O presidente Trump presenteará o agro?

Marcos Fava Neves é professor titular da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, campus Ribeirão Preto

 25/04/2018 - Publicado há 6 anos

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Foto: Francisco Emolo/USP Imagens

Foi um mês muito bom para o agro, fazia já algum tempo que não tínhamos um conjunto favorável de notícias, tanto em preços como em quantidades. Começando com a economia mundial dando bons sinais, pois o FMI projeta agora expansão de 3,9%, advindos de 2,9% nos EUA, 2,4% na região do euro, e 4,9% para os emergentes, com destaque para 7,4% na Índia e 6,6% na China, não sem riscos, pelo elevado endividamento mundial e tormentas políticas. Para o Brasil são esperados 2,3%. Já o Relatório Focus (Banco Central) traz expectativas para o IPCA de 2018 em 3,48% e de 2019 em 4,07%. O PIB fecharia em 2,76% este ano e 3% em 2019. Para a taxa Selic se esperam 6,25% e 8,00%, respectivamente e, finalmente, para o câmbio, R$ 3,30 no final de 2018 e R$ 3,39 no final de 2019. Estabilidade à frente no campo econômico, mas não podemos dizer o mesmo na política brasileira, que segue confusa.

Mais uma estimativa da Conab e a safra vem vindo bem. Produziremos em grãos 229,5 milhões de toneladas (3,4% menor que a safra anterior). Em um mês a estimativa cresceu 3,5 milhões de toneladas, com uma área plantada de 61,38 milhões de hectares, apenas 0,8% maior que a da safra passada. No milho segue estimativa de perda, indo de quase 98 para 88,61 milhões de toneladas com menores área e produtividade. Já na soja teríamos 114,96 milhões de toneladas, praticamente 9 milhões acima da primeira expectativa, graças a uma produtividade de 3,27 t/ha. Temos ainda chance de chegar ao recorde de 237 milhões de toneladas se o clima ajudar, pois o plantio de milho da segunda safra é estimado em 11,54 milhões de hectares, quase perto dos 12,1 milhões de 2016/17. Vale também destacar o algodão, que deve produzir 1,86 milhão de toneladas de pluma, 22% a mais que 2016/17.

Como antecipado na nossa análise de dois meses atrás, bateremos recorde na soja, com preços comparativamente 10% maiores em Chicago e 15% maiores em regiões do Brasil. Isto posto, o MAPA já estima em quase R$ 125 bilhões a renda desta lavoura, 3,8% acima do ano passado. Para a Abiove, a produção de soja deve chegar ao recorde de 117,4 milhões de toneladas, e exportaremos 70,4 milhões (acima dos 68,15 milhões de 2017), trazendo um faturamento de US$ 36 bilhões (US$ 31,7 bilhões em 2017). Os preços médios devem ser de US$ 410/t (a previsão de março era de US$ 380 e a média de 2017 foi de US$ 377).

Quatro grandes fatos ajudaram: o câmbio (desvalorização do real), a seca na Argentina (a produção deve ser de 15 a 20 milhões de toneladas abaixo do esperado), os efeitos da sobretaxa americana no aço e alumínio, lembrando que a compra chinesa pode chegar a 100 milhões de toneladas de soja neste ano, e o Brasil deve ocupar espaços abrindo, ainda, espaço aos EUA em outros compradores mundiais e, finalmente, a nova projeção do USDA, que trouxe uma área 1% menor dedicada à soja. Milho também deve cair 2%. E tem mais, o plantio está atrasado pelo frio que não cede!

Segundo o MAPA, o valor bruto da produção (VBP) agropecuária neste 2018 será de R$ 530,1 bilhões (R$ 14,2 bilhões maior que a projeção de março) e 3,7% abaixo do recorde de 2017, de R$ 550,4 bilhões. Na nova projeção, subiu R$ 9,3 bilhões o valor da agricultura (R$ 355,4 bilhões), principalmente devido à soja, e também em R$ 5 bilhões o valor da pecuária, agora estimado em R$ 174,8 bilhões. Também o índice mundial dos preços das commodities alimentares (índice da FAO) subiu outra vez 1,1% para 172,8 pontos. Cereais subiram 2,7% e os lácteos 3,3%. Os açúcares caíram 6,5%, óleos vegetais caíram 0,8% e o de carnes permaneceu estático.

Como antecipado na nossa análise de dois meses atrás, bateremos recorde na soja, com preços comparativamente 10% maiores em Chicago e 15% maiores em regiões do Brasil.

As exportações no agro deste março surpreenderam e foram de US$ 9 bilhões (5,2% acima de fevereiro de 2017) e, retirando-se as importações de US$ 1,3 bilhão, ficou um superávit 6,8% maior, de US$ 7,8 bilhões. Trouxemos US$ 4,02 bilhões no complexo soja, com aumentos expressivos no óleo e no farelo. Na sequência vieram as carnes, com US$ 1,34 bilhão, puxados por crescimento de 22,1% na bovina, e queda de 9,7% no frango e 23,4% na suína, seguido pelos produtos florestais com US$ 1,2 bilhão. Fechamos o primeiro trimestre 4,6% acima de 2017, vendendo US$ 21,4 bilhões e importamos 4% a menos (US$ 3,6 bilhões), o que dá um saldo 6,6% maior, de US$ 17,8 bilhões, um excelente desempenho.

Esta produção toda vem ajudando o consumidor, pois o Índice Alimentação e Bebidas do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do IBGE subiu apenas 0,07% em março, ou seja, o agro controlando a inflação.

Se os fatos de curto prazo foram favoráveis, o melhor fato de médio prazo foi ventilado nos EUA. É possível que o presidente Trump autorize a venda de gasolina com 15% de etanol durante todo o ano em seu país, o que foi uma surpresa, pois suas declarações não estavam nesta linha favorável ao etanol. No verão é vetada esta venda com 15% por razões de maior volatilidade com altas temperaturas. Este novo mercado potencial ajudaria a manter o etanol americano no mercado interno, pois tem gerado um excedente anual de 5 bilhões de litros e poderia inclusive demandar mais milho no futuro, abrindo espaços ao Brasil. Nesta safra foram usadas para etanol 141,6 milhões de toneladas e se o E15 for adotado, pelo menos 50 milhões a mais serão necessárias, quando na plenitude. Se der certo, será a melhor notícia do ano ao agro brasileiro.

Entre fatos empresariais, destaco dois: já temos investimentos chineses via a China Communications Construction Company (CCCC) em 51% do Porto de São Luís e agora no Terminal Graneleiro da Babitonga (TGB), em São Francisco do Sul (SC), dois importantes corredores de exportação, entre outros investimentos projetados para a área de infraestrutura, principalmente ferrovias e portos. Chineses entrando firme na nossa infra para o agro.

É possível que o presidente Trump autorize a venda de gasolina com 15% de etanol durante todo o ano em seu país, o que foi uma surpresa, pois suas declarações não estavam nesta linha favorável ao etanol.

E do novo mundo digital e tecnológico, a IBM fez um levantamento em que apenas para armazenar os dados gerados por seis lavouras no Brasil exigirá por ano 28,3 exabytes (28 bilhões de gigabytes). Tecnologia e dados são o quarto fator de produção, além dos tradicionais terra, trabalho e capital. A Cargill acredita que o machine learning trará grandes ganhos de competitividade, como o exemplo de máquinas que, pelo barulho do camarão durante sua alimentação, sabem o momento de despejar mais ração ou parar. Ou seja, tem um mundo de eficiência a caminho!

Finalizando o mês, são boas as notícias no crescimento econômico, na produção e preços do agro e na confiança crescente. O clima até o momento ajuda para que possamos quebrar o recorde de produção novamente, e com preços melhores. O grande fato negativo foi o embargo da União Europeia a um grande número de unidades exportadoras de frango. Temos que avaliar quanto tempo vai durar e o possível estrago que fará no mercado externo e interno, afetando também as outras carnes e grãos.

Do lado político, como antecipado na análise de março, o ex-presidente foi preso e deve seguir um destino semelhante ao do ex-governador do Rio de Janeiro, de acúmulo de penas. Sua saída definitiva de cena permitirá deixar o quadro eleitoral mais claro e espero vencer na aposta de que uma candidatura de centro e aglutinadora do país possa emergir para construir consenso e promover ainda no primeiro semestre de 2019 todas as reformas estruturantes e liberalizantes necessárias para nos destravar e colocar o Brasil na competição mundial. Chega de obsolescência e retrocesso.

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