Todo semestre, mais de 100 crianças e adultos frequentam o campus Cidade Universitária da USP, em São Paulo, para participar do curso comunitário Natação Inclusiva. Mais importante do que aprender a nadar, o grupo desenvolve nas aulas a habilidade de deslocar-se na água de forma segura e autônoma, sem restrição aos estilos tradicionais da natação.
O público é variado, abrange pessoas com deficiência física e intelectual e pessoas sem deficiência, mas com limitações – por exemplo, indivíduos com hérnia de disco ou problemas de coluna. Para a professora Elisabeth Mattos, essa miscelânea traz muitos benefícios a todos os participantes, principalmente no aspecto “emocional e social, pois eles se sentem capazes e começam a enxergar o seu potencial.”
Elisabeth está aposentada, mas foi ela quem iniciou o curso há mais de 20 anos na Escola de Educação Física e Esporte (EEFE) da USP, em São Paulo. A atividade é resultado de uma pesquisa científica da professora. Em 1996, ela era doutoranda da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e montou o grupo que evidenciou a demanda de uma população carente de oportunidades para se exercitar.
A tese tinha o objetivo de elaborar um conjunto de recomendações para técnicos esportivos de pessoas com limitações motoras. Para isso, foram recrutados, inicialmente, 12 atletas. Hoje, o curso é um programa permanente. O atual coordenador é Otávio Luis Piva da Cunha Furtado. Ele ressalta os benefícios da atividade para além do aspecto físico.
Muitos vêm de um histórico de pouca prática de atividade física, então, a melhora do condicionamento físico já é bastante importante. Mas é igualmente um dos objetivos que eles tenham um contato fora do seu círculo de grupos de pessoas com deficiência.
Ricardo Brito Dias é pai do aluno Leandro Ricardo Lopes Brito Dias, diagnosticado com autismo. Ele comenta a importância das aulas para seu filho. “O Leandro não falta de forma alguma. Aqui, ele tem se desenvolvido muito, nada bem e as aulas têm ajudado na socialização, comunicação e autonomia.” Ricardo também destaca o papel essencial do educador Edward Yuji Yamaguti para o andamento do curso.
Bacharel em Esporte formado em 2004, Yuji é educador físico na EEFE desde 2010. Ele explica que, além de atender à comunidade, a natação inclusiva também busca complementar a formação do aluno de graduação e produzir conhecimento. “A maior alegria que eu tenho é saber que o estagiário que passou pelo curso comunitário se tornou um excelente profissional”, diz.
Um dos ex-estagiários que se destacam na área é Raphael Moreira. Formado em 2016, atualmente é técnico da Seleção Brasileira de Tênis de Mesa Paralímpico. Ele atuou durante dois semestres no curso.
Eu não tinha muita vivência com pessoas com deficiência e ficava impressionado com a história de muitas delas, com o fato de que as limitações não as impediram de buscar seus objetivos.
Raphael acrescenta que o estágio o despertou para o mundo paralímpico. “Hoje em dia, a deficiência faz parte do meu cotidiano, trabalho com atletas profissionais que brigam por resultados. A experiência contribuiu muito, tanto para a parte técnica quanto para a construção de currículo e conhecimento teórico”, complementa.
Gabriele Matias, formada pela Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP, em São Paulo, também estagiou no curso e a experiência a levou a seu trabalho atual como assistente da Seleção Paralímpica de Natação. A bacharel em Educação Física e Saúde reflete sobre a experiência no curso.
Trabalhamos com pessoas com diversas deficiências e temos que lidar com cada uma de uma forma diferente. Com isso, aprendi a adaptar as aulas e isso foi muito bom para a minha carreira.
Essa adaptabilidade das atividades é um dos fatores primordiais para o curso. As aulas exigem estudo, flexibilidade e planejamento para atender cada deficiência. Segundo o professor Otávio, o treino na natação inclusiva deve ser individualizado, considerando as condições, limitações e potencialidades de cada um. “Reconhecer quem é o aluno é essencial, a pessoa traz uma bagagem de vida, preferências de comunicação, de toque, de orientação.”
Devido a essa especificidade, é necessária a participação de muitas pessoas de diferentes áreas a cada semestre. Em 2018, por exemplo, foram envolvidos, em média, 18 estagiários por semestre, oriundos não apenas da EEFE como também dos cursos de Educação Física e Saúde (EACH), Fisioterapia, Terapia Ocupacional e Fonoaudiologia (Fofito) da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP).
Um programa nesses moldes é difícil de ser encontrado em outros lugares, por isso, há fila de espera para matrícula de novos alunos. A professora Elisabeth acredita que os alunos de graduação deveriam estar mais atentos à atividade física inclusiva como mercado de trabalho.
Os ex-estagiários Raphael e Gabriele concordam. Além da profissão, eles destacam o prazer na atividade. “É muito gratificante sair daqui e poder dizer que você fez a diferença na vida de uma pessoa. O agradecimento e o carinho que eles têm em relação a isso, saber que você foi uma parte importante da vida deles. O curso mexe com todo mundo que participa”, afirma Gabriele.
Paula Bassi/ Assessoria de Comunicação da EEFE