Luta das mulheres afegãs por direitos se intensificou com a volta do Talibã ao poder

“O mínimo virou nada”, diz Francirosy Campos Barbosa sobre os direitos das mulheres no Afeganistão

 31/08/2022 - Publicado há 2 anos
Por
Apesar de não conseguirem se expressar como gostariam, as afegãs continuam reivindicando seus direitos – Foto: Reprodução/Flickr

 

Logo da Rádio USP

Após um ano do retorno do Talibã ao poder, no Afeganistão, organizações internacionais têm denunciado violações aos direitos humanos, principalmente quanto ao retrocesso dos direitos das mulheres. De acordo com o relatório da Anistia Internacional, meninas e mulheres relatam que as novas regras aplicadas pelo grupo restringem atividades e comportamentos, além do aumento de casos de violência. 

Francirosy Campos Barbosa – Foto: Arquivo pessoal

Hoje, o desafio das afegãs é “retomar o que tinham antes, que, convenhamos, não era bom, no sentido do que seria bom para uma sociedade que incluísse as mulheres em, absolutamente, tudo. Mas era melhor do que está”, afirma a professora da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP, Francirosy Campos Barbosa. 

Apesar de não conseguirem se expressar como gostariam, as afegãs continuam reivindicando seus direitos. “A luta dessas mulheres permanece”, diz Francirosy, esclarecendo que a luta é, ao mesmo tempo, contra as imposições do Talibã e o colonialismo americano. “Elas não querem nem a intervenção religiosa do Talibã, no sentido que eles interpretam a leitura literalista da religião e da Sharia, e elas também não querem nem queriam a intervenção americana.”

Perda de direitos mínimos

De acordo com a Anistia Internacional, a cada dez mulheres, nove já sofreram violência doméstica. Antes da volta do grupo, diz a professora, essas mulheres eram atendidas, mas, agora, “já não têm mais atendimento quando sofrem violências”. 

O mesmo acontece com a educação. Segundo Francirosy, cerca de 21% das mulheres tinham acesso ao ensino superior, sobretudo as de classe média alta. Embora a porcentagem fosse baixa, a situação piorou agora, já que enfrentam o segregacionismo com menor acesso à educação. O fato, assegura a professora, vai contra a Sharia (o código de vida muçulmano), que determina que homens e mulheres estudem. 

“O mínimo virou nada”, continua a professora, explicando que as afegãs hoje lutam para que sejam garantidos os direitos já previstos, inclusive, pela Sharia. De acordo com o código de conduta, “as mulheres têm direito ao estudo, ao trabalho e à circulação. E as pessoas desconhecem esses direitos”.

Miséria e violência como legados 

O país também enfrenta sanções internacionais e uma grave crise financeira. “A situação do Afeganistão hoje é extremamente precária do ponto de vista econômico. Miserável, paupérrimo.” E este cenário incide, em especial, sobre as mulheres. “Se a economia está ruim, de quem vão tirar o emprego primeiro? Das mulheres. De quem eles vão reduzir os salários primeiro? Das mulheres”, afirma Francirosy. 

A pobreza, diz a professora, também é resultado da ocupação estadunidense, que durou 20 anos. “A pobreza não está lá por conta do Talibã. A gente pode dizer que, com o Talibã, a pobreza permanece, a miséria permanece. Mas ela está lá porque foi implantada pelo sistema que tinha anteriormente, pelo próprio Estados Unidos.” 

A explicação, segundo Francirosy, é a falta de um projeto efetivo de expansão e de desenvolvimento para o país. “Aquilo que foi investido, foi retirado.” Além disso, a transição de poder não foi feita para que o Talibã “pudesse gerir, com mais segurança econômica, o próprio país”. E, avalia a professora, “a gente sabe muito bem, por conta até da nossa própria realidade brasileira, que, quanto mais miserável o país, quanto maior a desigualdade social, mais violência vai ter, mais interpretações equivocadas”. 


Jornal da USP no Ar 
Jornal da USP no Ar no ar veiculado pela Rede USP de Rádio, de segunda a sexta-feira: 1ª edição das 7h30 às 9h, com apresentação de Roxane Ré, e demais edições às 14h, 15h, 16h40 e às 18h. Em Ribeirão Preto, a edição regional vai ao ar das 12 às 12h30, com apresentação de Mel Vieira e Ferraz Junior. Você pode sintonizar a Rádio USP em São Paulo FM 93.7, em Ribeirão Preto FM 107.9, pela internet em www.jornal.usp.br ou pelo aplicativo do Jornal da USP no celular. 


Política de uso 
A reprodução de matérias e fotografias é livre mediante a citação do Jornal da USP e do autor. No caso dos arquivos de áudio, deverão constar dos créditos a Rádio USP e, em sendo explicitados, os autores. Para uso de arquivos de vídeo, esses créditos deverão mencionar a TV USP e, caso estejam explicitados, os autores. Fotos devem ser creditadas como USP Imagens e o nome do fotógrafo.