Exposição Camadas: Narratividades Visuais da Violência, Coletivo Lâmina, com curadoria de Ana Velar, nas comemorações dos 50 anos da Batalha da Maria Antonia – Foto: Cecília Bastos/USP Imagens
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A vocação da Universidade na defesa dos valores democráticos foi o mote dos discursos que marcaram, no dia 2 de outubro, a abertura oficial da série de eventos Ecos de 1968 – 50 Anos Depois, iniciativa da Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária (PRCEU), do Centro Universitário Maria Antonia (Ceuma), do Jornal da USP e da Rádio USP.
Exposições, peças de teatro, leituras dramáticas, relançamento de livros e mesas-redondas serão realizados no Ceuma até o dia 5 de outubro, relembrando a história da então Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (FFCL), hoje Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH), e dos dramáticos embates da denominada Batalha da Maria Antonia.
Os confrontos foram protagonizados por estudantes da USP e do Mackenzie e por policiais militares, tendo resultado na morte do estudante secundarista José Carlos Guimarães e deixado dezenas de feridos. Pouco tempo depois, o governo militar utilizou o episódio como um dos pretextos para o endurecimento do regime, promulgando o Ato Institucional Número 5 (AI-5).
Na abertura do evento, a diretora do Ceuma, Lúcia Maciel Barbosa de Oliveira, destacou a relação das atividades programadas e a necessidade de “se pensar o contexto político-cultural de 1968, seus reflexos nos dias de hoje e as inquietações do presente”.
Lúcia falou sobre a vocação e o cerne da ação do Ceuma, cujo prédio, construído na década de 1930, abrigou a FFCL, onde estudaram e lecionaram figuras de destaque no cenário nacional, como Alfredo Bosi, Antonio Candido, Aziz Ab’Saber, Décio de Almeida Prado, Fernando Henrique Cardoso e Florestan Fernandes.
O enfrentamento entre estudantes e policiais resultou na destruição do prédio e na mudança definitiva da faculdade para a Cidade Universitária. O Ceuma somente foi reaberto ao público como espaço cultural da USP em 1993. Hoje ligado à PRCEU, o local sedia as mais variadas atividades, como cursos, palestras, exposições e sessões de cinema.
O vice-diretor do centro e diretor do Teatro da USP (Tusp), Sérgio de Carvalho, disse que, em 1968, o prédio da FFCL foi o centro irradiador do espírito democrático ao ser palco do lendário espetáculo Os Fuzis da Dona Tereza Carrar, dirigido por Flávio Império junto ao grupo Teatro dos Universitários de São Paulo, que precedeu o atual Tusp.
A peça é tema de uma exposição, que fica em cartaz até dezembro, com fotografias, material gráfico e entrevistas inéditas de Sérgio Mindlin, Maria Alice Machado, Maria Teresa Vargas, Ricardo Ohtake e Betty Chachamovitz, dentre outros, e conta, ainda, com o registro fotográfico de Victor Knoll para o espetáculo e reproduções de documentos da época.
História da Universidade
Para a diretora da FFLCH, Maria Arminda do Nascimento Arruda, “a história das humanidades na USP se confunde com este prédio. Se não há o que comemorar, pois não se celebram tragédias, há o que rememorar, pois rememorar aqueles acontecimentos é repensar a própria história da Universidade” (leia a íntegra da fala de Maria Arminda Arruda aqui).
Maria Arminda ressaltou que “os acontecimentos da Rua Maria Antonia atingiram a identidade da USP. Este lugar e este evento são muito importantes para a nossa história, a história da faculdade, parte da qual está presente nos dois livros que estão sendo relançados, as novas edições das obras Os Acontecimentos da Rua Maria Antonia e Maria Antonia: Uma Rua na Contramão”.
Também conhecido como Livro Branco, Os Acontecimentos da Rua Maria Antonia se concentra no relatório feito por uma comissão formada pelos professores Antonio Candido, Carlos Alberto Barbosa Dantas, Carlos Benjamin de Lyra, Eunice Durham, Ruth Cardoso e Simão Mathias, com o objetivo de apurar os fatos relativos ao confronto. A reedição surge ampliada, com organização de Abílio Tavares e Irene Cardoso. Organizado pela professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU), Maria Cecília Loschiavo, Uma Rua na Contramão reúne depoimentos de 31 personalidades que passaram pela FFCL entre 1948 e 1968.
O superintendente de Comunicação Social da USP, Luiz Roberto Serrano, era um dos estudantes daquela época e fez um breve relato sobre o contexto histórico e político na Universidade. “Fomos expulsos do Crusp (Conjunto Residencial da USP) em 17 de dezembro de 1968, quatro dias depois do AI-5. A USP sofreu. Professores foram aposentados e alunos foram afastados”, contou. “Há importantes lições em 1968, úteis para hoje. O fundamental é que as arbitrariedades, as perseguições, a censura, a tortura e as mortes nunca mais se repitam. E que a USP, com liberdade e autonomia, continue sendo celeiro de mestres, profissionais, ideias e projetos para construir, no Brasil, uma sociedade democrática”, considerou.
Expressão da arte
A pró-reitora adjunta de Cultura e Extensão Universitária e coordenadora do Ecos de 1968 – 50 Anos Depois, Margarida Maria Krohling Kunsch, ressaltou que os eventos são fruto de intenso trabalho que começou em abril. Segundo ela, “a preocupação da Universidade e da Reitoria é, por meio das artes, relembrar esses acontecimentos que marcaram a história do País”.
Já a pró-reitora de Cultura e Extensão Universitária, Maria Aparecida de Andrade Moreira Machado, salientou que “o sentimento deve ser de gratidão pelos que acreditaram que a liberdade e a democracia seriam possíveis neste País”.
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O vice-reitor da USP, Antonio Carlos Hernandes, também enfatizou o legado deixado por esse movimento que, “embora tenha sido construído com muita dor, culmina, hoje, em um momento em que todos têm a liberdade de poder escolher seus dirigentes”, afirmou, referindo-se à eleição para presidente da República, governadores, senadores, deputados federais e deputados estaduais que ocorre no próximo dia 7 de outubro.
Hernandes lembrou que a série de eventos relacionados aos 50 anos de 1968 faz parte do projeto da gestão da Universidade para a rememoração de efemérides.
Caminhos e descaminhos
Após os discursos, do pátio externo do Ceuma o público assistiu à performance Ainda Resistimos, do Coletivo Coletores. A partir da combinação de diferentes imagens de Hiroto Yoshioka e textos de memória, um videomapping projetado na fachada lateral do Maria Antonia ressaltou a força das coletividades e da luta popular.
De lá, ao som de O Bêbado e o Equilibrista, entoado pelo Coral da USP (Coralusp), o público se dirigiu, pelas escadas do prédio Maria Antonia, à exposição Re Vouver, agora em nova fase, exibindo fotos inéditas de Hiroto Yoshioka, vídeo, reprodução de jornais e revistas da época, além de totem com acesso ao site da Comissão da Verdade da USP.
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No entorno, havia a exposição Re Velando, montada em parceria com o Instituto Vladimir Herzog, composta de fotos sobre 1968 dos renomados fotógrafos brasilienses Luis Humberto e Orlando Brito; a exposição Camadas: Narratividades Visuais da Violência, do Coletivo Lâmina, com curadoria de Ana Avelar; e a intervenção Alteração de Foco 0118, do artista visual Diego Castro.
Enfim, um universo de fotos, reproduções, performances e intervenções que fazem pensar – e muito – sobre os caminhos e descaminhos da história.
Clique aqui e confira a programação completa dos eventos. Até 21 de dezembro, o Jornal da USP publica uma série especial de reportagens e depoimentos.
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