Projeto de atualização da Lei do Impeachment pretende torná-la mais transparente e racional

Para Pierpaolo Bottini, deve haver uma discussão de cunho político, mas ele espera que o processo caminhe com serenidade para que todas as dúvidas e obscuridades hoje existentes sejam superadas

 09/02/2023 - Publicado há 1 ano
A Constituição já cita quais crimes são considerados os de responsabilidade e a atualização da lei pretende defini-los de forma melhor – Foto: Fotos públicas – Fotomontagem – Jornal da USP
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A Lei nº 1.079, mais conhecida como Lei do Impeachment, é de 1950 e, no final de 2022, ganhou um projeto de revisão. Aprovado por uma comissão de juristas, a atualização pretende deixar a lei mais clara e racional. “A ideia desse grupo, liderado pelo ministro Ricardo Lewandowski, é atualizar uma legislação antiga. Se você for ler a lei, você vai perceber que a descrição dos crimes de responsabilidade é uma descrição muito vaga, pouco precisa e traz uma insegurança muito grande a respeito dos mandatários e de todos os outros detentores de cargos que cometem crimes de responsabilidade. A ideia é atualizar, ou seja, deixar a descrição dos crimes mais clara, mais precisa, mais compreensível e tornar o processo de impeachment também mais racional”, explica o professor Pierpaolo Bottini, do Departamento de Direito Penal da Faculdade de Direito da USP, e um dos participantes do grupo de trabalho da comissão.

Pierpaolo Cruz Bottini – Foto: FD

Com a atualização da legislação, alguns pontos foram mudados, como o processo de pedido de impeachment. Com o projeto, a permissão para realizar a denúncia fica restrita aos partidos políticos com representação no Poder Legislativo, OAB, entidades de classe e organizações sindicais: “A ideia é restringir porque, como é hoje, qualquer pessoa pode pedir a abertura do processo de impeachment contra o presidente da República, mesmo sem formação jurídica, sem compreender como funciona esse sistema: ela pode mandar para o presidente da Câmara dos Deputados um pedido de afastamento do presidente da República”, comenta o professor. Ele ainda acrescenta que é necessário ter uma representatividade considerável para poder pedir a destituição, sobretudo do presidente: “Não parece fazer sentido que alguém que foi eleito com milhões de votos, que passou por um processo amplamente democrático, possa ter seu processo de destituição iniciado por uma única pessoa”.

A Constituição já cita quais crimes são considerados os de responsabilidade e a atualização da lei pretende defini-los de forma melhor. Além disso, novas modalidades foram acrescentadas, como a disseminação de fake news, com o intuito de afetar o processo eleitoral, e discriminação racial, de gênero, de corpo e de orientação sexual com o apoio do presidente: “São uma série de outras condutas que não constavam na lei de 1950, até por conta de um contexto histórico e, agora, elas foram incorporadas nessa nova proposta de legislação”.

O professor também comenta se os casos de impeachment anteriores, se fossem julgados com base na lei revista, mudariam de conclusão: “Em relação ao Fernando Collor, não alteraria, porque se tratava de um caso de corrupção. Quanto a Dilma Rousseff, é difícil a gente fazer essa análise. Mas, aquela hipótese da pedalada fiscal, da forma como ela foi apontada, eu particularmente entendo que talvez não se enquadrasse. Você não tinha um descumprimento da lei orçamentária ou das leis de responsabilidade fiscal, você tinha só uma questão formal de orçamento. Eu não vou afirmar porque eu não conheço todas as particularidades do processo da Dilma Rousseff, mas, de qualquer forma, os crimes contra as regras orçamentárias estão muito mais claros na lei revisada”.

Processo

Como dito, um dos objetivos principais do projeto é tornar a legislação mais clara e, consequentemente, mais eficiente do ponto de vista judicial. A ideia é que um prazo seja definido para dar ou não seguimento ao processo de impeachment: “A ideia é que você fixe um prazo para que o presidente da Câmara dos Deputados, que é quem tem a atribuição de determinar o início desse processo, decida se ele dá início a esse processo ou se ele arquiva, mas esse prazo vai ser discutido e debatido no Senado Federal”, explica Bottini.

Sobre a aprovação do projeto, o professor enumera quais etapas ainda precisam ser cumpridas: “A partir de agora, o presidente do Senado vai enviar isso para as comissões pertinentes, como a de Constituição e Justiça e de Cidadania e alguma outra comissão temática que ele entender que deve analisar. Depois disso, vai para o Plenário. Se for aprovado no Senado Federal, vai para a Câmara dos Deputados. Por fim, vai para o presidente da República, para a sanção ou veto”. O ponto ideológico é um fator importante no decorrer desse processo, porém, Bottini acredita que essa racionalização é de interesse geral: “O impeachment acaba sendo do interesse de todos. Evidentemente que vai haver uma discussão de cunho político, até porque o processo de impeachment é um processo político, mas nós esperamos que isso caminhe com serenidade para que todas as dúvidas, as obscuridades, que existem hoje, sejam superadas e que o processo seja algo mais transparente, mais seguro e mais previsível”.


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