O fim dos terrenos de marinha deve acelerar ocupação selvagem dessas áreas

O governo perde gestão e controle ambiental, abrindo espaço para a pressão imobiliária em áreas importantes de preservação

 24/08/2023 - Publicado há 8 meses
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Você já ouviu falar em terrenos de marinha? Trata-se de uma faixa de 33 metros de terra em todo litoral e na beira dos rios e lagos que pertence ao governo federal. Esse terreno pode ser cedido para as pessoas e, ao ser cedido, é necessário pagar um determinado valor para poder ocupar, vender ou usar.  A proposta é que isso acabe e que quem já está morando fique definitivamente e não pague mais nada para a União. Além disso, quem quiser ocupar daqui para frente também não vai precisar solicitar e pagar para a União. Claro que essa proposta tem um sentido de desburocratizar os imóveis que estão situados em terrenos de marinha ou desonerar,  porque tem esse pequeno imposto. E também está baseada numa história muito antiga de grandes dificuldades de gestão desses terrenos por parte do governo federal. Dificuldade de controlar, de saber, de quando cobrar, de como cobrar e tudo mais.

Por outro lado, tem questões muito importantes envolvidas nessa questão da gestão dos terrenos de marinha, como o que está em jogo nessa situação. Apesar de a origem desses terrenos ter vindo do período colonial e estar relacionado com a posse e o controle do território, hoje esses terrenos têm um sentido socioambiental absolutamente central.  Primeiro, em relação à questão da própria mudança climática e elevação do nível do mar. Então, toda a intervenção – no sentido preventivo – de pensar melhor a ocupação dessas áreas: na hora que elas forem privatizadas, o governo federal perde um instrumento muito importante de gestão e controle ambiental.

Mas não apenas isso, em muitas dessas áreas estão instaladas historicamente populações tradicionais: comunidades ribeirinhas, comunidades caiçaras, comunidades de pescadores, algumas comunidades quilombolas, e nós temos forte pressão imobiliária nessas áreas. Afinal, estamos falando de beiras de rio, beiras de mar, que são extremamente valorizadas pelo mercado, que atua pela expulsão dessas comunidades. Trata-se de um sentido importante e essa é uma das atuações da Secretaria do Patrimônio da União, no Ministério da Gestão, que é quem cuida dessas áreas, de proteger e garantir direitos e ocupação, inclusive direitos de ocupação que ainda não estão completamente definidos e demarcados.

Simplesmente acabar significa privatizar absolutamente essa faixa do litoral que vai, sem dúvida nenhuma, acelerar um processo de ocupação completamente selvagem.


Cidade para Todos
A coluna Cidade para Todos, com a professora Raquel Rolnik, vai ao ar quinzenalmente quinta-feira às 8h30, na Rádio USP (São Paulo 93,7; Ribeirão Preto 107,9) e também no Youtube, com produção da Rádio USP,  Jornal da USP e TV USP.

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