Lei antifraudes pode afetar obtenção de benefícios previdenciários

Segundo especialista, medida pode colocar direitos em risco, principalmente os de trabalhadores rurais

 02/07/2019 - Publicado há 5 anos
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A Lei de Combate às Fraudes Previdenciárias, sancionada em junho pelo presidente Jair Bolsonaro, permitirá, segundo o governo, intensificar o combate a fraudes, melhorar a qualidade dos gastos na Previdência Social e reduzir a judicialização de temas previdenciários. A perspectiva é que, com a vigência da medida, haja uma economia de R$ 9,8 bilhões nos próximos 12 meses, combatendo indícios de irregularidades em auxílios-doença, aposentadorias por invalidez e Benefícios de Prestação Continuada (BPC). No entanto, o temor é de que essa contenção de gastos promova cortes prejudiciais em benefícios.

Marcus Orione, professor do Departamento do Direito do Trabalho e da Seguridade Social da Faculdade de Direito (FD) da USP, explicou a finalidade da proposta ao Jornal da USP no Ar, dizendo que “foi uma das primeiras medidas do governo Bolsonaro, apresentada primeiramente por uma medida provisória e convertida à lei, visando reduzir o suposto déficit da previdência social”. Porém, na opinião do especialista, a lei não se restringe apenas ao que é proposto em seu nome: “Desses mais de 9 bilhões economizados que eles anunciam, certamente mais da metade disso corresponde não às supostas fraudes, mas também à diminuição e à imposição de dificuldades na obtenção de benefícios. Sob esse aspecto, a finalidade dessa medida pode ser considerada como perversa, porque ela diminuiria os direitos das pessoas”.

Reforma da Previdência – Foto: Pedro França / Agência Senado

Nesse sentido, a área rural pode ser muito afetada pelas novas regras. O texto exige um cadastro para o trabalhador rural feito pelo governo, e não mais pelos sindicatos, como é feito hoje. Além disso, também restringe o pagamento de auxílio-reclusão apenas aos casos de pena em regime fechado. Para Orione, “fraudes no campo existiram há muito tempo, e os beneficiários da área rural, como muitas vezes não tinham muito conhecimento sobre a questão previdenciária, eram inocentados penalmente caso acontecesse algo do tipo. Hoje, como já houve uma sofisticação muito grande do sistema, inclusive com comparação e levantamento de dados, isso dificulta a ocorrência desses casos”.  Para o professor, o maior problema é que a lei abriu muitas possibilidades para que a administração pública elencasse quais são as situações e hipóteses para suspensão de benefícios, o que pode ser negativo, “pois os critérios para a cassação de benefícios ficarão ao dispor do Ministério da Economia, cujas atitudes podem não atender aos vieses técnicos, mas apenas aos de interesse econômico, como cortar gastos de qualquer jeito. Isso, em geral, aumenta o número de litígios na Justiça”.

Outra preocupação do especialista consiste na criação de um sistema que estimule a cassação de benefícios. “A criação de critérios a mais que promovam cortes pode gerar uma produtividade à base da quantidade de benefícios cassados, pagando profissionais para que exerçam essas funções. Quando você cria restrições, ou concede um benefício por um erro grosseiro, isso também cria um medo no servidor ao realizar esse ato. Não se pode criar um sistema à base disso, de cassação, baseando-se na recompensa ou no medo, porque isso pode atingir o benefício em si”, alerta.

Além do combate às fraudes, deve haver uma gestão adequada da administração pública previdenciária. “A lei é criticável ao passo em que pode aumentar a judicialização e pode ser exercida de forma muito apressada, com a finalidade de simplesmente cortar custos. Isso faz com que os direitos sejam cortados também, e o governo está longe de obter bons resultados dessa maneira“, explica Orione.


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