“Porque tudo que invento já foi dito nos dois livros que eu li: as escrituras de Deus, as escrituras de João. Tudo é Bíblias. Tudo é Grande Sertão”, escreve Adélia Prado em A Invenção de um Modo, poema de seu primeiro livro, Bagagem (1976). Essa clara influência do escritor mineiro João Guimarães Rosa (1908-1967) na obra da poetisa também mineira será tema do próximo encontro on-line da Oficina de Leitura João Guimarães Rosa, ligada ao Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da USP. A reunião, marcada para as 18 horas desta quarta-feira, dia 10, via aplicativo Google Meet, contará com a participação da pesquisadora Gisele Toledo, autora do livro Encontro de Travessias: Adélia Prado e Guimarães Rosa.
O bate-papo apresentará a obra da mineira Adélia Prado, que é constantemente relacionada a Carlos Drummond de Andrade, que a apadrinhou na carreira, mas pouco considerada quanto a Guimarães Rosa. “A própria Adélia já falou abertamente que Grande Sertão: Veredas é sua bíblia literária”, conta Gisele. De acordo com ela, a obra da poetisa é recheada de rastros de Grande Sertão e sua pesquisa se propõe a investigar justamente em quais poesias e versos é possível encontrar influências de Rosa em Adélia. “Se você é um leitor de Guimarães e lê os poemas dela, é possível perceber com mais clareza essa intertextualidade.”
A Oficina de Leitura do IEB se concentra na análise dos textos de João Guimarães Rosa, mas também está sempre buscando novos estudos para complementar os debates. Gisele, que na época de sua pesquisa costumava ir aos encontros da roda, agora tem a oportunidade de conversar sobre o resultado de seu livro. “Eu conheci a Rosa, que é a mediadora, e algumas outras pessoas do grupo quando fui a Cordisburgo, cidade onde nasceu Guimarães Rosa, nos 50 anos de Grande Sertão: Veredas, em 2006. Depois, na época de mestrado na USP, lembrei da roda e resolvi participar enquanto estive em São Paulo”, afirma a pesquisadora, que mora em Minas Gerais. Com a quarentena, a oficina se mantém às quartas-feiras, apenas com a mudança dos seus encontros presenciais para os virtuais.
“As pessoas que estão ali acabam sendo levadas pelo mesmo objetivo, que é o gosto pela obra de Guimarães Rosa, então minha expectativa é muito boa, acredito que será um debate muito produtivo”, diz Gisele. Segundo a escritora, o objetivo da roda é debater as diferentes perspectivas que cada um tem sobre o mesmo texto, normalmente de autoria de Guimarães Rosa, e será interessante ver isso acontecendo com um livro dela. “Uma coisa é a gente, como pesquisadora, falar sobre um tema tendo se debruçado sobre ele durante anos. Outra coisa é compreender as diferentes visões das outras pessoas, o que é muito legal”, afirma ela, que também acredita que isso possa colaborar para abrir novos caminhos na pesquisa e no debate sobre os dois autores.
Ainda segundo Gisele, o objetivo desse evento, além de passar pela necessidade desses múltiplos olhares sobre a obra literária, se concentra na figura da Adélia Prado. “Ela é uma autora contemporânea e, embora já existam muitos estudos sobre ela, seu potencial de pesquisa ainda não foi todo explorado”, afirma a escritora. Nesse sentido, também foi um grande desafio para ela explorar algo tão novo e falar sobre isso. “Comparam muito Adélia com Drummond, e menos com Guimarães. Espero que, agora, quem estiver nesse debate ou ler o livro possa entender mais esse seu lado. E, para quem não conhece, que se interesse por sua obra poética e queira ler Adélia assim como lê Guimarães.”
O evento Encontro de Travessias: Adélia Prado e Guimarães Rosa acontecerá nesta quarta-feira, dia 10, das 18 às 20 horas através do aplicativo Google Meet. Para participar é necessário fazer inscrição pelo e-mail rodadeleituragr@gmail.com, da Oficina de Leitura Guimarães Rosa do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da USP. O livro Adélia Prado e Guimarães Rosa, de Gisele Toledo, está disponível no site da Editora Appris.