Não há dúvida, nem para um aposentado como eu, que as condições de trabalho dos membros do corpo docente merecem, ou mesmo necessitam, de um exame profundo e extenso. O convívio com jovens em idade de contestação é um privilégio desgastante: o estudante individual amadurece e evolui, mas a idade média da classe, à qual o(a) docente ministra aulas, se mantém a mesma. Às necessidades inerentes à atividade didática somam-se as administrativas. Comissões e numerosas reuniões burocráticas interrompem o tempo que deveria ser de atividades científicas, pois estas exigem, quase sempre, períodos contínuos de muitas horas. Uma semana com duas ou três reuniões não é incomum. No trabalho em laboratório, frequentemente, perde-se dias tentando consertar um equipamento, atividade necessária na falta de técnicos e diante da lentidão com que solicitações de consertos e verbas para consertos são atendidas, quando atendidas. E o entrevero com os cripto-assessores das agências de fomento pode levar meses sem condições de trabalho no laboratório.
Se tudo isso não bastasse para o “burnout”, despontou nas universidades públicas a “grande” inovação de avaliação individual do(a) docente/pesquisador(a). Com métricas imaginadas por profissionais de áreas que nada têm a ver com o trabalho científico experimental – cada vez mais dependente de equipamentos sofisticados e delicados – pois o “universo” deles é o das palavras, discursos, estatísticas.
Nada contra “avaliações” enquanto informação e tão somente isso. Mas, quando a avaliação gera consequências, de duvidosa legalidade, como a perda do regime de trabalho, a coisa fica diferente, pois a “avaliação” pode, facilmente, se tornar um instrumento de “educação” política nas mãos de um grupo em exercício do poder. “Política” não com “pê maiúsculo”, mas letra inicial de politicagem. Um avaliar para submeter e silenciar. Fato ou, apenas, uma possibilidade, tanto faz quanto ao efeito sobre os trabalhadores do ensino e pesquisa.
Há quem afirme que a avaliação vinculada ao produtivismo surja da intenção de administrar as universidades como se fossem empresas privadas. Ledo engano. As empresas privadas estão dando cada vez mais atenção ao bem-estar e felicidade de seus trabalhadores, enquanto nossos colegas “metriqueiros” inovam, exatamente, no sentido oposto, gerando entre os trabalhadores das universidades públicas estresse, infelicidade, depressão, exaustão mental, enfim, “burnout”. Vale a pena, num segundo evento da Semana de Saúde Mental da USP, explorar e debater, com profundidade, esses aspectos.
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