Série de conteúdos produzidos pelo projeto Ciclo22, que remete à reflexão da USP sobre quatro grandes marcos (1822, 1922, 2022 e 2122): o bicentenário da Independência do Brasil, o centenário da Semana de Arte Moderna, o tempo presente e os desafios para os próximos 100 anos

Arte sobre fotos/Wikimedia Commons

Estudo da USP analisa modernismos do filme "O Homem do Pau-Brasil"

Dissertação explora referências literárias e releitura feita do movimento cultural que iniciou em 1922 com a Semana de Arte Moderna

 26/11/2021 - Publicado há 2 anos     Atualizado: 20/07/2022 as 19:25

Crisley Santana

O diretor Joaquim Pedro de Andrade (1932-1988) realiza uma releitura das obras do escritor modernista Oswald de Andrade, além da própria figura de Oswald, em seu filme O Homem do Pau-Brasil, de 1981. Entre outras referências à literatura do escritor, o longa lembra de romances como Serafim Ponte Grande e Memórias Sentimentais de João Miramar. 

Mas além dessas, o filme tem alusões a outras obras e outros tipos de arte. É o que indica a dissertação de mestrado desenvolvida por Ranny Cabrera no Programa de Pós-Graduação de Teoria Literária e Literatura Comparada da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. 

O título provisório do estudo é O Homem do Pau-brasil (1981) de Joaquim Pedro de Andrade: memórias póstumas de uma matriz modernista.

A ideia da pesquisadora é debater as referências literárias do filme, tendo como foco o escritor Oswald de Andrade e a releitura que o diretor de mesmo sobrenome faz do Modernismo. 

Oswald foi grande propulsor do movimento cultural modernista que se iniciou com a Semana de Arte Moderna, em São Paulo, durante fevereiro de 1922.

O objetivo do filme que explora a imagem do autor não foi realizar uma homenagem a ele ou às obras que são referenciadas, mas debater as propostas trazidas pelo Modernismo brasileiro. 

“Como pensar a cultura, o papel do intelectual e da história? Mais do que homenagem [o objetivo da obra] é pensar o que era essa modernidade para os modernistas”, disse a pesquisadora sobre as indagações trazidas pelo filme. 

A obra também traz paralelos entre as relações do movimento cultural de 1922 e o cinema novo, gênero fílmico de que o diretor fez parte. Isso porque ambas as atividades foram de alguma forma frustradas, como indicou a pesquisadora. 

Enquanto o Modernismo não conseguiu atingir as classes populares como seus intelectuais fundadores esperavam, o cinema novo foi barrado pela ditadura civil-militar que se instalou no Brasil em 1964.

Foto: Arquivo pessoal

Ranny Cabrera, pesquisadora da FFLCH - Foto: Arquivo pessoal

Outras referências culturais evidenciadas pela autora no filme estão nas chamadas chanchadas, gênero que fez grande sucesso no País entre os anos 1930 e 1950. A mistura de comédia musical com filmes policiais e de ficção científica fez grandes nomes do cinema, como Grande Otelo, ator que integra o elenco de O Homem do Pau-Brasil.

A referência pode levar a questionar se a escolha do diretor foi uma tentativa de angariar público, como aconteceu com o filme Macunaíma (1969), também dirigido por Joaquim Pedro de Andrade. Mas, para a pesquisadora, o recurso serve também para retratar no filme, com uso da comédia, uma realidade política dramática.

Alusões modernistas estão também nas obras de artes plásticas exibidas durante a produção, além do chamado teatro de revista e outras formas de cultura popular. 

Foto: Wikimedia Commons

Cena do filme O Homem do Pau-Brasil - Foto: Wikimedia Commons

O longa não foi assistido por um grande público na época, e por isso há poucos comentários e críticas registrados sobre ele, segundo Ranny. Ainda assim, os escritos encontrados durante a pesquisa dão conta de demonstrar que ele gerou controvérsia. 

“Não agradou nem gregos, nem troianos. Existe um público que não gostou porque achou que o recorte das obras fez uma caricatura do Oswald, e alguns têm uma percepção de que o filme é um tanto tradicional, convencional.”

Para a pesquisadora, o filme tem uma concepção épica da história, que não dramatiza Oswald de Andrade, ao mesmo passo que não o transforma em herói. “O filme quer pensar as questões que mobilizam o Brasil. E nas entrelinhas ele deixa essas contradições muito bem marcadas, tanto na montagem da imagem e som quanto nas próprias referências que ele traz”, disse a pesquisadora, afirmando que a obra propõe uma autocrítica sobre o papel dos artistas e intelectuais do País.

Foto: Wikimedia Commons

A pesquisa e a pesquisadora

Ranny Cabrera é graduada em Letras com habilitação em Português e Francês pela USP e dupla diplomação em Línguas, Literaturas e Civilizações Estrangeiras e Regionais pela Université de Paris-Sorbonne. Também é graduada em Filosofia pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. 

O desenvolvimento da sua dissertação contou com bolsa Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), ligada ao Ministério da Educação. 

Além do próprio filme, livros sobre Modernismo e jornais de época foram suas grandes fontes de pesquisa, além de ter tido acesso ao roteiro original da obra, arquivado na Cinemateca Brasileira.

O meu orientador, professor Anderson Gonçalves, sempre me ajudou muito, nesse momento de pandemia e falta de acesso à biblioteca e ao espaço da universidade, que tornou as coisas um pouco mais difíceis. A gente acha que a pesquisa acadêmica e uma dissertação são algo individualista, mas na verdade o mais interessante é quando você consegue ter espaço para discutir com outras pessoas”, comentou Ranny.

A dissertação será defendida, isto é, apresentada a uma banca avaliadora, no primeiro semestre de 2022.

Esta matéria faz parte da série Pesquisas em Andamento, desenvolvida pelo Ciclo22, sobre teses e dissertações da USP que serão defendidas por seus pesquisadores.

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