especial às relações de poder que reforçam a desigualdade entre homens e mulheres. Trazer uma visão de gênero para o âmbito constitucional abre portas para que as estruturas da democracia se façam plenas e paritárias, sem nenhuma distinção. No Brasil, ainda que a Constituição Federal de 1988 estabeleça a igualdade entre os gêneros, seja nos espaços públicos ou privados, uma mudança cultural ainda precisa acontecer para que as ideias de igualdade saiam do imaginário e se tornem reais. 

Fabiana Severi – Foto: Flickr

Segundo Christine, “não há democracia sem a presença de mulheres” e abordar esse tema em um ano de eleições gerais é essencial. “Falar em um Estado constitucional feminista é falar de uma democracia plena, de uma democracia pronta. Sem as mulheres, essa democracia vai ser apenas um projeto, uma esperança, uma vontade e nunca vai ser algo realmente pleno”, afirma a professora. 

A luta feminista por igualdade

Para entender o constitucionalismo feminista, é preciso lembrar que o sistema constitucional e a organização política brasileira nascem dos movimentos liberais do final do século 18, e que se espelha em uma percepção de que todos os cidadãos e cidadãs devem ter igualdade de direitos, esclarece Christine.

E é exatamente na busca por essa igualdade de direitos que as mulheres precisaram lutar por mais de dois séculos. A professora conta que o Estado constitucional feminista é fruto não somente das lutas das sufragistas no século 19 e início do século 20, mas também das mulheres que, durante as décadas de 1960 e 1970, na segunda onda do feminismo, foram para as ruas em busca de espaço na esfera pública, se desvencilhando da ideia de que a mulher deveria permanecer em casa e na igreja.

Atualmente, é possível presenciar um terceiro momento desse constitucionalismo feminista. “As mulheres se deram conta de que elas não querem ser consideradas como outras ou estranhas nessa percepção social ou política de Estado, elas querem realmente ocupar esses espaços com todas as suas diferenças e todas suas identidades”, completa Christine.

Ideal feminista e realidade brasileira

Christine Peter da Silva – Foto: Reprodução/Instagram

Para que o constitucionalismo feminista possa sair do papel, é preciso pensar em quais são as ações que estão sendo tomadas, seja no espaço público ou privado, para que as mulheres efetivamente possam conquistar todas as ondas de direitos fundamentais que estão disponíveis na Constituição brasileira, alerta a professora.

A educação foi o primeiro direito pelo qual as mulheres saíram à luta durante os movimentos feministas. Elas queriam ser consideradas intelectualmente tão capazes quanto os homens, e foi de suma importância para as mulheres conquistarem isso. O direito à educação passou a ser um pressuposto do próprio direito ao voto.

“O direito ao voto foi uma conquista muito importante para o constitucionalismo feminista, ele trouxe as mulheres para um lugar de igualdade na cidadania e na política. Mas o direito à educação sempre foi o primeiro”, aponta Christine. A presença de meninas e mulheres na educação brasileira é um pressuposto indispensável para que as mulheres possam efetivamente ter seus direitos e sua autonomia.

Além disso, é preciso tratar também sobre a presença feminina na política. A professora conta que, por mais que já existam leis que protejam a mulher, contra a violência física, moral e psicológica nesses espaços de poder, essas medidas ainda não são suficientes. É preciso uma mudança cultural, para que a presença de mulheres na política seja naturalizada, e “isto não é um processo simples”, completa Christine.


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