Governo federal não cumpre papel de prevenção no combate à pandemia

A opinião é de Gustavo Justino de Oliveira, ao comentar saída do ministro da Saúde, Nelson Teich, e constatar que o governo falha ao não atuar de forma conjunta e coordenada com os demais entes da União

 18/05/2020 - Publicado há 4 anos
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Prestes a completar um mês à frente do Ministério da Saúde, Nelson Teich pediu demissão da pasta na última sexta-feira (15). É a segunda saída de um ministro da saúde em meio à pandemia do novo coronavírus no Brasil, tornando mais difícil a busca de consolidação de uma estratégia unificada de combate ao vírus entre Estados, municípios e União. Para ajudar a entender o quadro jurídico que se configura no Brasil neste momento, o Jornal da USP no Ar conversou com Gustavo Justino de Oliveira, professor do Departamento de Direito do Estado da Faculdade de Direito (FD) da USP.

Além das consequências da pandemia nos países do mundo inteiro provocar crises sanitária e econômica, nosso país intensificou uma crise política já existente no pré-pandemia. “Uma crise que, infelizmente, vem sendo estimulada pelo presidente da República”, avalia Oliveira. Ele ainda diz que são dois os grandes motivos para a saída do agora ex-ministro Nelson Teich: o isolamento social proposto e adotado pela maioria dos Estados e municípios, ao qual o presidente é abertamente contrário; e o protocolo da cloroquina, que não é legitimado cientificamente, mas ao qual Jair Bolsonaro é favorável. 

O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a autonomia de Estados e municípios que, neste primeiro momento pandêmico, estão mais preocupados com a segurança sanitária da população. Segundo o professor, o próprio STF, ao reforçar as competências materiais e legislativas dos entes subnacionais, faz isso com base na Constituição Federal e também levando em consideração que o governo federal não vem cumprindo seu papel de prevenção no enfrentamento da pandemia. O que não seria necessário, caso fosse seguida a atuação conjunta e coordenada entre os entes e a União, com a criação de um comitê de crise que traria uma natural ascendência do governo federal.

“O que choca é justamente o posicionamento oposto do governo federal, representado pela Presidência da República e não necessariamente pelo Ministério da Saúde, como vemos na troca de ministros da pasta, de que o isolamento social não seria mais necessário”, lamenta o professor. Outro ponto de não consonância são os decretos federais editados pelo presidente Jair Bolsonaro, que procuram sempre expandir a lista de serviços essenciais que não deveriam funcionar durante uma pandemia. “Esses decretos também contrastam com as medidas de recomendação de isolamento e restrição de funcionamento de atividades comerciais de Estados e municípios.”

Justamente por isso, as chances do atrito entre governo federal e entes nacionais passar para os Estados e municípios aumentam, com municípios se colocando contrários às orientações dos Estados, reproduzindo a tensão da União. Sem um discurso unificado, desde o início a população fica confusa sobre quais recomendações deve seguir, principalmente com o bombardeio de notícias e as lamentáveis fake news sobre a doença. “O maior antídoto de uma pandemia como esta é o direito da informação do cidadão e o dever da boa informação dos órgãos públicos, comprometida, infelizmente, no Brasil”, afirma Oliveira.

Ouça a entrevista completa no player acima. 


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