Adusp defende que proposta seja retirada de votação para maior discussão

Lucília Daruiz Borsari, professora do IME e integrante da Adusp, afirma que a segunda versão do documento ainda não contempla a maioria das reivindicações dos colegiados

 16/08/2016 - Publicado há 8 anos
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Lucilia Daruiz Borsari - Foto: Marcos Santos
Lucília Daruiz Borsari – Foto: Marcos Santos

A reformulação do regimento da Comissão Permanente de Avaliação (CPA) traz mudanças importantes na forma de avaliar o trabalho dos professores, dos departamentos e das unidades da USP e, por isso, muitas congregações manifestaram críticas à primeira versão da proposta.

De acordo com a comissão que apresentou o documento, basicamente, foram quatro categorias de manifestações e questões recebidas: críticas ao que foi entendido como espírito da proposta; críticas à forma em que foram apresentadas as minutas do Estatuto do Docente, do Regimento Interno da CPA e das alterações do Estatuto e do Regimento Geral da USP; considerações gerais sobre avaliação; e sugestões específicas para modificação dos documentos.

No total, 35 das 52 unidades e órgãos da USP se manifestaram em relação à nova Comissão Permanente de Avaliação. Segundo a Associação de Docentes da Universidade de São Paulo (Adusp), 30% dos documentos se posicionaram contrários à totalidade do conteúdo do novo regimento da CPA.

Entre os exemplos de manifestações apontados pela Adusp, estavam a da Escola de Educação Física e Esporte (EEFE), que entendeu que a proposta não deixava clara a necessidade da avaliação institucional; a Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) apontava para a burocratização do processo de avaliação contida na proposta, com riscos importantes às particularidades de cada unidade de ensino e pesquisa; a Faculdade de Educação (FE) evidenciava a falta de princípios teóricos sobre avaliação e advertia para o fato de que a adoção de critérios mutáveis poderia gerar instabilidade no corpo docente; já o Instituto de Matemática e Estatística (IME), o Instituto de Biociências (IB), o Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE), o Instituto de Física (IF) e a Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) demonstraram preocupação com a ameaça à autonomia independência universitárias, devido ao poder atribuído à CPA.

Uma segunda versão do documento foi apresentada no dia 3 de agosto pela comissão que está trabalhando na reformulação do regimento da Comissão Permanente de Avaliação. E agora, as Congregações das unidades têm até o final de agosto para se manifestar sobre a CPA e a criação do Estatuto do Docente.

Em entrevista ao Jornal da USP, Lucília Daruiz Borsari, professora do Instituto de Matemática e Estatística (IME) da USP e integrante da Adusp, afirma que a segunda versão do documento ainda não contempla a maioria das reivindicações e defende que a proposta não seja votada no Conselho Universitário para que haja mais discussão. Confira a entrevista:

Jornal da USP – Para a Adusp, quais são os pontos mais controversos da nova CPA?

Lucília Borsari – Hoje, a avaliação dos docentes fica a cargo das unidades e a avaliação dos departamentos e das unidades, que chamamos de avaliação institucional, é feita de modo centralizado. A essência das modificações está no fato de que eles [CPA] querem levar a avaliação individual de cada docente para uma comissão central. Houve algumas mudanças dessa composição da primeira versão para a segunda versão [do documento]. Essa comissão, chamada de Comissão Permanente de Avaliação, vai ter na proposta uma plenária e a Câmara de Avaliação Docente e a Câmara de Avaliação Institucional, mas elas serão centralizadas. Essas duas câmaras, na primeira proposta, tinham os nove membros de cada uma indicados pelo reitor. Na nova versão, ele indica seis, tendo sua indicação homologada pelo Co [Conselho Universitário], mas a indicação é dele. O Co não pode propor outro nome, então é ele que indica dois terços de cada câmara e um terço restante virá de listas tríplices das unidades para o Co definir quem são os três restantes de cada uma das câmaras.

Isso eles estão apontando como uma forma de descentralização. A minha opinião, da Adusp e compartilhada por vários colegas, é que isso é muito insatisfatório em relação à crítica da centralização. O que devíamos discutir é menos os detalhes de composição, mas se queremos a avaliação individual sendo feita nas unidades ou queremos de modo centralizado. Se queremos nas unidades, essa proposta terá que ser reformulada. Se queremos centralizada, temos que ver como. Mas essa discussão não tem ocorrido de modo amplo. As avaliações feitas por comissões centrais dificilmente escapam de indicadores quantitativos porque avaliar de fato o trabalho acadêmico e o trabalho científico é algo que só pode ser feito por especialistas.

Ela simplesmente tem sido focada em cima de uma proposta e não em cima de princípios básicos que deviam reger essa questão de avaliação docente, que não é óbvia, nem trivial e absolutamente polêmica, porque o trabalho acadêmico tem características muito diferentes de outros trabalhos e a Universidade exige diversidade de perfis, liberdade de pensamento, do que você quer pesquisar. É uma diversidade tão grande que se você começar a centralizar e começar a “itemizar” o trabalho docente, você necessariamente, para dizer o mínimo, vai empobrecer e pode pecar por falta de qualidade, ao contrário do que se propagandeia.

Jornal da USP – Como é avaliado hoje o trabalho de vocês?

Lucília – Varia muito. Cada departamento faz suas escolhas de avaliação, não existe necessariamente um ritual de avaliação periódica, mas as pessoas são avaliadas. Quando um aluno defende uma tese, como orientadores também estamos sendo avaliados. Quando se apresenta um projeto de pesquisa, a análise dele é um julgamento. Quando se submete um artigo científico, o parecer da arbitragem é um julgamento. Quando os estudantes analisam o seu trabalho em sala de aula, também.

A avaliação não necessariamente é um processo fechado e organizado, ela pode ter uma diversidade e, na realidade, às vezes, quando se tenta avaliar um docente por esses indicadores, o resultado dele será muito ruim. Mas quem trabalha ao lado dele sabe da contribuição, porque o trabalho não necessariamente pode ser itemizado, coisificado, por isso defendo que a avaliação deva ser feita na unidade, porque ela tem nuances, sutilezas e é muito variada dependendo da área do conhecimento. Mas, no geral, na hora que seus programas de pós-graduação são avaliados, é porque seu corpo de orientadores, minimamente do ponto de vista coletivo, está dando conta do trabalho. Eu não colocaria que a avaliação individual não fosse organizada, itemizando cada uma das nossas atividades, esse não é um bom caminho.

Jornal da USP – E sobre a criação do Estatuto do Docente?

Lucília – A CAD, Comissão de Avaliação Docente, que é uma das câmaras da CPA, vai passar a fazer o papel da atual Cert. Então, ela vai cuidar da questão dos regimes de trabalho, das licenças para atividades simultâneas no RDIDP, do regime probatório dos docentes. A CAD, com dois terços dos membros escolhidos pelo reitor, terá um papel central na condução desse regime probatório, montando comissões de estágio, analisando relatórios, esvaziando um pouco o papel dos departamentos. O Estatuto do Docente dá conta disso. Se, por um lado, a gente se anima com a extinção da Cert, que é uma proposta histórica nossa por vários abusos e desmandos que ela fez ao longo da década de 1990, e agora ela tem questionado as deliberações dos departamentos, o que vem no lugar não é muito animador. Continua muito centralizado e ameaçando aquilo que para nós é fundamental: o departamento sabe o trabalho que o docente fez, ele conhece como instituição coletiva de docentes a realidade do trabalho.

Jornal da USP – Qual é a expectativa da Adusp em relação à aprovação do novo regimento da CPA?

Lucília – Esperamos e temos lutado para isso, fazendo a discussão, produzindo material de reflexão, que essa proposta não seja aprovada, que seja suspenso esse processo e se reabra uma discussão ampla, em que possamos decidir o melhor lugar para se dar a avaliação, qual avaliação e, mais do que isso, antes de discutir a avaliação, é um ponto que precisa ser debatido: o reitor escolheu um grupo de pessoas desde 2015 com o GT Atividade Docente, depois com essa comissão que está fazendo estas propostas, é um grupo de trabalho desligado do Co. Não que as pessoas não sejam parte do Co ou da Administração da Universidade, mas eles foram escolhidos pelo reitor, é um grupo assessor do reitor que criou essa proposta e, de alguma forma, em nenhum momento apresentou um diagnóstico do por que nós precisávamos de uma reformulação nos mecanismos de avaliação ou por que os atuais mecanismos de avaliação não estavam funcionando, isso nunca nos foi apresentado.

O que foi apresentado foram propostas de modificação porque eles querem coordenar a avaliação. Essa é a exposição de motivos que eles apresentam na última versão, de modo muito incipiente. Hoje esses sistemas estão todos espalhados e é preciso concentrá-los, mas por quê? É a concepção de uma universidade como organização e essa não é nossa concepção. A nossa expectativa, e é por isso que estamos lutando, é que não aprove e abra essa discussão.

Ninguém se recusa a discutir a avaliação, mas antes de apresentar uma solução, é preciso dizer qual é o problema que ela veio resolver, e isso não está dito. Eu não gosto da perspectiva de avaliar por rankings e indicadores. É assim que essa proposta, provavelmente, pretende nos avaliar: por indicadores quantitativos.

Não há diagnóstico. As propostas continuam extremamente centralizadoras. A gente teme que a autonomia didático-científica das unidades e a diversidade de perfis sejam absolutamente abaladas, que a Universidade seja mais moldada ao sabor de um grupo de professores que tem uma visão de universidade. A gente não tem conhecimento de que critérios seriam utilizados, então, por exemplo, 69% dos colegiados que se manifestaram reclamaram que os critérios não estavam explicitados, 51% dos 35 colegiados que se manifestaram preferem que a avaliação individual se dê nas unidades, eles estão atacando a espinha dorsal do projeto.

E não dá para aprovar um projeto contra a maioria, que não é nem dos docentes, mas da institucionalidade da Universidade. Se esta proposta for aprovada dessa forma, nem os órgãos colegiados instituídos nesta Universidade estão sendo respeitados. Onde estamos vivendo? Em uma Universidade em quem manda é o reitor? Isso parece uma contradição em si mesmo. Essa é nossa expectativa: argumentar, discutir. E quais são os argumentos que vêm de volta? Qual é o diagnóstico? Não tem.

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