A população poderá sofrer com condições precárias de saneamento - Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

Novo Marco Legal do Saneamento não trata setores público e privado da mesma forma

O professor José Carlos Mierzwa considera essa disparidade um agravante, pois no setor público não existe separação dos recursos que entram por meio de impostos

 14/04/2023 - Publicado há 1 ano

Texto: Redação
Arte: Carolina Borin Garcia

No dia 5 de abril, o Novo Marco Legal do Saneamento recebeu dois novos decretos, que foram assinados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo especialistas, a alteração facilita a permanência de estatais que não conseguiram promover a meta de universalização em momentos anteriores. 

Além disso, a igualdade competitiva entre servidores públicos e privados não é promovida a partir da aprovação dos novos decretos. Segundo José Carlos Mierzwa, do Departamento de Engenharia Hidráulica e Ambiental da Escola Politécnica da USP, a qualidade do serviço, parte mais importante para a população, deverá sofrer as consequências da medida. 

Como funcionava?

O Marco Legal do Saneamento (Lei nº 14.026/2020) prevê que contratos de prestação de serviço só podem ser realizados com abertura de concorrência e igualdade para setores públicos e privados. Contudo, a partir dos novos decretos, essa medida foi flexibilizada para dar mais tempo e espaço para a participação das estatais, assim, elas poderão realizar essas atividades sem licitação. É importante destacar que, quando a lei entrou em vigor pela primeira vez, a iniciativa privada chegou com força na área, que é fundamental para o funcionamento do País. “Nós tínhamos o decreto que estabeleceu o Novo Marco Legal de Saneamento, é uma lei. Ela é constituída de vários artigos, que podemos considerar como princípios básicos, mas, se você observar, ela não está muito bem detalhada. Ela tem artigos que mencionam tópicos específicos que devem ser considerados para estruturar uma legislação melhor. No caso da lei de saneamento, seria regulamentar e estruturar melhor esse setor, visando à meta de universalização do saneamento”, explica o especialista.

O professor comenta também que essas leis devem ser regulamentadas por meio de decretos e as mudanças foram realizadas  a partir de dois desses. O primeiro é o decreto de nº 11.466, que trata da comprovação da capacidade financeira dos prestadores de serviços. O segundo é o nº 11.467, que dispõe sobre a prestação regionalizada de serviços públicos. Mierzwa explica que, “como o serviço de saneamento é uma área bastante importante, requer que quem atua nesse setor tenha a capacidade de assumir o compromisso pela prestação de serviço. Assim, existe uma série de regras estabelecidas para comprovação dessa capacidade. Esse decreto, no final das contas,  acaba isentando o titular pela prestação de serviço”. 

José Carlos Mierzwa - Foto: Cecília Bastos/USP Imagens

Outro ponto a ser considerado é a questão da titularidade, que representa a responsabilidade pela prestação de serviços concedida aos municípios. O que acontece em alguns casos é que os municípios passam a titularidade para um prestador, que pode ser público ou privado. 

Alterações

Fonte: Instituto Trata Brasil - Imagem: Reprodução/Agência Senado

Com as novas mudanças, o setor privado e o setor público não são tratados da mesma maneira. Assim, o setor privado deve demonstrar a capacidade financeira e o setor público fica isento dessa necessidade. “Eu considero isso um agravante, pois muitas vezes, no setor público, não existe uma separação dos recursos que entram por meio de impostos”, considera Mierzwa. 

A partir da nova medida, as condições necessárias para a realização do serviço não são dispostas de forma igualitária entre os diferentes setores. Avaliando isso, o professor considera que quem será prejudicado é a população, que poderá sofrer com condições precárias de saneamento. Além disso, a questão da universalização dos serviços é também importante para o entendimento da discussão e representa um tópico essencial para o País. 

A parceria público-privada afeta o saneamento público nacional. O primeiro Marco Legal limitava-a em 25%, contudo, um dos novos decretos acabou com esse limite. “Nós ainda estamos no modelo tradicional de concessão, essas parcerias ainda não são bem estabelecidas no momento”, comenta o professor. 

O especialista também relata que a parte mais difícil no saneamento é a infraestrutura de distribuição de água e a rede de coleta de esgotos.  Assim, o tratamento, que é o tópico que garante a qualidade da água, deve receber maior atenção, uma vez que a universalização não deve ser apenas quantitativa, mas também qualitativa. 


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