A bem-vinda diversidade discente trouxe consigo desafios peculiares, sobretudo relacionados à efetiva inclusão dessas(es) alunas(os) ao ambiente universitário. Não tardaram as constatações de insuficiência de recursos destinados ao incentivo à permanência desses estudantes, tampouco tardaram os relatos doloridos de estudantes expostos a uma vivência universitária marcada pelas mesmas dinâmicas de nossa sociedade racista.
Dentre as incongruências das medidas inclusivas, a mais óbvia talvez seja o fato de que as políticas de inclusão e permanência vêm sendo formuladas por um corpo docente hegemonicamente branco e, ouso dizer, com perspectivas marcadas por uma existência de privilégios e naturalizações de relações étnico-raciais hierárquicas, desbalanceadas.
Neste ano, com a criação da Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento (PRIP), as atenções se voltam novamente para o tema. A comunidade uspiana espera avanços e os espera com a urgência que o tema lhe confere. É nesse cenário que um grupo de docentes negras e negros da USP se organizou para elencar algumas medidas que podem ser implantadas administrativamente e com poucos recursos. A primeira delas é baseada numa simples constatação numérica, docentes autodeclarados negros na Universidade são apenas 2,31% do total. É fundamental incluir pessoas negras no quadro docente da USP.
Indo além, é insuficiente admitir pessoas negras para o corpo docente, sem que se entenda o impacto desta inclusão na própria dinâmica da carreira docente, sob pena de repetirmos os erros cometidos na inclusão (ou falta de) das(os) alunas(os) negras(os) cotistas ou não.
É preciso reconhecer a importância de docentes negra(o)s nas vidas de estudantes que se parecem com esses docentes. Muitos destes estudantes trazem consigo uma problemática diferenciada do grupo médio de estudantes da USP. Decorre daí a insuficiência das medidas de inclusão e permanência até então pensadas na chave gestora de maioria branca com vivências que passaram incólumes ao poder deletério do racismo.
As(os) docentes passam a lidar com a bagagem que a sociedade racista coloca nesta(o)s aluna(o)s, como o problema da permanência na graduação bem como na pós, dificuldades de acompanhar o curso devido à falta de base, ou mesmo problemas de saúde mental.
O vácuo das medidas institucionais vem sendo preenchido por docentes de diferentes áreas passando da Engenharia à Psicologia, da Veterinária à Literatura. A já árdua experiência docente negra vem pesando ainda mais, pois nos vemos em lugar de fornecer acolhimento, apoio e incentivo a estudantes que nos veem como espelho e modelo.
Numa sociedade racista negros e negras aprendem rápido a procurar os seus, no melhor estilo Emicida: “tudo que nós tem é nós”. É preciso que essas atividades sejam reconhecidas pela Universidade pela importância que têm; é preciso que a progressão seja incentivada para que, em alguns anos, seja possível formar órgãos gestores com professora(e)s negra(o)s.
Assim, o grupo de docentes negras e negros da USP escreveu uma carta aberta a ser entregue à Reitoria da USP trazendo pontos cuja adoção pode marcar um significativo avanço na pauta antirracista na Universidade. São eles:
• Reserva de vagas para Pretos, Pardos e Indígenas nos concursos docentes;
• Apoio aos docentes negra(o)s para que possam assegurar a permanência e desenvolvimentos das suas pesquisas e de seus orientadas(os);
• Reserva de vagas nos concursos para professor titular.
Esta carta conta com assinaturas de docentes negras e negros e apoios de pessoas de todas as cores, instituições, entidades e coletivos. Para conhecê-la e assinar ou apoiar basta acessar o link.