Jovem com fissura labiopalatina tratado em hospital da USP torna-se músico e cantor

Alex Augusto Lourenço integra dupla sertaneja e faz shows em todo o Estado do Paraná; com tratamento iniciado aos 4 meses de vida, aos 29 anos teve alta no último mês

 06/01/2022 - Publicado há 3 anos     Atualizado: 11/01/2022 as 17:06
Alex Lourenço cantou e emocionou pacientes, familiares e equipe do HRAC – Foto: Tiago Rodella/HRAC-USP

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Em meados de dezembro, uma das recepções do Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais (HRAC/Centrinho) da USP em Bauru foi cenário de momentos de emoção e inspiração de pacientes, familiares, profissionais e estudantes. O jovem Alex Augusto Lourenço, de 29 anos, interpretava com voz e violão uma canção do grupo musical Roupa Nova que tem um dos trechos: “Pois quem ama/Tudo pode vencer”.

Era um dia especial, de celebração e alegria para ele. O jovem paranaense retornava ao hospital para consulta na área de Cirurgia Plástica e para um momento muito esperado pelos pacientes com fissura labiopalatina: a alta do tratamento.

“Não foi fácil. Já sofri muito bullying, na escola principalmente. Tinha a voz fanhosa e muita vergonha de falar. Alguns riam de mim. Já chorei bastante, já teve momento de só querer ficar trancado dentro do quarto. Mas, graças aos meus pais, que sempre me apoiaram e orientaram, fui aprendendo a lidar. Meu pai sempre dizia: ‘Tudo o que você ouvir de ruim, deixe entrar por um ouvido e sair pelo outro. Ninguém é melhor do que ninguém e ninguém é perfeito’”, relata.

Do primeiro atendimento no HRAC – aos quatro meses de vida – até a alta, aos 29 anos, o jovem e sua família viveram uma longa e árdua jornada, em um processo de reabilitação que envolveu diversas cirurgias, retornos e acompanhamento médico, odontológico, fonoaudiológico e com outras especialidades. Foram inúmeras idas e vindas, percorrendo os 460 quilômetros que separam Bauru da pequena Peabiru, no Paraná, cidade onde Lourenço reside.

Mesmo com todas as implicações estéticas, funcionais e psicossociais que a fissura labiopalatina pode trazer – especialmente alterações no desenvolvimento da fala –, superou barreiras e tornou-se músico e cantor. É integrante da dupla sertaneja Diego & Alex, sendo segunda voz e violão, e faz shows em todo o Estado do Paraná (para saber mais sobre o trabalho da dupla, acesse o perfil no Instagram @diegoealex).

“Aprendi a tocar violão com 14 anos, sozinho, na calçada de casa. Agradeço ao dom de Deus. A partir daí fui perdendo a vergonha e já passei a tocar e a cantar em churrascos. Tempos depois toquei guitarra durante dois anos em uma banda gaúcha, até encontrar um amigo meu em um bar, o Diego. E a gente se conectou, uma voz completa a outra. Começamos a nos apresentar, as pessoas gostaram e passaram a nos convidar. Somos bem conhecidos no Paraná”, conta Alex Lourenço.

A dupla faz cover e tem uma música de trabalho própria. Além da dupla, o jovem também trabalha em uma fábrica de resistências elétricas. Casado, planeja projetos para ampliar a divulgação do trabalho da dupla – como lançamento de DVD e de outras músicas próprias – e pretende ter filhos, futuramente.
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Alex, à esquerda, e Diego, da dupla musical – Foto: Reprodução/Instagram

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“Não acreditava que ia chegar até aqui. Nunca imaginei que iria ficar com a fisionomia que estou. Olho para o espelho e sorrio. Estou muito feliz. Agradeço a Deus em primeiro lugar. Ao Centrinho, que trata todo mundo com amor. Ao meu pai [falecido há cinco anos] e à minha mãe, por toda a dedicação e apoio deles”, comemora.

“Para quem talvez não acredita, ou está com medo se o resultado do tratamento vai ficar bom, meu recado é: confie! Vá em frente! Eu cheguei até o final, você pode chegar também.”, finaliza.

Fissura labiopalatina

Condição congênita em que há comprometimento da fusão dos processos faciais durante a gestação, a fissura labiopalatina está relacionada a fatores genéticos e ambientais. Apresenta grande variabilidade clínica, podendo envolver desde uma pequena cicatriz labial até fissuras completas e bilaterais, que atingem o palato e são mais complexas. Pode ocorrer de forma isolada, estar associada a outras malformações ou ainda fazer parte de um quadro sindrômico. A prevalência no Brasil é de uma a cada 650 crianças nascidas.

As principais implicações que as fissuras podem trazer ao indivíduo são dificuldade na alimentação, alterações maxilares e da dentição, comprometimento do crescimento e estética facial e distúrbios relacionados ao desenvolvimento da fala e audição. Ao longo dos anos, essa condição pode inclusive trazer impactos psicossociais (como o bullying e a dificuldade de acesso ao mercado de trabalho).

O tratamento é um processo que dura em média 20 anos (até o término do crescimento). Envolve a atuação de equipe interdisciplinar, das áreas de cirurgia plástica, odontologia, fonoaudiologia, entre outras especialidades, todas indispensáveis à reabilitação, e engloba aspectos funcionais, estéticos e psicossociais.

Centro de liderança e excelência

Instituição pública mantida com recursos da USP, do Sistema Único de Saúde (SUS) e de convênios institucionais, o HRAC foi fundado em 1967 por professores da Faculdade de Odontologia (FOB) da USP. Pioneiro no País em suas áreas de atuação, é referência mundial no tratamento e pesquisa das anomalias craniofaciais, síndromes associadas e deficiência auditiva. Nesses 54 anos de atividades, registra mais de 122 mil pacientes já atendidos (sendo 52 mil ativos) de todo o Brasil, e já formou cerca de 1.700 mestres, doutores, especialistas e outros profissionais em cursos de extensão universitária.

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Texto adaptado de Tiago Rodella, Assessoria de Comunicação do HRAC

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