O congelamento de óvulos no Brasil existe desde 1980, mas foi somente a partir de 2012 que o procedimento se estendeu às mulheres que não tinham problemas para engravidar, mas queriam somente adiar a gestação. Com essa mudança, as mulheres passaram a ter a oportunidade de ter filhos usando seus próprios óvulos, mesmo com uma idade mais avançada, num momento da vida em que isso poderia comprometer a qualidade e a quantidade de óvulos, se engravidassem de forma natural.
Apesar dos altos preços e das poucas clínicas públicas, esse novo cenário também fez com que o Brasil registrasse um crescimento nos números de reprodução assistida. Segundo o Sistema Nacional de Produção de Embriões (SisEmbrio), da Anvisa, em 2023 foram congelados 115.318 embriões no País, um aumento de 32,8% em comparação a 2020, que registrou 86.833 procedimentos. Já o número de ciclos de reprodução assistida, que são os procedimentos que vão do descongelamento dos óvulos ao nascimento do bebê, realizados em 2023, foi de 56.578, um crescimento de mais de 35% em comparação a 2020, quando foram registrados 41.586 ciclos.
De acordo com a professora Rosana Maria dos Reis, do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP, postergar a gestação através do congelamento de óvulos é uma tendência na atualidade, uma vez que as mulheres buscam primeiro a estabilidade profissional e independência financeira para depois engravidar. Embora ainda não haja um limite definido para o tempo máximo de armazenamento dos óvulos congelados, Rosana destaca mais a qualidade da técnica utilizada do que a duração do congelamento. “As clínicas de reprodução assistida precisam avaliar os protocolos de congelamento que melhor se adaptem às suas rotinas para promover melhores resultados após o aquecimento e descongelamento dos óvulos.”
Além disso, Rosana menciona que os protocolos devem focar tanto na taxa de sobrevivência dos óvulos quanto na formação de embriões e no nascimento de bebês saudáveis. “A abordagem proporciona às mulheres maior autonomia e liberdade, permitindo que elas possam considerar a maternidade até mesmo aos 40 anos de idade.” Mas o congelamento dos óvulos não sai barato. O tratamento varia conforme a clínica escolhida, podendo chegar a um valor aproximado de R$ 30 mil. O SUS oferece o procedimento de graça, mas não é para todas.
Atualmente, existem 181 clínicas de reprodução assistida em território nacional e apenas 11 dessas clínicas são públicas, sendo quatro no Estado de São Paulo, uma delas em Ribeirão Preto, no Hospital das Clínicas da FMRP.
No SUS
No Centro de Reprodução Humana do Hospital das Clínicas da FMRP, o congelamento de óvulos é uma opção disponível apenas para pacientes que enfrentam condições médicas ou tratamentos que possam comprometer sua fertilidade, como doenças imunológicas ou câncer. “Não é comumente realizado o congelamento de óvulos para mulheres que desejam adiá-lo por razões pessoais, devido à alta demanda por esse procedimento, especialmente entre casais que buscam fertilização in vitro por recomendação médica”, afirma a especialista.
A fila de espera para esse serviço pode se estender por até dois anos, a partir do encaminhamento pela rede pública até o atendimento no hospital. Rosana esclarece, no entanto, que realizar o procedimento, seja em uma clínica privada ou pública, não garante uma gravidez. “O objetivo é obter o maior número possível de óvulos, aumentando assim as chances de sucesso.”
Rosana observa que a idade da paciente e sua reserva ovariana também desempenham um papel crucial nesse processo. “Mulheres mais jovens tendem a ter uma reserva ovariana maior, o que facilita a obtenção de um maior número de óvulos maduros para o congelamento.” As estimativas indicam que, em média, cada óvulo congelado tem uma taxa de sucesso de cerca de 5% na gravidez com nascimento vivo, “assim, a chance de ter um bebê com 12 óvulos congelados é de cerca de 60%. Se for possível conseguir congelar 20, as chances aumentam”. Mas, de acordo com Rosana, conseguir 20 óvulos maduros em um único ciclo de indução da ovulação não é muito comum, com exceção das mulheres com menos de 30 anos.
Congelamento
A médica Maria (nome fictício) tem 36 anos e optou pelo congelamento de óvulos porque não tem previsão de quando será mãe. “Eu sei que, com o aumento da idade, a chance de ser mãe diminui e a possibilidade de malformação fetal aumenta, então resolvi fazer o congelamento.” A paciente considerou o procedimento bem simples e indolor. “O ultrassom vaginal precisa ser feito alguns dias após a menstruação e, no meu caso, como estava tudo em ordem, dentro dos parâmetros considerados normais, o tratamento com injeção foi iniciado a fim de maturar os meus óvulos.”
Maria tomava injeção de hormônio à noite e um comprimido de progesterona pela manhã, para estimular o desenvolvimento dos folículos ovarianos e regular o ciclo menstrual. Após seis dias, ela fez um ultrassom para avaliar o progresso da maturação dos óvulos e continuou com a medicação por mais sete dias, para logo depois realizar a extração dos óvulos. O ultrassom é importante para ajustar a dosagem da medicação, se necessário, e para determinar o momento ideal para a extração dos óvulos maduros. O processo durou 13 dias para Maria, enquanto para outras, segundo especialistas, pode variar de 12 a 15 dias, dependendo da resposta de cada paciente ao tratamento hormonal.
*Estagiária sob supervisão de Ferraz Junior e Rose Talamone
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